Sem tirar os pés do chão
"A minha avó paterna não acreditava na chegada à Lua. Sempre que alguém lhe falava no assunto, a senhora irritava-se a sério. O facto de apenas ter frequentado a escola durante dois ou três anos e escapado por pouco do analfabetismo influenciaria a descrença e a irritação. Não sei porquê, em criança eu achava graça àquilo e maçava-a com a Apolo 11 tanto quanto podia. Não sei porquê, hoje continuo a achar graça a gente de acrescida (?) instrução que se recusa a admitir a alunagem.
Ao contrário da minha avó, cujos argumentos se resumiam à cisma, estes "negacionistas" movem-se pelo antiamericanismo da praxe e a negação, ignoro se convicta se desejada, constitui a alternativa folclórica à cautelosa indiferença que outros dedicam ao assunto. Quarenta anos depois, a viagem comandada por Neil Armstrong (ou Louis, ouvi um destes dias um jornalista chamar-lhe) ainda é um critério da supremacia do capitalismo sobre o comunismo.
Desculpem a pergunta, mas não é um critério absurdo? E se a União Soviética tivesse ganho a corrida espacial, hipótese que, até certa altura, parecia provável? Isso significaria exactamente o quê? Que um regime totalitário era preferível a uma democracia próspera? A mim, causa-me um bocadinho de espécie que a "escolha", mesmo que simbólica, da liberdade ou da submissão tenha estado dependente da nacionalidade do sujeito a pisar primeiro solo a quase 400 mil quilómetros de distância daquele que nós, os simples, pisamos diariamente. Não fora o prodigioso avanço científico associado à proeza, uma partida de póquer ou a moeda ao ar garantiriam idêntico rigor. E, embora vital, a ciência não é tudo.
A superioridade dos EUA face à URSS era, para usar uma expressão cara aos derrotados, principalmente "moral" e, por sinuosos caminhos, traduzia-se nas piscinas privadas de Los Angeles e nos medonhos bairros de Leninegrado, nos néones de Manhattan e nas filas do racionamento em Moscovo, na abundância de Oklahoma e na fome dos Urais, nos russos que cruzavam em fuga o Atlântico e nos americanos que não faziam o percurso inverso. Em qualquer caso, na Terra e entre os homens. No que respeita à Guerra Fria, na essência decidida à partida, a Lua foi um passo pequenino e redundante. No resto, claro, foi o tal salto."
Alberto Gonçalves
Ao contrário da minha avó, cujos argumentos se resumiam à cisma, estes "negacionistas" movem-se pelo antiamericanismo da praxe e a negação, ignoro se convicta se desejada, constitui a alternativa folclórica à cautelosa indiferença que outros dedicam ao assunto. Quarenta anos depois, a viagem comandada por Neil Armstrong (ou Louis, ouvi um destes dias um jornalista chamar-lhe) ainda é um critério da supremacia do capitalismo sobre o comunismo.
Desculpem a pergunta, mas não é um critério absurdo? E se a União Soviética tivesse ganho a corrida espacial, hipótese que, até certa altura, parecia provável? Isso significaria exactamente o quê? Que um regime totalitário era preferível a uma democracia próspera? A mim, causa-me um bocadinho de espécie que a "escolha", mesmo que simbólica, da liberdade ou da submissão tenha estado dependente da nacionalidade do sujeito a pisar primeiro solo a quase 400 mil quilómetros de distância daquele que nós, os simples, pisamos diariamente. Não fora o prodigioso avanço científico associado à proeza, uma partida de póquer ou a moeda ao ar garantiriam idêntico rigor. E, embora vital, a ciência não é tudo.
A superioridade dos EUA face à URSS era, para usar uma expressão cara aos derrotados, principalmente "moral" e, por sinuosos caminhos, traduzia-se nas piscinas privadas de Los Angeles e nos medonhos bairros de Leninegrado, nos néones de Manhattan e nas filas do racionamento em Moscovo, na abundância de Oklahoma e na fome dos Urais, nos russos que cruzavam em fuga o Atlântico e nos americanos que não faziam o percurso inverso. Em qualquer caso, na Terra e entre os homens. No que respeita à Guerra Fria, na essência decidida à partida, a Lua foi um passo pequenino e redundante. No resto, claro, foi o tal salto."
Alberto Gonçalves
2 Comments:
Pormenores de antiamericanismo pululam por aí cada vez mais... e o mais curioso é que não foi a administração Bush que veio despoletar essa tendência. Toma lá mais um exemplo, que publiquei no meu blog": "Ontem tive a sorte de assistir a um momento com resquícios anti-americanos por parte de uma francesa... Roselyne Bachelot (actual Ministra da Saúde e do Desporto), quando afirmou que a ida à Lua não terá sido "um grande passo para a humanidade" mas um grande passo para os americanos e, parafraseando-a, "eles não eram representantes da humanidade mas sim americanos e estavam acima de nós, mostrando a sua hyper-puissance"... sic."
isto não tem nada a ver com capitalismo sobre o comunismo, não lançe areia para os olhos. Tem tudo a ver com Nixon, um dos maiores mentirosos do século XX, que aliás foi durante a presidência dele que durou o chamado programa lunar, e se o Kubrick fez em 68 um filme tão realista como 2001,odisseia... eu lá sei o que aconteceu! mas não me peça para acreditar em mentirosos. Quanto maior a mentira....
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