sábado, novembro 22, 2008

O rectângulo das Bermudas

"Manuela Ferreira Leite é candidata a primeiro-ministro de uma ditadura provisória que pretende pôr ordem num país ingovernável.

Em Portugal só existem democratas. Aliás, o espírito democrático corre nas veias nacionais em perfeito convívio com a indignação e a superioridade moral. O país sempre entendeu a democracia como uma virtude repleta de vícios, daí o relevo da hipocrisia enquanto exercício nacional.

Manuela Ferreira Leite prometeu devolver a seriedade à política e dizer a verdade aos portugueses. Como tal, quando Ferreira Leite afirma a necessidade de uma suspensão de seis meses na democracia nacional, os portugueses só podem acreditar e agradecer. Quanto ao argumento da ironia, a doutrina ainda se divide. A ironia é uma arma política perigosa e ao alcance de muito poucos – exige sofisticação, confiança e um discurso político carismático e afirmativo no qual não há lugar para hesitações. Junte-se ainda uma proximidade e cumplicidade com a audiência. Logo, se a líder do PSD pretendeu ser irónica, revelou simplesmente a sua profunda impreparação política. Se Ferreira Leite pretende suspender de facto a democracia, exibe pois toda uma inocência que atesta o seu bom carácter, mas que funciona como um verdadeiro suicídio político.

É um clássico da política nacional a ideia de que o país só consegue concretizar as reformas em ambiente de ditadura. E é também um tema obrigatório da política nacional a ideia de que Portugal é um país que não se governa nem se deixa governar. Existe pois um absurdo no meio de um paradoxo – Manuela Ferreira Leite é candidata a primeiro-ministro de uma ditadura provisória que pretende pôr ordem num país ingovernável.

Entretanto, a ministra da Educação (novo exemplo de ironia) passeia pelo país a sua pequena fraqueza política. Como seria de esperar, ao pressentir o sangue da vítima, os sindicatos de professores exigem a suspensão da avaliação e prometem o apocalipse total e parcial. Perante a ameaça, Maria de Lurdes Rodrigues insiste em direcção ao abismo e Sócrates finge convicção onde apenas existe vergonha e incompetência.

A incompetência está num Governo que olha o país como um somatório de corporações a dominar. Depois, Sócrates governa para dividir e divide para reinar. Não existe a ideia de interesse nacional, constantemente confundido com o interesse particular do Governo. Assim se explica o facto das reformas aparecerem no discurso e desaparecerem na realidade. E se fosse em ditadura?
"

Carlos Marques de Almeida

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