Populismo: guia prático.
"Se o seu objectivo é tornar-se um político populista, não um pequeno populista do género do dr. Louçã, mas um que conte, ganhe eleições, ocupe o poder, escolheu a época certa e o país certo. O nosso tempo histórico não é outra coisa senão populista. O poder ainda pertence às elites mas os gostos culturais, que determinam o que tem e o que não tem relevância, estão na posse do povo. O povo é quem mais ordena porque é ele que compra, paga e consome. Portugal é, além disso, o sítio perfeito para qualquer candidato.
A população não é muito educada, os portugueses são chorosos, as elites, interesseiras, vivem a sua vida. O caminho está portanto livre.Não é difícil ser populista. Como sempre, são precisas algumas virtudes naturais. Mas o essencial está no método, no treino, na oportunidade. Comece por vigiar a imagem, e sem demoras. Enquanto V. se prepara para o seu próprio populismo, outros, eventualmente mais arrumados, fazem também o mesmo fantasiando com o poder e as vias mais rompantes para o conquistar. Não pense que a melhor imagem populista é a de um sujeito grotescamente abonecado e viril. Nada disso. Um populista bem sucedido pode fazer-se perfeitamente com as olheiras baças e a farripa solta. Do que precisa é de perceber três coisas. Primeiro, que estar na política é ter as mais sarnentas criaturas da espécie a olhar para si as vinte e quatro horas do dia; segundo, que tem de saber usar a televisão em seu benefício, aparecendo frequentemente nos vários canais com a litania estudada; e terceiro, que é indispensável expor toda a sua diferença para que os cidadãos passem a encará-lo a si como não encaram os outros.
O populismo alimenta-se desta obsessão comparativa, desta contínua exposição da diferença. V. não é como eles, não fala como eles e, sobretudo, não tem os vícios deles. Seja por isso fresco, jovial, vibrátil. Seja sempre aquilo que os seus adversários não são. Estude-os como se estuda a si. E, a propósito, esqueça os consultores de imagem, sobretudo se forem brasileiros. Os brasileiros inventaram o Eng. Guterres.Treine de seguida a voz, a dicção e a prolepse. Não arraste o tom nem o diminua demasiado. Nas democracias modernas, não é importante o que se diz mas, claro, a maneira como se diz. Um populista não deve fazer discursos substanciosos. Um populista não pode querer ser compreendido.
Um populista não pretende exactamente respeito. Um populista, pelo contrário, deseja afecto, drama, desvario. Um populista é um místico, um entertainer, um pregador. Por isso, não complique. Diga frases curtas. Exponha toda a sua convicção e certeza. Sonhe. Se não for naturalmente um simples, esforce-se por sê-lo. E grite, grite com raiva. Nenhum populismo se faz sem uma dose elevada de estridência.Lição número 2: o discurso. Um populista vitorioso tem de conhecer o seu público. Sem conhecer os pontos fracos, sem saber onde é que esse público vibra, não há sucesso possível. A política populista é de estímulos, de instantes. Esqueça a teoria e a reflexão. Esqueça os procedimentos. Reaja ao momento. Faça promessas, repetidas promessas. Vá ao futebol. Rodeie-se de jovens, de mulheres, de artistas plásticos. Não ambicione a fazer obra. V. é a obra. A sua permanência e a sua popularidade são o seu principal objectivo. Ignore as dificuldades e os limites da política. Para si não há limites nem dificuldades. V. tem ideias para o país. V. sabe como é que o país prosperará. Talvez não saiba se isso é possível. Talvez desconheça os assuntos.
Mas V. deve ser, no fundo, um mestre em generalidades. Aprenda a defender o indefensável - uma frase de George Orwell e a substância do seu discurso. Dispense os intermediários. Lide directamente com as pessoas e com os seus problemas. Não se preocupe com as instituições. O populismo é anti-institucionalista. As pessoas estão sempre certas. As instituições estão sempre erradas. As pessoas são boas. As instituições são más. V. está obviamente do lado das pessoas.Não pode fazer tudo sozinho. E por isso, deve apadrinhar uns quantos fiéis para o assistirem. Lembre-se: o seu projecto é a longo prazo. Por enquanto, ninguém sabe de si, ninguém o respeita. Comece a aparecer.
Estime os jornalistas, nunca os irrite. E não se esqueça que, tarde ou cedo, a oposição vai chegar. Alguém descobrirá os seus verdadeiros interesses. As críticas virão. Mas até para isso o populismo tem saída. Aumente o número daqueles que dependem de si e espalhe-os depois por onde conta. Eles perdem liberdade, V. adquire poder. Entre a liberdade dos outros e o seu próprio poder: qual é a dúvida?"
Pedro Lomba
1 Comments:
best regards, nice info » » »
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