O CERCO
"Acho que já todos viram o filme. Numa escola do bairro do Cerco, no Porto, um bando de "alunos" do 11.º ano aponta uma pistola de plástico à professora de Psicologia e exige notas positivas (com sucesso, viu-se depois). Um "aluno" com vocação jornalística filma a cena com o telemóvel e põe-na a circular na Internet. O país indigna-se durante a ressaca natalícia. O sindicalista Nogueira interrompe a preparação de greves e abaixo-assinados nunca vistos para emitir uns protestos vagos. A presidente da escola em questão define o episódio como "uma chatice". A directora da DREN chama-lhe "uma brincadeira de mau gosto". Uma mãe local garante que "os jovens de 17 e 18 anos são assim". Um representante das associações de pais culpa a DREN por não impedir os telemóveis nas salas de aula.
Se bem se percebe, o consenso geral determinou não ser grave que estudantes criativos simulem um ataque armado a uma docente. Aparentemente, também não será grave que, segundo testemunhos diversos, a maioria dos ataques em escolas não sejam simulados e decorram com relativa frequência e armas reais. Grave, gravíssimo é que as versões filmadas dos acontecimentos irrompam por aí ao desbarato.
Sinto-me obrigado a concordar. O caso do Cerco é um mero sintoma do estado do ensino público. A "luta" entre professores e ministério é outro. Se as causas da miséria não cabem neste texto, a cura não cabe na realidade: a educação desceu a um buraco do qual, por incrível que pareça, nem os incontáveis méritos do computador Magalhães a conseguirão resgatar. Dissolvidos os últimos vestígios de disciplina, exigência curricular e tino, o "sector", para usar uma expressão corrente, abandonou há muito os motivos que começaram por justificar a sua existência. Hoje, com variações de grau que não comprometem o cenário geral, existe somente para distribuir empregos e remover fedelhos do mundo exterior. Lá dentro, no mundo "deles", decorre uma encenação ficcionada ou verídica da violência, da resignação e da apatia. Não é um espectáculo bonito de se ver, logo não há motivos plausíveis para que o vejamos.
Hipocrisia? Uma dose moderada nunca matou ninguém. E se matar ou magoar um bocadinho nós não sabemos."
Alberto Gonçalves
Se bem se percebe, o consenso geral determinou não ser grave que estudantes criativos simulem um ataque armado a uma docente. Aparentemente, também não será grave que, segundo testemunhos diversos, a maioria dos ataques em escolas não sejam simulados e decorram com relativa frequência e armas reais. Grave, gravíssimo é que as versões filmadas dos acontecimentos irrompam por aí ao desbarato.
Sinto-me obrigado a concordar. O caso do Cerco é um mero sintoma do estado do ensino público. A "luta" entre professores e ministério é outro. Se as causas da miséria não cabem neste texto, a cura não cabe na realidade: a educação desceu a um buraco do qual, por incrível que pareça, nem os incontáveis méritos do computador Magalhães a conseguirão resgatar. Dissolvidos os últimos vestígios de disciplina, exigência curricular e tino, o "sector", para usar uma expressão corrente, abandonou há muito os motivos que começaram por justificar a sua existência. Hoje, com variações de grau que não comprometem o cenário geral, existe somente para distribuir empregos e remover fedelhos do mundo exterior. Lá dentro, no mundo "deles", decorre uma encenação ficcionada ou verídica da violência, da resignação e da apatia. Não é um espectáculo bonito de se ver, logo não há motivos plausíveis para que o vejamos.
Hipocrisia? Uma dose moderada nunca matou ninguém. E se matar ou magoar um bocadinho nós não sabemos."
Alberto Gonçalves
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