A liberdade e outras ilusões
"Perante o ruído anárquico que cresce na “rua árabe”, perante a coerência das chamas que tudo purifica, a Europa apela ao diálogo e pede desculpa por existir.
É a Guerra dos Cartoons. É a Europa em silêncio e dominada pelo medo. É a memória dos “Versículos Satânicos”. É o corpo de Theo Van Gogh numa rua de Amesterdão. É sobretudo o espectáculo triste de um Continente inteiro, passivo, que aceita a lógica da intimidação. Perante o ruído anárquico que cresce na “rua árabe”, perante a coerência das chamas que tudo purifica, a Europa apela ao diálogo e pede desculpa pelo simples facto de existir.
Observando o alinhamento das doze caricaturas, o primeiro-ministro de Portugal declarou que “o uso gratuito e irrestrito” da liberdade “conduz à lei do mais forte”. Declaração de significado universal nos pequenos limites da república de São Bento. Observando o alinhamento das doze caricaturas, o Sheik Yusuf al-Qaradwi apelou para a organização de um “dia internacional da ira”. Para alguns comentadores no Ocidente, Yusuf al-Qaradwi representa a “força do progresso e da mudança” no Mundo Islâmico. Observem-se algumas posições defendidas por tão respeitado clérigo – a “execução judicial” dos homossexuais, o abandono do diálogo com Israel e a adopção de uma política da “espada e da espingarda”, a apologia do bombista-suicida, o louvor ao exemplo da “criança-bomba”. Se a liberdade choca com um particular conjunto de valores, será sensato abdicar da liberdade?
O Ocidente observa o Mundo e reflecte sobre os dilemas da sociedade multicultural. Observa e deseja o rápido crescimento de uma “Cidadania Global”, baseada no respeito mútuo, na liberdade e na tolerância. O Mundo observa o Ocidente e encontra nele a origem de todos os males. A fonte de todas as humilhações. A razão de todas as injustiças. Observando o alinhamento das doze caricaturas, um jovem muçulmano exibe-se na pele de um bombista-suicida. As calças de camuflado militar contrastam com o último modelo de “trainers” da Nike. O jovem não se manifesta nas ruas de Beirute, Damasco ou Bagdad. Manifesta-se com plena liberdade junto a Knightsbridge, bem no centro de Londres. Os cartazes à sua volta devolvem a mensagem de uma “Cidadania Global” – “A Europa há-de rastejar perante o grito dos Mujahideen”; “Que as mãos dos infiés sejam decepadas”; “Que os blasfemos sejam decapitados”.
No Ocidente dos nossos dias, a palavra civilização surge demasiadas vezes, e de modo irónico, aconchegada entre aspas. Comum parece ser a ideia de que a civilização Ocidental é a máscara perfeita para um conjunto de interesses, inconfessáveis, que desejam em permanência o domínio do Mundo. Assim, o progresso será a “marcha da História”. O conhecimento será o “estado natural da Humanidade”. A riqueza será o “destino do Homem”. A tranquilidade será um “Direito Universal”. Para esta ingénua filosofia, nada teremos de preservar – a civilização resume-se a uma dádiva da Natureza.
Mas como escrevia Edmund Burke, para que a barbárie se afirme basta que o homem civilizado se acomode à inacção."
Carlos Marques de Almeida
É a Guerra dos Cartoons. É a Europa em silêncio e dominada pelo medo. É a memória dos “Versículos Satânicos”. É o corpo de Theo Van Gogh numa rua de Amesterdão. É sobretudo o espectáculo triste de um Continente inteiro, passivo, que aceita a lógica da intimidação. Perante o ruído anárquico que cresce na “rua árabe”, perante a coerência das chamas que tudo purifica, a Europa apela ao diálogo e pede desculpa pelo simples facto de existir.
Observando o alinhamento das doze caricaturas, o primeiro-ministro de Portugal declarou que “o uso gratuito e irrestrito” da liberdade “conduz à lei do mais forte”. Declaração de significado universal nos pequenos limites da república de São Bento. Observando o alinhamento das doze caricaturas, o Sheik Yusuf al-Qaradwi apelou para a organização de um “dia internacional da ira”. Para alguns comentadores no Ocidente, Yusuf al-Qaradwi representa a “força do progresso e da mudança” no Mundo Islâmico. Observem-se algumas posições defendidas por tão respeitado clérigo – a “execução judicial” dos homossexuais, o abandono do diálogo com Israel e a adopção de uma política da “espada e da espingarda”, a apologia do bombista-suicida, o louvor ao exemplo da “criança-bomba”. Se a liberdade choca com um particular conjunto de valores, será sensato abdicar da liberdade?
