sábado, novembro 25, 2006

Dos dilemas de que a política é feita...


Cada vez que sou confrontado com a necessidade de explicar porque sou de direita (e verifico nos olhos e no comportamento do meu interlocutor um espanto e um desconforto tais que lhe adivinho a incompreensão e uma enorme reprovação por tal opção) vem-me sempre à memória o episódio do dilema de Eneias (relatado por Virgílio, na Eneida). A cena ocorre no final de um túnel que o nosso herói teve de percorrer para descer aos infernos em busca de seu pai. A certa altura, no final do caminho, é confrontado com uma bifurcação: à esquerda viram os condenados, os destinados ao fogo eterno, pois só o caminho da direita conduz, após a travessia do rio Letes, aos Campos Elíseos e à salvação.

É absolutamente frustrante observar que, quando se pretende discutir se os serviços públicos são melhor prestados directamente pelo Estado ou através de organizações geradas iniciativa privada, tudo se pretenda reduzir à oposição entre a ambição (sempre confundida com o egoísmo e sempre apresentada como negativa e eticamente censurável) do sector privado e um suposto carácter bondoso que necessariamente sempre presidiria às acções do Estado... Como se este não estivesse condicionado, por um lado, pelo interesse egoísta dos decisores políticos que, estando a prazo, querem perpetuar-se na função; e, por outro, pelo não menos egoísta interesse corporativo dos agentes e funcionários do Estado que – para a satisfação dos seus interesses pessoais – condicionam, afectam e impedem a liberdade da análise, previsão e execução das políticas públicas.

São estes, os políticos medíocres e os dependentes da "teta" do Estado, são estes os pequenos senhores deste jardim tornado "pantanal" em que, desde há uns anos, se tornou Portugal.
Quase sempre comandados por bandalhos acomodatícios, que se vendem a qualquer poderoso, servindo a qualquer senhor, desde que lhes conservem (ou ampliem) as – sempre imerecidas e intocáveis – regalias (naturalmente pagas pelos cofres públicos, pois que ninguém, no seu juízo normal, do seu bolso lhes daria mais que mínimo o exigido à Caridade).
Todavia, lá se vão safando.
E conseguem-no porque, espantosamente, compreenderam como manipular a arraia-miúda. Porque os assuntos e preocupações que despertam ou assaltam o interesse da arraia-miúda não surgem inocente ou espontaneamente. Quando lhe falam a jeito, é levada a extremos, porque a arraia-miúda é, nas mãos deles, o que sempre foi: porque acéfala, não pensa; porque emotiva, age irracionalmente. Ou antes reage condicionadamente aos temas que lhe escolhem e na medida das conclusões que lhe ditam. Porque, são sempre muito poderosos os métodos e os meios daqueles que muito poderiam perder com uma turba descontrolada e, por isso, a arraia-miúda, raramente percebe a tempo que foi enganada.
Mas como é desconcertante uma revolução, uma revolta em que a arraia-miúda – uma vez mais – enfurecida e controlada "p'los do costume", adopta o ridículo traje que lhe permite julgar-se composta por "soldados da vanguarda do futuro e protectores dos direitos adquiridos no Passado”. Porém, mais não são que uma chusma produtora de um brutal vozear que, no fim das "festividades" e acabado o "picanço", acalma e, pacificamente, regressa a casa, de mãos a abanar, mais pobre, mais indefesa, mais sozinha...
Deixam, então, cair os (pseudo-)cabecilhas da revolta, e os ânimos acalmam.
A arraia-miúda acerca-se em redor do "patíbulo sacrificial", aplaude a "justiça" e vaia os condenados.
Naquele acto de cobardia colectiva, regado com o sangue da violência, a arraia-miúda liberta-se dos seus próprios crimes passados e algumas impunidades que, precisamente, são fundamento daquela sentença sacrificial.
Pura ilusão ou alívio oferecidos por esta oportunidade para uma catarse: no castigo aplicado aos outros escoa-se grande parte também dos crimes e pecados alojados no seu coração.

É a meio deste caminho que está o Governo de José Sócrates. José Sócrates e este PS foram-nos vendidos, com a colaboração não despicienda (e adivinho que politicamente não desinteressada) de Jorge Sampaio – e outros! –, como um bilhete de uma viagem que, prometeram, ser condição indispensável para nos arrancar ao mar de turbulência e sacrifícios propostos pelos governos de então.
Uma vez mais se provou as consequências de se aceitar tentar fugir ao Presente, ao Real sofrido e dorido que é viver, e aceitar embarcar no canto das sereias com promessas de Futuros fáceis e risonhos.
Agora que a maioria tomou, finalmente, consciência que a viagem não nos transportou ao tal destino... até porque ele não existia... começou a dominar o desnorte: quantos dos que votaram no PS de Sócrates estarão entre o tal terço de portugueses que quer hoje ser espanhol? Foram iludidos, embarcaram numa viagem que a todos transportou a um apeadeiro, porventura mais complicado: ainda com os velhos problemas, com novas contrariedades e agora com menos ânimo e menos confiança.
Haverá esperança?
E quando houver… sabê-la-ão conhecer?
E escolhe-la-ão?
por João Titta Maurício

1 Comments:

Anonymous Anónimo said...

Haverá esperança?

Com o Marques Mendes não há nenhuma...

sábado, novembro 25, 2006  

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