quarta-feira, fevereiro 09, 2005

Jornalismo do Público.

"Vai fazer um ano. Foi a 11 de Março de 2004 que um infame ataque terrorista lançou o pânico em Madrid. Estávamos a dois dias das eleições e José Maria Aznar tomou uma de entre tantas más decisões da sua governação. Iludir a verdade.Na redacção do principal jornal espanhol (El Pais) discutia-se a Machete.No escrupuloso cumprimento da mais elementar ética e deontologia jornalística, o director decide-se por não apontar o dedo a ninguém. Embora tivesse indícios de que o ataque poderia ter sido preparado pela ETA e outro que, ao contrário, poderia ter origem na Al Quaeda, o director preferiu um título neutro: “Carnificina em Madrid”. Horas depois, mudava de opinião e alterava, com a rotativa à vista para “Carnificina da ETA em Madrid”.A história havia de mostrar, horas depois, a verdade. O atentado não era assinado pela ETA, mas pela Al Quaeda. No dia seguinte, o director do mais prestigiado e vendido diário espanhol, abriu o seu editorial para pedir desculpas. Aos seus leitores, à ETA e aos seus jornalistas. Ao contrário do que tinha feito na véspera, o director, sério, ético, deontológico, revela a fonte e as razões que o levaram a apontar o dedo à ETA. “A minha fonte pareceu-me credível”, escreveria.

“A minha fonte foi o Primeiro-Ministro, que me telefonou pessoalmente assegurando-me que estava na posse de provas do que dizia. Enganou-me. E eu peço desculpa por isso”, remata. José Luis Cebrian, Administrador do Grupo PRISA, que detém o El Pais, ex-director do jornal e um dos mais conceituados jornalistas a nível mundial, diria mais tarde que fez muito bem o seu director. Em mudar o título e em pedir desculpa no dia seguinte, revelando a fonte. Numa entrevista a que assisti na RTP2 há uns tempos, afirmou Cebrian: “Pensávamos que o Primeiro-Ministro era uma fonte credível. Pedimos desculpa, mas aprendemos que não… pelo menos em Espanha não é”.Vem isto a propósito do que se está a passar com o jornal Público nestes últimos dias.Perante um erro (terá sido erro???) e perante o desmentido por parte do visado nas declarações, o Público não revelou a falsa fonte, não pediu desculpa, não fez mea-culpa, não respeitou o leitor. Ao contrário, o Público veio hoje, omnisciente e omnipresente, afirmar que o que diz Cavaco Silva não é o que ele pensa ou gostaria de dizer. "Quem tem razão somos nós. Ele, o visado, diz isto, mas o que lhe vai na cabeça é outra coisa".Vai mais longe, qualifica a intenção do que disse e do que pensa.

Porque o disse e como o pensa e, finalmente, deturpa até o que dizem os que não acreditam no que disse. Ao título “Santana diz que ex-primeiro-ministro arrisca-se a ser um novo Freitas do Amaral”, não corresponde, afinal, nenhuma afirmação do actual Primeiro-Ministro. Conforme se lê no próprio texto do Público, Santana Lopes não disse nem pouco mais ou menos algo que possa levar a um título destes. Como não há de outros, sistemáticos, matemáticos, atrevo-me, que o Público tem publicado. O que se está a passar com o Público e eventualmente com outros órgãos de comunicação social portugueses é da maior gravidade, não só para o jornalismo, não só para um personagem que caiu na desgraça (Santana Lopes) mas sobretudo para a nossa democracia e para a nossa estatura moral. Sim, para a nossa, o Público não são só os jornalistas que o fazem e fizeram durante estes anos.

O Público foi feito pelas notícias (leia-se: verdade) e pelos leitores.Roubando a Pacheco Pereira uma expressão que ele já terá eventualmente roubado a alguém: “Quem nasceu lagartixa nunca será jacaré”. Diria assim também: “quem nasceu Público nunca será El Pais”. E é por essas e por outras que, tristemente, nunca Portugal chegará a ser Espanha. Apetecia-me dizer, com optimismo, que será chegada a hora de também os jornalistas competentes afastarem os jornalistas incompetentes.


Mas receio, no mais justificado pessimismo, que terá já sido a hora em que os jornalistas incompetentes, afastaram os jornalistas competentes”.


Retirado do Nónio.

1 Comments:

Blogger josé said...

Pois caro Nónio, tive a mesma ideia lá no sítio onde escrevo. E fiz o paralelo com o EL País, por causa dos cronistas de um e outro jornal.
Parece-me revelador da pinderiquice nacional que se dê relevo a uma notícia desse teor para acicatar tricas eleitoraleiras.

O Público é feito à imagem do seu director: fugidia, resvalada, sem destino certo. Numa palavra:falsa! Mas com problemas de consciência.
Parece-me ser esse o problema da maioria dos ex maoistas...acreditaram em algo que o bom senso aconselharia a colocar todas as reservas e mais algumas.
Pacheco Pereira tem o mesmo problema. É sintomático.

quinta-feira, fevereiro 10, 2005  

Enviar um comentário

<< Home

Divulgue o seu blog!