quinta-feira, setembro 01, 2011

Temos Governo ou cobradores de impostos?

"Sim, ainda é de facto cedo para avaliar o desempenho do Governo. Mas já começa a ser tarde para dizer que basta de anunciar novos impostos. Porque aquilo a que temos assistido até agora parece apenas o mesmo filme a que assistimos há uma década, sempre com novos personagens.

Vítor Gaspar corre o risco de se transformar no ministro que, quando fala, anuncia impostos. Sem alguma vez explicar com a mesma clareza como se vai cortar a despesa pública que colocará um fim a mais e mais impostos. Mesmo sabendo, todos nós, que menos gastos públicos vão significar o fim de alguns serviços prestados pelo Estado ou serviços públicos mais caros - como já acontece com os transportes ou com a saúde -, só atacando seriamente a despesa poderemos esperar que não haja mais novos impostos.

O ministro das Finanças fez até agora três importantes intervenções. Em todas elas anunciou um novo imposto. Na primeira foi o imposto extraordinário sobre o subsídio de Natal; na segunda, a antecipação da subida do IVA na energia; e na terceira, a de ontem, a taxa adicional de solidariedade de IRS e IRC, uma espécie muito peculiar de imposto sobre os ricos.

O Governo tem dito até à exaustão que quer ser mais ambicioso nos objectivos do que o exigido pela troika. Até agora, essa ambição parece limitar-se aos impostos. Todos sabemos também que uma redução rápida do défice público só se consegue fazer com mais impostos. Mas o problema é que estamos há demasiado tempo a ouvir falar em desvios na despesa pública, que justificam esforços acrescidos dos contribuintes, sem qualquer sinal de uma estratégia centralizada para controlar esses desvios e para reduzir a despesa pública. Não são os anúncios avulso e para consumo mediático, deste e daquele ministro, a dizer que os cortes são históricos, que se vão diminuir chefias na Função Pública ou que se nomearam menos pessoas para o gabinete que vão resolver o problema. Com duas excepções, a dos ministros da Saúde e da Educação. Quem conhece a estrutura da despesa pública portuguesa sabe bem que essas medidas, que se podem classificar algures entre o populista e o voluntarista, valem financeiramente menos do que o suposto imposto sobre os ricos.

A intervenção de ontem de Vítor Gaspar soou dolorosamente a um "eu já ouvi isto, é o mesmo filme com mais de dez anos". Tal como pareceu repetitiva a leitura do Documento de Estratégia Orçamental com aquele famoso quadro com o contributo para a redução da despesa pública dos gastos com o pessoal, com isto e mais aquilo e ainda com os famigerados consumos intermédios, os favoritos de muitos ministros das Finanças.

É Vítor Gaspar que não quer cortar na despesa pública? Claro que não. Todos os ministros das Finanças desde praticamente Joaquim Pina Moura tentaram e não conseguiram. Tal como os seus antecessores, Vítor Gaspar é a receita, é o cobrador de impostos, e está nas mãos dos seus colegas de Governo, são eles a despesa.

A fiscalização da troika é a nossa única garantia de que o filme não pode ser o mesmo que já estamos a ver há mais de uma década. Mas valia a pena dar à troika, e a todos nós, mais garantias. Pedro Passos Coelho tem de começar a aparecer ao lado de Vítor Gaspar a anunciar as más notícias de mais impostos. Precisamos de um Governo, e não de cobradores de impostos
."

Helena Garrido

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