segunda-feira, junho 28, 2004

Ida para Bruxelas


Com o recente convite formulado pela presidência irlandesa ao primeiro ministro português Durão Barroso abre-se um horizonte político novo em Portugal, quer pelo ineditismo de vermos um político no activo ser “chamado” a assegurar um cargo de relevo na Europa e no mundo, quer pela situação política criada em Portugal.

No momento em que escrevo ainda não se sabe qual será a posição do Presidente da República em relação ao futuro da actual legislatura, nem sequer qual a reacção oficial de Durão perante esta situação, mas há questões de interpretação política que podem desde já ser tiradas.

Ao nível da governação, é sabido que Durão pela sua personalidade era o único que inequivocamente permitia uma boa articulação entre o PSD e o CDS na actual coligação nascida do acordo pós eleitoral e que permite o funcionamento da actual maioria, o que convém aos partidos que a compõem.

Ao PSD porque lhe permite governar sem sobressaltos, e sem ter que fazer a cada momento acordos parlamentaras quer à esquerda quer à direita ao CDS que apesar da fraca capacidade eleitoral, lhe permitiu ocupar três pastas chave no Governo.

É óbvio quer no PSD existem anti-corpos grandes à presença de Portas no Governo e ainda mais à sua liderança de um partido com o qual o PSD tem um acordo pós eleitoral com incidência governativa.

Mas seja qual for o resultado desta situação nova criada e que até quarta ou quinta-feira deverá ser conhecido, apesar dos timings serem geridos pelo Presidente, há interpretações políticas que devem ser tiradas e conclusões que em nada abonam para o prestígio das instituições e da política.

Quero ainda dizer que esta situação criada, e apesar das boas ou más razões para o convite endereçado a Barroso para presidir à Comissão Europeia, este prestigia Portugal, já que é a primeira vez que um português virá a ocupar um lugar de relevo evidente na cena mundial, depois de José Cutileiro na UEO e de Freitas do Amaral na ONU.

Não que essa presidência ao ser assegurada por um português possa vir a trazer proveitos políticos ou materiais em Portugal, e nem sequer é suposto que um presidente da Comissão Europeia, como a nacionalidade de qualquer comissário, beneficie o país da sua nacionalidade, mas pela visibilidade que um país como o nosso pode vir a ter no seio da nova Europa dos 25.

Mesmo que se considere que esta é uma candidatura de recurso e que agrada aos dois principais blocos da EU, já que os candidatos naturais de cada um desses blocos viu a sua candidatura ser vetada pelo bloco antagónico.

Nem sequer vou discorrer sobre uma atitude que Durão poderia assumir semelhante à do primeiro-ministro luxemburgês que após a sua eleição para o pequeno país recusou liminarmente a hipótese de ser convidado, já que tinha assumido um compromisso como o seu eleitorado, e daí essa recusa.

Portanto a ver vamos, caso Durão aceite, qual o papel que os grandes países da EU e os blocos lhe reservam, para que a sua presidência não seja uma mera continuidade da mediocridade que marcou a de Romano Prodi.

O prestígio dessa presidência também depende do desempenho que Durão venha a ter e da dinâmica que pode imprimir para a continuação da construção europeia, agora recentemente alargada.

As considerações sobre este caso despoletado na passada sexta feira são sobretudo de ordem interna e há já consequências políticas para Barroso, para o seu partido, para a coligação e para o Governo da República, para além de considerações gerais políticas que se podem tirar e que podem ser objecto de muitas interpretações políticas.

1.
Ao aceitar o cargo, como tudo leva a crer, Barroso deixa no PSD a responsabilidade de escolher e propôr um sucessor para assumir o cargo de Primeiro Ministro, e nesse caso terá que ser forçosamente uma personalidade que compatibilize o PSD com a continuidade da actual coligação.

Tratando-se de uma coligação por interesse, é natural que ambos os partidos desejem a sua continuidade, mas para isso a personalidade que vier a assumir o poder terá que ser capaz de a assegurar.

A figura de Santana Lopes parece ser a mais consensual para esse desiderato.

Simplesmente a Santana não são reconhecidas capacidades nem perfil para o cargo, já que a sua prestação nos cargos políticos para os quais tem sido eleito têm deixado muitíssimo a desejar, e a sua prestação à frente da maior autarquia do país tem-se notabilizado por um imobilismo atroz que nem a polémica construção do túnel do Marquês permite disfarçar.

