sexta-feira, dezembro 09, 2005

Crucifixos implacáveis II

"A questão dos crucifixos continua a animar as páginas dos jornais, e como alguma coisa ficou por dizer no meu texto da semana passada vale a pena regressar ao tema. Sobretudo por isto há detalhes de argumentação que convinha não serem esmagados pela velha luta entre a fé assolapada e o jacobinismo militante. Esse é um peditório para o qual me dispenso de contribuir, e por isso queria esclarecer dois pontos, que praticamente não foram tidos em conta pelos defensores da limpeza dos crucifixos, e que me parecem fundamentais.

O primeiro tem a ver com o carácter simbólico do crucifixo. Ateus e agnósticos têm a tendência de o remeter exclusivamente para o campo do religioso, argumentando a partir daí com a laicidade do Estado. Custará assim tanto admitir a existência de uma dimensão histórica nos crucifixos, que pode e deve ser valorizada? Como é evidente, se hoje em dia for construída uma escola em Queluz de Baixo, não faz qualquer sentido polvilhar as salas com Cristos pendurados. Mas em questões de laicidade dispensam-se os retroactivos retirar crucifixos de velhas escolas, onde não incomodam uma alminha há anos, é excesso de zelo e, politicamente, um absurdo.

O segundo ponto prende-se com a hipocrisia de um Estado laico aceitar feriados religiosos - tema que foi cuidadosamente evitado por quase todos os defensores da "descrucifixão", com a honrosa excepção de Vital Moreira. Este, no Público, afirmou que os feriados religiosos "não são mais do que dispensa de obrigações públicas para que os crentes possam cumprir as suas obrigações religiosas", e que, nesse sentido, "não implicam nenhum compromisso religioso do Estado". Vital Moreira que me desculpe, mas eu não percebo essa "dispensa" pode não ser um "compromisso", mas é evidentemente um privilégio da Igreja Católica. Porque não acabar com ele? Será que nos feriados religiosos os princípios laicos vão à missa?
"

João Miguel Tavares

4 Comments:

Anonymous Anónimo said...

isto so e noticia porque primeiro um qualquer cretino ministerial decidiu que era importante pensar no assunto (quando nao e, pois o importante e resolver os problemas reais das escolas). depois, quanto mais se fala sobre isto, mais se cria um problema quando ele nao existia. mas a nossa classe politica e assim. so gosta de fazer barulho onde nao ha substancia (e nao ha substancia porque apesar de a esmagadora maioria dos portugueses ser crista, a mesma maioria e sobretudo secular e esta-se nas tintas para o crucifixo nas escolas. isto nao significa que de repente venham mussulamnos dizer que se sentem discriminados e intimidados , etc etc) quer queiramos quer nao, somos um pais cristao, e as outras religioes estao aqui devido a nossa tolerancia, e nao o contrario. mas isto nao e politicamente correcto de se dizer. quanto a mim, deixem o crucifixo onde esta e tratem do que realmente interessa.

sexta-feira, dezembro 09, 2005  
Anonymous Anónimo said...

A decisão de retirar os crucifixos das escolas suscitou um intenso debate sobre o papel da religião no espaço público. É óbvio que o Estado não deve professar uma religião.

Mas isso não implica que o poder político assuma que as religiões não existem. Essa postura não é neutra, mas ideológica e desligada da realidade. Os estudos antropológicos demonstram que o surgimento do homo sapiens coincidiu com o aparecimento do homo religiosus. Há, portanto, uma forte relação entre a humanidade e a religiosidade.

A Constituição portuguesa aponta para uma separação colaborante e cooperativa entre Estado e a Religião. Tal resulta do artigo 5.º da Lei de Liberdade Religiosa e de diversas indicações constitucionais sobre a importância do fenómeno religioso. A Lei confirma o direito dos pais a educar os filhos em coerência com as suas próprias convicções em matéria religiosa (art. 11.º Lei 16/2001, de 22/6).

A separação entre Igreja e Estado é sobretudo uma limitação para a actuação do poder político, não da religião, ou seja, o Estado deve reconhecer a sua incompetência na esfera religiosa e no que respeita às perguntas fundamentais formuladas pela religião e pela filosofia.

A separação da esfera religiosa e política não deve, porém, ser entendida como um afastamento da religião do espaço público. Todas as religiões têm uma dimensão ritual e comunitária que, naturalmente, se exprime publicamente. Remeter a religião para a vida privada dos cidadãos, para as suas casas, ou para as sacristias dos templos, é uma limitação da liberdade de consciência e de religião. Como afirmou o Cardeal Ratzinger, antes de ser Papa, a religião não deve ser reduzida a um gueto de subjectividade, nem sequer, acrescento, a um mero resquício cultural.

O autêntico pluralismo não significa ocultar as nossas convicções e diferenças, pelo contrário, implica assumi-las de modo civilizado. A nossa sociedade exalta qualquer diferença – sobretudo sexual – mas parece temer expressão pública das convicções religiosas. A presença de temas morais e religiosos é condição de pluralismo.

O próprio Rawls deixou de se opor à discussão na praça pública das “concepções compreensivas de bem”, que poderiam gerar intolerância, para aceitar, no seu mais recente livro “Political Liberalism” (1993), um “consenso de sobreposição”, no qual se pode basear a actuação social e política. O filósofo de Harvard defende ainda uma “neutralidade de objectivo” que veta medidas destinadas a privilegiar uma determinada ideologia ou convicção.

Os comunitários (Robert P. George e M. Sandel) consideram impossível uma posição neutral sobre as “concepções particulares de bem”, fazendo tábua rasa dos pressupostos morais. A aplicação dos princípios de justiça absolutamente formais e neutros – a posição inicial de Rawls – não faz sentido e levaria a que os cidadãos ficassem desenraizados, sem cultura e sem valores.

Diga-se, aliás, que a verdadeira neutralidade não existe. Este artigo não é neutro. O espaço público, por definição, não aceita o vazio. Cada vez se torna mais clara a necessidade da democracia se inspirar em alguns princípios éticos fundamentais, sem os quais ficaria em perigo a sua continuidade e a realização do pluralismo. As instituições são importantes mas não subsistem sem certos valores que informam a actividade política. É inegável, por exemplo, que a justiça, a verdade, a honestidade, o bem comum, são estruturantes da vida política e social e têm um conteúdo moral.

“A religião é a primeira instituição política”, afirmou Tocqueville na sua Democracia na América, explicando que é nas comunidades religiosas que os homens aprendem os hábitos da vida em comum.

A experiência laicista francesa, exigindo uma estrita separação entre o secular e o religioso, resvalou no passado na perseguição religiosa e, na actualidade, na proibição de todos os símbolos religiosos na escola pública, o que parece não facilitar a tolerância e a integração dos cinco milhões de muçulmanos que vivem no país.

Portugal não deve imitar o exemplo francês, aliás esse é o único modo de cumprir o mote da Revolução francesa: “não estou de acordo com as tuas ideias, mas bater-me-ei para que tu as possas exprimir”.

sexta-feira, dezembro 09, 2005  
Anonymous Anónimo said...

Chesterton afirmava que sem Deus não haveria nem ateus nem agnósticos.
Bem visto, não é?

sexta-feira, dezembro 09, 2005  
Anonymous Anónimo said...

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terça-feira, abril 24, 2007  

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