O Ocidente observa o Mundo e reflecte sobre os dilemas da sociedade multicultural. Observa e deseja o rápido crescimento de uma “Cidadania Global”, baseada no respeito mútuo, na liberdade e na tolerância. O Mundo observa o Ocidente e encontra nele a origem de todos os males. A fonte de todas as humilhações. A razão de todas as injustiças. Observando o alinhamento das doze caricaturas, um jovem muçulmano exibe-se na pele de um bombista-suicida. As calças de camuflado militar contrastam com o último modelo de “trainers” da Nike. O jovem não se manifesta nas ruas de Beirute, Damasco ou Bagdad. Manifesta-se com plena liberdade junto a Knightsbridge, bem no centro de Londres. Os cartazes à sua volta devolvem a mensagem de uma “Cidadania Global” – “A Europa há-de rastejar perante o grito dos Mujahideen”; “Que as mãos dos infiés sejam decepadas”; “Que os blasfemos sejam decapitados”.
No Ocidente dos nossos dias, a palavra civilização surge demasiadas vezes, e de modo irónico, aconchegada entre aspas. Comum parece ser a ideia de que a civilização Ocidental é a máscara perfeita para um conjunto de interesses, inconfessáveis, que desejam em permanência o domínio do Mundo. Assim, o progresso será a “marcha da História”. O conhecimento será o “estado natural da Humanidade”. A riqueza será o “destino do Homem”. A tranquilidade será um “Direito Universal”. Para esta ingénua filosofia, nada teremos de preservar – a civilização resume-se a uma dádiva da Natureza.
Mas como escrevia Edmund Burke, para que a barbárie se afirme basta que o homem civilizado se acomode à inacção."
Carlos Marques de Almeida
10 Comments:
A reacção às caricaturas está fora de controle. Lembro-me da caricatura do António em que se representava o Papa João Paulo II com um preservativo no nariz. Como católico não gostei mas não lancei uma declaração de ódio e morte ao autor. Imaginam o Profeta com um preservativo no nariz? Não está o paraíso islâmico cheio de virgens que aguardam pelos mártires? O que vou dizer não é politicamente correcto, mas se nós não tratarmos deles, eles hão-de tratar de nós.
A grandiosidade da Europa assenta nao so na capacidade de compreensao de outras culturas mas tambem na dimensao da sua resposta, que pode ir desde a tolerancia angelical ( desde o Papa perdoar a quem o quis matar ) ate a solucao final ( como o Presidente da Franca advertiu). Alias, nao vimos nos media europeus quaisquer noticias de raptos de imas ou de trabalhadores arabes clamando pela poupanca da sua vida para evitar a sua execucao por grupos religiosos/ xenofobos/ nacionalistas ( o que seria entao de esperar?). De certeza que alguem que visite os paises do medio oriente nao se vai passear de T-shirt, a beber cervejas e com crucifixos ao peito, pois o respeito dos usos e costumes de onde se esta tambem e reciproco. Nao se pode por a liberdade e democracia da nossa casa refem da atribuicao de privilegios a minorias que nao se querem adaptar. Quando em Roma, faz-se como os romanos fazem. Finalmente, sao os valores da Europa assentes na igualdade e respeito entre seres humanos do Cristianismo do momento zero, da Magna Carta da Idade Media, e na Constituicao dos tempos modernos que felizmente encontram algum eco nalguns sectores do mundo islamico: Tem havido lideres de algumas associacoes que se teem distanciado deste tipo de manifestacoes, e o proprio jovem em questao no artigo veio a emitir um comunicado mostrando arrependimento e pedindo desculpa pela sua actuacao, que considerou tao ou mais insultuosa que os desenhos em questao, especialmente para as vitimas do 7/7. Gracas a Deus...
Bom senso precisa-se, é verdade. Mas alguém já reparou nas caricaturas da Al-Jazeera? Ou dos jornais árabes? Vêem embaixadas árabes a arder na europa? Agradecia que alguém me respondesse a esta dúvida.
A coragem do autor deve ser enaltecida num momento em que todos desculpabilizam os excessos e a violência das reacções no mundo islâmico. DEvemos defender os nossos valores, se não para nós, pelo menos em prol das gerações vindouras. Muitos comentário neste fórum têm a marca de um anti-ocidentalismo inexplicável. Parece que o ocidente apenas se move pela ganância e pelo petróleo. Nem o facto de podermos participar neste forum é apreciado. Tentem viajar para a Arábia Saudita e tentem organizar um forum ou um blogue como tantos que proliferam no ocidente. Vão ver que a prisão não tem o ar-condicionado que refresca os palácios da dinastia Saud (um exemplo de liberdade, democracia e respeito pelos direitos do homem). Já agora, parabéns ao cronista.
