Real Fábrica do Gelo
Real Fábrica de Gelo da Serra de Montejunto pode, também, ser designada por fábrica de neve. Denominação, aliás, mais correcta, reconhecendo-se, de imediato, a natureza técnica e económica do lugar industrial.
Considerada como um testemunho único em Portugal, esta tipologia fabril é um modelo técnico importado, coetâneo de uma cultura europeia, e não só, a partir, essencialmente, do século XVII - XVIII, certamente adaptado a condicionalismos geográficos e climatéricos. Os vestígios materiais encontrados são geralmente os poços - cuja função era a de armazenamento da neve, guardada entre Outubro e Maio e distribuída nas fases de estio.
Julião Pereira de Castro edificou os poços de armazenamento de neve da serra da Lousã e reedificou a fábrica de Montejunto pela década de oitenta de Setecentos. A placa que encima a porta mais nobre do edifício de armazenamento do gelo, a lembrar um espaço religioso, tanto pelas soluções construtivas ou evocativas da fachada, como pelo destaque que este edifício detém no conjunto da fábrica, onde se localizam 3 poços, refere - esta Fabrica cõ suas Pertesas c'oprou e reedificou Julião Prª de Castro Capitão de Malta Reposteiro e Neveiro da Casa Real no ultimo de Janeiro de 1782.
A designada Real Fábrica de gelo é uma fábrica privada, cujo produto também era vendido à Casa Real. Sem a presença de um forte ou arrojado equipamento tecnológico, nem de um motor centralizado, dependente de uma força motriz assente na energia hidráulica, este espaço produtivo, não deixa, contudo, de se inserir na lógica fabril, de produção rural, e muitas vezes próximo de um universo oficinal - como os pisões, por exemplo.
Para a obtenção do gelo foi equacionado um modelo racional, faseado de obtenção de gelo, dependente, apenas, aparentemente, de factores climatéricos e de elementos da natureza como a água. A racionalidade subjacente a este processo, a sua concentração num mesmo espaço, apesar da utilização de uma mecanização mínima, permite inferir a presença de um pensamento produtivo já muito distante apenas da recolha da neve e do seu consequente armazenamento, permitindo-nos falar em fábrica.
Para além dos vestígios materiais que ainda se encontram in situ, seria necessário todo um conjunto de instrumentos, já hoje desaparecidos. Sumariamente, referenciam-se três áreas funcionais que se podem comparar com secções de fabrico localizadas e implantadas em paisagem natural, integrando-a, funcionando duas delas ao ar livre.
Identificam-se, assim, a área da extracção da água, constituída por dois poços, uma casa da nora e um tanque grande; a da fabricação do gelo por processos naturais composta por um conjunto de 44 tanques de pequena profundidade, articulados entre si, por um sistema de condução da água a partir do tanque grande da área da extracção e a do armazenamento e expedição do gelo, referente aos poços de armazenamento do gelo, implantando-se as duas primeiras áreas numa plataforma natural e os poços num terreno em declive.
Este é o conjunto funcional chegado até nós. Consultando, no entanto, documentação diversa e tendo presente que este lugar funcional teve vários momentos de construção, sabemos hoje que esta fábrica era maior. No seu momento mais áureo, teria:
a) Na área de extracção da água - dois poços, uma lagoa.
b) Na área de fabricação do gelo - duas secções de tanques de congelação.
c) Na área de depósito do gelo - uma estrutura contrafortada que integraria os poços de armazenagem do gelo.
O gelo, envolto em palha, feno e serapilheira, descia a Serra em direcção à corte, no dorso de animais. O restante trajecto era feito em carros de bois até às margens do Tejo e os últimos quilómetros eram feitos de barco.
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