quinta-feira, agosto 20, 2009

A esquerda é poder escolher

"Barack Obama escreve hoje no i um artigo ("Porque precisamos de uma reforma da saúde") onde explica por que razão quer mudar o sistema de saúde americano. Diz ele: 14 mil seguros de saúde são cancelados todos os dias nos Estados Unidos da América pelas seguradoras. E explica: o acesso a cuidados de saúde, hoje negado a 46 milhões de americanos, vai alargar-se - todos terão via verde.

O assunto parece brincadeira para os ouvidos da Europa social: nenhum europeu de baixo rendimento morre à porta de um hospital. Pois não: mas existe uma enorme diferença entre um plano nacional de saúde, universal e gratuito, e um sistema de seguros de saúde nacionais. Isso significa que o modelo de Obama privilegia o sistema privado e a escolha de cada um. Escreve Obama no i: "As decisões de saúde de cada um devem ser apenas do próprio e do respectivo médico; não competem a burocratas governamentais nem às seguradoras." A música europeia desafina: Obama quer pagar seguros mas não se intrometer na saúde de cada um. O tema, parecendo distante, é muito relevante para o debate eleitoral português. Comece-se com um exemplo.

O Ministério da Educação diz que há 1,7 milhões de crianças portuguesas inscritas na escola. Dessas, apenas 22% frequentam o ensino privado: 300 mil. O Bloco de Esquerda, candidato importante nesta guerra eleitoral, diria que assim é que deve ser. No ensino e na saúde. Mas está enganado: a esquerda que se interessa pelas pessoas (Obama, por exemplo) sabe que o mais importante é dar possibilidades de escolha reais a quem não as tem. É uma esquerda que se bate pelo essencial: evitar que só os ricos possam verdadeiramente fazer escolhas.

Chamem-se os bois pelos nomes: os meus filhos estudam no ensino privado porque eu posso pagar. Isto é, fui livre de escolher o que parecia mais adequado tendo em conta o bairro onde vivo, a idade de cada um deles e a qualidade da alternativa oferecida pelo ensino público. Se o meu rendimento familiar fosse igual ao da classe média (as tais 1,6 milhões de famílias portuguesas que, de acordo com o fisco, ganham menos de 30 mil euros/ano), esta escolha estava- -me vedada. Ou seja, esta esquerda moderna (que não se vislumbra em Portugal) entendeu que justiça social não é nacionalizar - é procurar formas de potenciar as escolhas dos que não podem fazê-las. E os que não podem fazê-lo são os mais pobres - para quem nem sempre a melhor solução é a escola da esquina ou o médico da esquina seguinte. Por isso Obama diz: não quero burocratas governamentais a meter-se na saúde de cada um. Ele sabe que isso anula a escolha dos que menos podem - e deixa os bons hospitais para os que podem escolher: isso, os mais endinheirados.

Por cá insiste-se em dividir a sociedade entre ricos e pobres. Errado: a decisão certa é entre quem pode escolher e quem não pode. E os políticos que nos merecem são aqueles que procuram soluções (não ideológicas) para dar mais escolha a quem nada escolhe
."

Martim Avillez Figueiredo

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