A coragem do autor deve ser enaltecida num momento em que todos desculpabilizam os excessos e a violência das reacções no mundo islâmico. DEvemos defender os nossos valores, se não para nós, pelo menos em prol das gerações vindouras. Muitos comentário neste fórum têm a marca de um anti-ocidentalismo inexplicável. Parece que o ocidente apenas se move pela ganância e pelo petróleo. Nem o facto de podermos participar neste forum é apreciado. Tentem viajar para a Arábia Saudita e tentem organizar um forum ou um blogue como tantos que proliferam no ocidente. Vão ver que a prisão não tem o ar-condicionado que refresca os palácios da dinastia Saud (um exemplo de liberdade, democracia e respeito pelos direitos do homem). Já agora, parabéns ao cronista.
A reacção do ministro dos negócios estrangeiros ao caso das caricaturas foi um vergonha. O colunista tem razão quando escreve que o medo paralisa. O silêncio da comissão foi uma vergonha. Se os governos e as autoridades se demitem de defender o modo de vida ocidental, acabamos todos a pensar duas vezes antes de dizermos ou fazermos algo em relação ao Islão.É uma espécie de auto-censura enquanto os governos rezam para que nada aconteça para não perderem as eleições. Mas rezar também deve ser uma ofensa ao Islão.
Bom senso precisa-se nos media. E quando tal significar que, em liberdade de expressão, os media ocidentais começarem a efectuar um black-out a notícias vindas de países onde esse black-out resulta de censura política, estilo Síria, Irão, Arábia Saudita e muitos outros, talvez se acabe com as ondas de choque provocadas por radicais muçulmanos, que em nada ajudam à causa árabe (antes pelo contrário, a estratágia é precisamente acicatar e provocar a estúpida confrontação entre civilizações), e que apenas inflamam ainda mais sentimentos xenófobos. Mas para tal, haja o bom senso de fazer o tal black-out. Pena é que, para que tal fosse completamente conseguido, fosse possível passar sem o petróleo oriundo daquelas paragens. Nessa altura, talvez os incautos muçulmanos que são arrastados nestas ondas de violência, apredejassem os radicais que andam a destabilizar o mundo. Dito isto, reafirmo que nada me move contra o Islão (confesso que eu teria o bom senso de não provocar o Islão com os cartoons, pois devemos respeitar os usos e costumes dos diferentes povos), mas não posso pactuar com a barbárie, seja ela oriunda de que sector político ou crença religiosa que for.
Sabe-se já que toda esta campanha islâmica foi orquestrada e que se afirmou mais uma vez perante uma Europa cobarde, que depois de abandonar Bush, treme perante a barbárie.A comunicação tem grandes responsabilidades,à custa de uma pretensa isenção.Como se houvese informação neutra.Preocupem-se primeiro com as liberdades dentro dos espaços islãmicos...
Que bela citação de Edmund Burke! Uma das minhas favoritas. Das muitas reacções que li e ouvi sobre os cartoons apenas a do presidente da coomissão europeia me pareceu equilibrada. As restantes, desde o disparatado primeiro-ministro dinamarquês, auto-despromovido a relações públicas de um jornal, que só legitimou a presução dos ofendidos em tomar um jornalista pela Dinamarca (e já agora, pelo Ocidente) aos multiplos apelos de compreensão pela sensibilidade muçulmana, só ajudam os extremistas e atacam a nossa liberdade. Como perguntava outro articulista "Quando é que eles começam a tentar compreender-nos a nós?", a aceitar a nossa liberdade, separação de poderes e independência? A resposta, receio eu, é nunca, pois a intolerância "muçulmana" é apenas um instrumento de consolidação e expansão de poder por parte dos extremistas até dominarem todos os países maioritariamente muçulmanos. São eles os motores do ódio ao exterior, como veículo de agregação, coesão e recrutamento.
Sou ocidental e nao me deixo emprenhar por qualquer religiao,sou de facto ateu,gracas a minha inteligencia. Ser ateu nao me impede de ver o que esta bem ou o que esta mal e, o que vejo neste momento e que o Ocidente e os ocidentais estao na verdade muito mal,os ocidentais ja nao teem valores e o Ocidente esta completamente podre. A liberdade de expressao so e aplicada aos ocidentais quando lhes convem porque na realidade liberdade de expressao nao existe. Perante tudo isto a tolerancia tem limite, a prova disso esta a vista, os Muculmanos nao toleram cartoons ofencivos como os Cristaos tambem nao iriam tolerar. Se ha quem diga que os muculmanos nao sao evoluidos, sao maus, sao contra os homossexuais,casamentos gays e lesbicos,pedofilos e traicoes etc.., devo dizer tambem que sou uma pessoa muito atrasada na evolucao mas muitissimo felicissimo e, assim queria morrer! Para finalizar, O OCIDENTE NAO TEM VALORES,os ocidentais perderam os valores e agora andam a procura nem eles sabem de que, estao enterrados no lixo que eles proprios acumularam. Bendito seja o meu ateismo!
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