Nada do que foi prometido foi feito ou pelo menos iniciado desde os estranhos projectos relacionados coma reabilitação do Parque Mayer ou do Casino, como as ideias meritórias mas meramente eleitoralistas, como as de devolver a cidade ao jovens, através de construção mais acessível no centro da cidade, continuação do combate à desertificação do centro da cidade, restrições ou reformulação do trânsito na cidade, políticas pró-activas de combate ao insucesso escolar ou ao nível da acção social da Autarquia, uma política cultural autárquica inexistente, etc.

Crê-se que a ser nomeado Primeiro-Ministro, sob proposta do PSD e a ser aceite pelo Presidente Sampaio, se verifique a concretização do famoso Princípio de Peter, a somar ao facto de Santana passar a ter pela frente um resto de legislatura de apenas dois anos, o que não lhe permitirá lançar linhas de governação consequentes.




2.
Barroso e o PSD, tal como o seu parceiro de coligação sempre disseram que Guterres fugiu às responsabilidades após a derrota eleitoral autárquica de Dezembro de 2001, deixando o “menino nos braços” do PSD, que com altíssima missão patriótica foi chamado a governar (os eleitores decerto se esqueceram de chamar o CDS, mas ambos os partidos emendaram rapidamente, esse esquecimento), e encaminhado o país para o progresso económico e social para 2006, e mesmo para 2010, tomando Barroso e os estados maiores dos partidos da coligação como adquirido que a vitória nas legislativas de 2006 estavam antecipadamente ganhas.

Claro que agora com esta mais que previsível ida para Bruxelas fica a dúvida sobre qual a posição do PSD e do CDS perante tão precipitada saída de Barroso do Governo.

Foi fuga perante os resultados de há duas semanas na Europeias?

Foi fuga perante os resultados económicos e sociais em Portugal que tardam e ser positivos?

Foi fuga perante a falta de popularidade governamental e perante a crise social da população e descrédito perante a actual maioria?


3.
Guterres também fora sondado para presidir à Comissão Europeia em 99, mas recusou liminarmente essa hipótese, preferindo o governo de Portugal.

E após a derrota autárquica de Dezembro de 2001, não abandonou o Governo devido a um convite aliciante na cena internacional.

Preferiu antes que em Portugal houvesse uma clarificação política, para, segundo as palavras dele evitar que em Portugal se caísse numa situação pantanosa.

Como se explica agora que os estados maiores dos dois partidos da coligação fujam à possibilidade de eleições, e insistam num sucessor, sem que ao menos os órgãos máximos do PSD se pronunciem sobre a sucessão do líder?

4.
Se é certo que formalmente os eleitores votam em partidos, cada vez mais a pessoalização da política indica que muitos eleitores votam nos líderes, nos cabeças de lista.

No caso de Lisboa, os eleitores preferiram Santana a João Soares, e dado que aí o PSD concorreu só, os eleitores do CDS votaram em Paulo Portas.

Também Carmona Rodrigues e Henrique de Fretas, actuais membros do Governo foram eleitos para a Câmara da capital, mas nada disso parece interessar.

Claro que Portas foi para o Governo, e agora Santana se prepara para lhe ir fazer companhia

E Barroso em Bruxelas está longe do lugar para o qual os eleitores do PSD em 2002 o elegeram e nele confiaram.

Por este andar, um dia estaremos a ser governados pelos suplentes das listas.

5.
Finalmente a curiosa nota do voluntarioso líder parlamentar do CDS-PP, Telmo Correia que ontem apareceu nas TV’s, a congratular-se com tão honroso convite para o nosso país:

Leu o papel em que afirmou o respeito que o CDS reserva perante a decisão a ser tomada pelo Presidente Sampaio, que deve ser isenta de pressões, mas acrescenta que o CDS-PP também considera serem de respeitar os resultados eleitorais de 2002.

Se isso não é condicionalismos e pressões de um partido de 7% de eleitorado perante a necessária decisão presidencial, não sei o que será.

Mas do CS-PP há que esperar de tudo, desde o célebre caso do Metro do Terreiro do Paço, em que este partido forçou o PSD a antecipar-se às conclusões da Comissão de Inquérito parlamentar, e culminando na palhaçada do Ministro Valente de Oliveira ter escondido os relatórios do Tribunal na gaveta sem deles ter dado conta à AR.

Como nota final, se se respeitassem os resultados eleitorais de 2002, julgo que o CDS-PP não terá grandes razões para sorrir, já que é altamente duvidoso que um partido de 7% possa ter três ministros no Governo da Nação e dois euro-deputados.

Mas falta ainda saber qual a decisão de Sampaio, perante esta situação.




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