domingo, novembro 11, 2007

BARBA DE TRÊS DÉCADAS

"É bom saber que, após trinta e tal anos de democracia, os resistentes antifascistas continuam em franca actividade. Agora, na falta de melhor, resistem ao pincel da barba e a uns pertences de Salazar, que a autarquia de Santa Comba Dão quer desavergonhadamente expor. Um representante da URAP, a associação que congrega os profissionais acima mencionados, explica: o eventual Museu e Parque Temático do Estado Novo terá "muito mais o sentido de um santuário, uma espécie de mausoléu, em que se pretende fazer a exaltação da personalidade do ditador". Avisados, os antifascistas desconfiam que o pincel de barba e "alguns tarecos" (palavras deles) do ditador seriam o epicentro de peregrinações em massa ao Vimieiro. Nos seus piores pesadelos, milhares de incautos ou rematados fascistas acorrem aos tarecos na esperança de que a mera contemplação da intimidade de Salazar os abençoe, como dantes o toque do rei abençoava os simples.

Não imagino se isto traduz a péssima ideia que os antifascistas fazem do povo ou o carácter divinatório que concedem a Salazar. Não importa. Importa que, desde o início, reagiram ao museu da única forma que os autênticos combatentes pela liberdade entendem: berrando pela respectiva proibição. Dado que o berreiro não produziu resultados, voltaram à carga com 18 mil assinaturas e uma petição entregue no Parlamento. Comparados com os sessenta e tal mil votos que beatificaram Salazar num concurso televisivo, os subscritores não parecem assim tantos. Na opinião dos antifascistas, porém, são os suficientes para impedir o projecto, cuja existência em abstracto não contestam, na condição "de ser feito por pessoas idóneas", isto é, por membros da URAP, que veneram praticamente todos os torcionários dos últimos dois séculos mas são intransigentes face ao pequeno Salazar. Além disso, têm experiência em museologia. Santa Comba devia olhar o exemplo do Museu do Comunismo Português. Fica na Soeiro Pereira Gomes e, na ocasião em que passei lá um par de horas, confirmei que não é nenhum santuário, mas um espaço de história quase viva. Maravilhei-me com os espécimes expostos, os quais, embora mumificados em 1917, se movem como se pertencessem ao nosso mundo (quando falam nota-se que não pertencem). Não sendo arejado, o ambiente não é o de um mausoléu. E juro que não detectei vestígios de exaltação de personalidade: a pochette de Cunhal nem se encontra em exibição.
"


Alberto Gonçalves

1 Comments:

Anonymous Anónimo said...

Esta fobia do fascismo não tem justificação, especialmente se tivermos em conta que actualmente vivemos num regime em que as acções individuais são de longe muito mais controladas do que o eram na época. Sem querer defender o regime do estado novo, a criação do dito museu deveria ter sido apenas ignorada, pois com esta publicidade, se o tal museu for aberto serão muitos os curiosos a querer visitá-lo. Por outro lado não podemos apagar o passado, bom ou mau, da mesma forma que existem museus da realeza, não vi ninguem manifestar-se contra eles, afinal o regime monárquico foi muito mais segregador ao nível social do que o regime fascista, e em termos de liberdades, por alguma razão ocorreu a implantação da república, demasiado cedo, penso eu, e por isso caimos numa ditadura, mas a confusão continua a mesma, atenuada pela europa comunitária, caso contrário já os governos tinham caido uma dezena de vezes.

Não vale a pena gastar energias com velhos fantasmas pois eles só existem na cabeça de quem os quer eliminar. Existem sim, problemas reais e actuais que deveriam ser resolvidos!

terça-feira, novembro 13, 2007  

Enviar um comentário

<< Home

Divulgue o seu blog!