quarta-feira, julho 22, 2009

Claque inteligente

"O apoio de "personalidades públicas" à candidatura de um político é sempre um processo engraçado. Primeiro, na expectativa de benesse ou mera notoriedade, a "personalidade" X declara o seu entusiasmo pelo político Y. Depois, na expectativa de que a "personalidade" X contagie anónimos (os pelintras que não são "personalidades"), o político Y agita-a em público género penduricalho. Consequências? O anónimo ignora o assunto, o político julga-se estimado, a "personalidade" arrisca uma tença e eu divirto-me à grande.

Confesso, porém, que raras vezes o potencial de diversão atingiu o nível verificado na actual campanha de António Costa. Nem falo da simpatia de José Saramago, comprada à custa do património municipal. Falo do CLAC, Cidadãos Lisboetas Apoiam António Costa, que conheci através de notícia no "Público", onde se descreve o movimento subscrito por "120 intelectuais".

O título da notícia já é um prodígio cómico: "Costa tem 'a intelligentsia do lado dele'", citação colhida num Eduardo Pitta, a que o jornal chama "escritor" e que parece ter ganho um "t" por troca com o "a" que falta ao CLAC. Mas não sei o que tem mais piada, se a candura com que o sr. Pitta, cuja obra talvez seja familiar a 0,006% dos portugueses, se coloca a ele próprio na "intelligentsia", ou se a "intelligentsia" propriamente dita.

Vejamos a lista dos "120 intelectuais": actores de telenovela, fadistas e cançonetistas ligeiros (incluindo o fatal Represas), sindicalistas, "artistas plásticos", a activista "palestiniana" Maria do Céu Guerra, aquela senhora da "Abraço", o capitão/coronel/marechal de "Abril" Vasco Lourenço, incontáveis funcionários da autarquia (pudera) e puros desconhecidos (para mim). E o sr. Pitta.

Escusado dizer que, salvo duas ou três excepções (Eduardo Lourenço, por exemplo), as criaturas da lista não são a elite cultural lisboeta. Mas o simples facto de poderem ser seriamente apresentadas como tal (e com direito a debate sobre a acepção histórica de "intelectual") trai uma certa rusticidade, um certo arzinho a menino da lágrima e "marquise" de subúrbio que não destoaria em Kinshasa ou Bogotá. Ou em Gaza, com que, não por acaso, querem "geminar" a capital. Em si, a presumida "intelligentsia" em prol de António Costa vale zero, ou menos. Enquanto sintoma, é o retrato nítido do nosso lugar no mundo e do nosso atraso. 120 intelectuais? O sr. Represas? Não encontraram o pequenito Saul (com o devido respeito por este)? Se não rirmos disto, a alternativa será um pranto interminável
."

Alberto Gonçalves

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