Os sete pecados mortais do terrorismo (3ª e última parte).
"O Estado totalitárioEntretanto, o terrorismo não permanece neutro na batalha política. Não tem tendência, a longo prazo, para a anarquia: ele leva ao despotismo. O quarto pecado mortal do terrorismo é que ele se associa ativamente, sistematicamente e necessariamente à propagação do Estado totalitário. Os países que financiam e sustentam a infra-estrutura internacional do terrorismo — que dão aos terroristas refúgio e abrigo, bases e campos de treinamento, dinheiro, armas e apoio diplomático como um assunto de deliberada política de Estado — são, sem exceção, Estados despóticos. Todos esses Estados têm governos militares ou policiais. A noção de que o terrorismo se opõe às "forças repressivas" da sociedade é falsa — de fato, é o contrário da verdade. O terrorismo internacional, e os vários movimentos terroristas a seu serviço, é inteiramente dependente da boa vontade e do apoio ativo de Estados policiais.O que nos traz ao quinto pecado mortal.
O terrorismo internacional não representa perigo para o Estado totalitário. Esta espécie de Estado sempre pode-se defender através do assassínio judicial, da prisão preventiva, da tortura de prisioneiros e suspeitos, e do completo controle das atividades terroristas. Estes Estados não têm de se limitar ao primado da lei ou a qualquer outra consideração de humanidade ou ética. O terrorismo apenas pode fincar pé em um Estado onde o Poder Executivo sofre alguma espécie de restrição legal, democrática e moral. O regime do Xá do Irã foi derrubado —e os terroristas tiveram um papel importante na operação — não porque ele era implacável, mas porque hesitou em ser implacável. O efeito destas vitórias terroristas não é a expansão, mas contração da liberdade e da lei. O Irã agora é um Estado totalitário, onde o primado da lei não mais existe, e um Estado a partir do qual os terroristas podem operar com segurança e com ativa assistência oficial.
Assim, o quinto pecado mortal é que o terrorismo discrimina entre o Estado de Direito e o Estado totalitário, em favor deste último. Ele pode destruir a democracia, como destruiu o Líbano, mas não pode destruir um Estado totalitário.A base do terrorismo está no mundo totalitário — é de lá que vem seu dinheiro, treinamento, armas e proteção. Mas, ao mesmo tempo, ele apenas pode operar efetivamente na liberdade de uma civilização liberal. O sexto pecado mortal do terrorismo é que ele explora o aparelho de liberdade das sociedades liberais e portanto o ameaça.Ao defrontar-se com a ameaça do terrorismo, uma sociedade livre deve armar-se. Mas o simples processo de se armar contra o perigo interno, ameaça as liberdades, decoro e padrões que fazem uma sociedade civilizada. O terrorismo é uma ameaça direta e contínua a todos os instrumentos protetores de uma sociedade livre. É uma ameaça à liberdade de imprensa. É uma ameaça ao primado da lei, necessariamente atingido pela legislação de emergência e pelos poderes especiais.
É uma ameaça ao habeas corpus, ao processo de humanização dos códigos penais e da civilização de nossas prisões. É uma ameaça a qualquer sistema de controle dos excessos da polícia, das autoridades carcerárias ou de quaisquer outras forças restritivas da sociedade. Já o sétimo pecado mortal do terrorismo opera, paradoxalmente, na direção oposta. Uma sociedade livre que reage ao terrorismo pelo recurso aos métodos autoritários se prejudicará necessariamente. Mas um perigo muito maior — e muito mais comum hoje em dia — é que tais sociedades livres, em sua ansiedade para evitar os excessos autoritários, deixam de se armar contra a ameaça terrorista, e assim abdicam à sua responsabilidade de manter a lei. Os terroristas têm êxito quando conseguem provocar a opressão, mas triunfam quando encontram o apaziguamento. O sétimo e mais mortal dos pecados do terrorismo é que ele solapa a vontade de uma sociedade civilizada de se defender. Temos visto isso acontecer. Encontramos governos negociando com terroristas — negociações que visam não a destruição ou desarmamento dos terroristas, pois tais negociações podem por vezes ser necessárias, mas negociações cujo resultado inevitável é ceder em parte às exigências dos terroristas.
Encontramos governos providenciando dinheiro de resgate para terroristas, ou permitindo que cidadãos privados o façam, até mesmo auxiliando no processo pelo qual esse dinheiro chega às mãos dos terroristas. Encontramos governos libertando criminosos condenados, em resposta a exigências de terroristas; concedendo a terroristas o status, direitos, vantagens e, acima de tudo, a legitimidade de interlocutores em negociações. Encontramos governos concedendo a terroristas condenados o status oficial e privilegiado de prisioneiros políticos, o que é sempre uma asneira e uma rendição. Encontramos governos se submetendo às exigências — uma parte invariável da estratégia terrorista — de inquéritos oficiais, ou investigações internacionais, sobre alegados maus tratos a terroristas suspeitos ou condenados. Encontramos jornais e redes de televisão — e, freqüentemente, redes estatais de televisão — colocando governos democráticos e terroristas em um nível de igualdade moral. Encontramos governos se omitindo em seu dever de persuadir o público de que os terroristas não são políticos desencaminhados. Eles são criminosos. Eles são criminosos extraordinários, de fato, de vez que representam uma ameaça não apenas para os indivíduos que assassinam sem compaixão, mas para toda a matriz da sociedade. Mas mesmo assim continuam criminosos.Em suma, o sétimo e mais mortal pecado do terrorismo é que ele tenta induzir a civilização a cometer o suicídio."
Artigo publicado pelo jornal O Estado de São Paulo, 07/10/1979. Disponível também em institutoliberal.org
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