terça-feira, março 27, 2012

O temível petróleo

"O petróleo já está bem acima dos 100 dólares por barril, apesar do fraco crescimento económico nos países avançados e em muitos mercados emergentes. O prémio do medo poderá fazer subir muito mais os preços, mesmo que acabe por não ocorrer nenhum conflito militar.
A actual frágil economia mundial depara-se com muitos riscos: o risco de um reacender a crise da Zona Euro; o risco de um abrandamento mais significativo do que o esperado na China; e o risco de que a retoma económica nos Estados Unidos perca o ímpeto (uma vez mais). Contudo, nenhum risco é mais sério do que aquele que é colocado por uma nova escalada dos preços do petróleo.

O preço do barril do Brent do Mar do Norte, que no ano passado se manteve bastante abaixo dos 100 dólares, atingiu recentemente os 125 dólares. Os preços da gasolina nos EUA estão a aproximar-se dos quatro dólares por galão [3,78 litros], um limiar danoso para a confiança do consumidor, e aumentarão ainda mais durante o Verão, estação em que há uma forte procura.

O motivo é o medo. As reservas de crude são abundantes e a procura nos EUA e na Europa tem diminuído, à conta de uma menor utilização dos automóveis nos últimos anos e de um crescimento fraco ou negativo do PIB nos Estados Unidos e na Zona Euro. No entanto, os crescentes receios de um conflito militar entre Israel e o Irão criaram aquilo a que se chama "prémio do medo".

As últimas três recessões mundiais (anteriores a 2008) resultaram todas de choques geopolíticos no Médio Oriente que provocaram uma forte subida das cotações do petróleo. A guerra do Yom Kippur, de 1973, entre Israel e os Estados árabes, levou a uma estagflação global (recessão e inflação) em 1974-1975. A revolução iraniana, em 1979, conduziu a uma estagflação mundial em 1980-1982. E a invasão do Koweit pelo Iraque, no Verão de 1990, levou à recessão global de 1990-1991.

Mesmo a recente recessão mundial, se bem que desencadeada por uma crise financeira, foi exacerbada pela escalada dos preços do petróleo em 2008. Com o preço do barril a atingir os 147 dólares em Julho desse ano, as economias avançadas e os mercados emergentes que importavam petróleo confrontaram-se com um ponto de viragem recessivo.

O risco de que a ameaça de Israel de ataque às instalações nucleares do Irão resulte, de facto, num conflito militar, pode ser baixo – mas está a intensificar-se. A recente visita do primeiro-ministro israelita, Benjamin Netanyahu, aos Estados Unidos, demonstrou que o pavio de Israel é muito mais curto do que o dos norte-americanos. A actual guerra de palavras está a escalar, bem como a guerra clandestina que Israel e os EUA estão alegadamente a levar a cabo com o Irão (incluindo a morte de cientistas nucleares e o recurso à guerra electrónica para danificar instalações nucleares).

O Irão, com as costas encostadas à parede, numa altura em que as sanções "mordem" com mais força (especialmente as recentes restrições aos bancos iranianos por parte do SWIFT [Society for Worldwide Interbank Financial Telecommunication] e a decisão da Europa de deixar de importar petróleo iraniano), poderá reagir com um aumento de tensões no Golfo. Poderá até afundar facilmente alguns navios, de modo a bloquear o Estreito de Ormuz, ou promover uma ofensiva através dos movimentos que controla na região, o que inclui as forças xiitas pró-iranianas no Iraque, Bahrein, Koweit e Arábia Saudita, o Hezbollah no Líbano e o Hamas e a Jihad Islâmica em Gaza.

Os recentes ataques a embaixadas israelitas em todo o mundo parecem ser uma reacção iraniana à guerra encoberta que tem vindo a ser promovida contra o país e ao endurecimento das sanções de que é alvo, que estão a agravar os efeitos da má gestão da economia por parte do regime de Teerão. Da mesma forma, a recente escalada nos combates transfronteiriços entre Israel e os militantes palestinianos sediados em Gaza poderá ser um sinal do que está para vir.

As próximas semanas poderão trazer uma diminuição das tensões, já que os EUA, França, Alemanha, Reino Unido, China e Rússia vão levar a cabo mais uma ronda no sentido de evitar que o Irão desenvolva armas nucleares ou a capacidade para as produzir. Mas se esta tentativa fracassar, como é muito provável, não podemos descartar a possibilidade de, no Verão, os EUA e Israel concluírem que terão de usar de força para travar o Irão.

Com efeito, se bem que Israel e os Estados Unidos discordem nalguns pontos – Israel quer aracar este ano, ao passo que a Administração Obama se opõe a uma acção militar antes das eleições presidenciais de Novembro – ambos os lados concordam nos objectivos e nos planos. Mais importante ainda, os EUA estão agora a rejeitar claramente qualquer tipo de contenção (aceitando um Irão nuclear e recorrendo a uma estratégia de dissuasão). Assim, se as sanções e as negociações não resultarem de forma credível, os EUA (um país que não faz "bluff", segundo Obama) terão de agir militarmente contra o Irão. Os Estados Unidos estão a fornecer bombas "bunker-buster" [bombas perfurantes que foram desenhadas para penetrar em blocos de cimento ("bunkers") até 60,96 metros antes de explodirem] e a reabastecerem aviões de Israel, ao mesmo tempo que os exércitos de ambos os países realizam exercícios militares conjuntos para o caso se ser necessário e inevitável atacar o Irão.

Se os tambores de guerra rufarem mais alto este Verão, os preços do petróleo poderão disparar para níveis capazes de levar a uma desaceleração do crescimento dos EUA e do resto do mundo, e até mesmo a uma recessão directa no caso de ocorrer um conflito militar e os preços do crude escalarem de imediato.

Além disso, há outras tensões geopolíticas no Médio Oriente que não estão a atenuar-se e que poderão mesmo intensificar-se. Além da profunda incerteza em relação ao curso dos acontecimentos no Egipto e na Líbia, agora a Síria está à beira da guerra civil e há forças radicais que podem ganhar vantagem no Iémen, minando a segurança na Arábia Saudita. Também não estão postos de parte os receios em torno das tensões políticas no Bahrein e na Província Oriental da Arábia Saudita (rica em petróleo), e mesmo no Koweit e na Jordânia – regiões onde a população de xiitas ou de outros grupos instáveis é significativa.

Agora que os Estados Unidos saíram do Iraque, o aumento de tensões entre as facções xiitas, sunitas e curdas não é um bom prenúncio para a probabilidade de um aumento da produção iraquiana de petróleo, pelo menos para breve. Há também o conflito Israel-Palestina, as tensões entre Israel e a Turquia e outros "pontos quentes" – particularmente Afeganistão e Paquistão – nas redondezas.

O petróleo já está bem acima dos 100 dólares por barril, apesar do fraco crescimento económico nos países avançados e em muitos mercados emergentes. O prémio do medo poderá fazer subir muito mais os preços, mesmo que acabe por não ocorrer nenhum conflito militar, e poderá dar-se uma recessão global no caso de haver mesmo alguma guerra
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Nouriel Roubini

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