sexta-feira, março 23, 2012

O poder dos profetas e das imagens

"O que nos acontecerá se, de repente, os investidores financeiros internacionais acreditarem que Portugal é capaz de gerir a sua dívida? Simples. O programa de ajustamento será um sucesso e os sacrifícios exigidos para o cumprir serão muito mais baixos. Eis a força dos mercados no seu esplendor. E é isso que começa a acontecer com Portugal.

Em contrapartida, se os investidores não acreditarem na capacidade de mudança de Portugal, na capacidade de se disciplinar financeiramente e de aproximar a sua despesa interna ao seu rendimento, o preço do ajustamento pode ser tão brutal como aquele que enfrenta a Grécia. Foi a descrença na capacidade dos gregos satisfazerem as suas dívidas que levou os investidores a fugirem, e até os próprios depositantes.

Os mercados financeiros são dos poucos que têm o poder de concretizar as suas profecias. Quando se gera uma onda de convicção na valorização de um activo, seja ele a acção de uma empresa, o título de dívida de um país ou uma economia, os capitais aparecem e acabam por ditar a subida das acções e a disponibilidade de financiamento para dinamizar a economia.

Teoricamente, os investidores deveriam estar super bem informados. Mas a informação, contrariamente ao que se pressupõe nos modelos dos mercados racionais, não é perfeita e custa dinheiro. Gastar dinheiro para saber se Portugal vai ser um caso de sucesso não tem rendibilidade pela falta de dimensão do mercado português. Também não gastam esse dinheiro com a Irlanda. A razão de fundo para a assimetria no tratamento de Portugal e da Irlanda está no facto de os irlandeses falarem inglês e estarem a dois passos dos dois centros financeiros mais importantes do mundo: Londres e Nova Iorque.

O que fazem então os investidores nestes casos? Vão atrás das convicções generalizadas por quem consideram bem informado e que, frequentemente, são os órgãos de comunicação social internacionais. Quantas vezes neste último ano não vimos as taxas de juro da dívida pública portuguesa subirem apenas por causa de uma notícia no "Wall Street Journal" ou no "Financial Times"?

Como se pode mudar essas convicções? Sem factos novos não há nada a fazer. Até há bem pouco tempo, Portugal nada tinha de bom para mostrar. Pelo contrário. Os buracos financeiros que iam aparecendo criaram a convicção de que o envelope financeiro calculado pela troika era insuficiente. Só agora Portugal começa a ter resultados para apresentar e simpatias da troika para mostrar.
"O sucesso do nosso programa depende da nossa capacidade de afectar percepções e expectativas." A frase é do ministro das Finanças em entrevista dada esta semana ao "Diário Económico" e reflecte bem a fase em que Portugal está na concretização do programa de ajustamento económico e financeiro (PAEF). Como reflecte o que andou Vítor Gaspar a fazer no seu périplo por Frankfurt e Washington e que vai continuar por Angola.

E as percepções e expectativas sobre Portugal estão a mudar. Neste momento, a maioria dos analistas diz que Portugal não vai reestruturar a sua dívida, como o fez a Grécia, e que vai precisar de um novo empréstimo que será concedido sem problemas. São cada vez menos os que dizem que será necessário reestruturar a dívida. Mas começa a surgir no pólo oposto quem diga que Portugal nem vai precisar de um segundo empréstimo. As profecias sobre Portugal estão a mudar. E a prova disso é, mais do que as análises, o dinheiro que está a ser investido em dívida pública que já não poderá ser paga com este empréstimo da troika.

O custo do ajustamento pode mesmo ser mais baixo do que se esperava. Ainda é cedo para festejar mas podemos começar a ter algumas (boas) expectativas.

A violência gratuita, que vimos ontem, em nada contribui para mudar as expectativas sobre o futuro de Portugal. A estabilidade política e a coesão social são activos fundamentais para o sucesso do programa de ajustamento. Todos os sabem. O aparente descontrolo de ontem da polícia, como mostram as fotografias, pode desfazer num ápice o trabalho de formiguinha de conquista de credibilidade externa e distanciamento das imagens de violência da Grécia
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Helena Garrido

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