quinta-feira, junho 14, 2007

Recuo táctico.

"Uma retirada táctica. Não é mais do que isso o anúncio de ontem de José Sócrates e Mário Lino, de que o Governo vai encomendar novos estudos e esperar seis meses para decidir se o aeroporto, afinal, vai para a Ota ou fica em Alcochete. Recorde-se que Mário Lino começou o seu mandato afirmando que o aeroporto era na Ota e ponto final. Estava decidido há anos e não havia elementos que permitissem concluír que a decisão estava errada. Foi acusado de casmurrice, obstinação, de decidir porque sim, sem base em quaisquer estudos conhecidos. Resposta táctica: montou uma operação mediática, sentou no palco os autores de dezenas de estudos e divulgou todos os documentos que justificavam a escolha. A decisão parecia irreversível e a oposição remeteu-se ao silêncio.

Percebeu-se há algumas semanas atrás quando o ‘dossier’ regressou às manchetes dos jornais que este silêncio era apenas temporário. Uma retirada táctica, suficiente para que o Governo baixasse a guarda na confiança de uma batalha ganha. A táctica parece ter resultado. O Governo menosprezou as vozes que se levantaram durante as últimas semanas a criticar a opção Ota, e deixou o debate fugir de controlo. Numa altura em que as fileiras adversárias pareciam unidas e engrossavam com aliados de peso – os reparos de Cavaco Silva terão certamente ajudado – levaram o Governo a usar das mesmas tácticas. Fingir uma retirada para recuperar forças, e voltar a atacar em momento propício, de surpresa e em força. Pelo menos consegue congelar o debate durante seis meses, até muito próximo do final da presidência portuguesa da União Europeia.

Sun Tsu, Maquiavel, Churchill, todos os autores que alguma vez escreveram sobre técnicas de batalha têm reflexões brilhantes sobre retiradas tácticas que se encaixariam como uma luva no debate da Ota. Daquelas tiradas que, de tão citadas pelos colunistas, se tornaram demasiado fastidiosas para aqui as repetir. Tão fastidiosas, de resto, como o próprio debate sobre se o novo aeroporto deve ser no poceirinho ou no Poceirão, na Ota ou na porcalhota. A questão merece ser discutida de forma séria. Mas já passou esse tempo. Hoje é claro que uma decisão que deveria ser estratégica para o país será, afinal, decidida com base nas manobras tácticas de ‘lobbies’. A única diferença é saber se ganham “suntsunianos” ou os mais maquiavélicos.

Por muito sério que seja o trabalho do LNEC e por mais conclusivo que seja o novo estudo, é ingénuo quem pensar que o Executivo irá mudar a sua decisão sobre a Ota. E é igualmente ingénuo o Governo se acredita que com esta manobra conseguirá reunir mais consenso em relação à Ota do que aquele que tem hoje. Ou seja, nenhum
."

Pedro Marques Pereira

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