quinta-feira, novembro 01, 2007

Reduzir taxas não resolve crise

"O grau de sucesso de um indicador reside na capacidade de identificar momentos decisivos.

A subida da inflação é, muito provavelmente, o maior perigo macroeconómico que a economia mundial irá enfrentar nos próximos dois anos. Ora, uma subida da inflação desencadearia, inevitavelmente, um aumento nas taxas de juro, que marcaria, por sua vez, o início de uma grave recessão global.

Existem numerosas razões para acreditar que isso não virá a acontecer. As previsões para a inflação são, aliás, relativamente optimistas. Além disso, os bancos centrais parecem depositar extrema confiança nos indicadores das expectativas de inflação, segundo os quais nada há de alarmante.

O grau de sucesso de um indicador reside, porém, na capacidade de identificar momentos decisivos. A economia mundial é hoje alvo de choques simultâneos, pelo que se torna extremamente difícil calcular o seu impacto. O constante aumento dos preços do petróleo e dos bens alimentares é um desses choques. No entanto, a medida da inflação usada por alguns bancos centrais, caso da Reserva Federal norte-americana, não contempla nenhum desses factores por serem considerados voláteis. Errado. Têm sido, isso sim, unidireccionais. Mas importa ter presente que os indicadores da inflação ‘core’ podem subestimar de forma persistente a verdadeira taxa de inflação, e que as tensões geopolíticas no Médio Oriente não deixarão de pressionar os preços do petróleo ainda por algum tempo.

A natureza da globalização é outro factor em jogo. Nos últimos dez anos a globalização teve um impacto desinflacionista na economia mundial, apesar de só agora termos transitado para uma fase “moderadamente inflacionista”, resultante da prosperidade e da crescente procura de bens por parte dos países recém-industrializados.

O terceiro factor respeita ao ‘overhang’ monetário global após anos sucessivos de crescimento da moeda em circulação em alguns países grandes. Este não é, contudo, um argumento monetarista. O dinheiro até pode ser um indicador inútil para um banco central, mas sabe-se que se aquela conjuntura persistir durante um período de tempo relativamente longo pode levar a uma subida da inflação.

Os EUA e os países cuja moeda está indexada ao dólar têm um problema específico: a persistente fraqueza do dólar. As probabilidades de a moeda norte-americana vir a sofrer uma nova quebra no seu valor são reais, tal como o consequente aumento dos preços dos bens importados que, por inerência, se traduziria numa subida da inflação.

A lógica diz-nos que os movimentos da moeda não podem ser inflacionistas para toda a economia mundial. Se é verdade que na zona euro a robustez da moeda única serve de protecção contra a inflação, também é verdade que certos efeitos regionais anulam esse “escudo protector”. Cite-se, de entre esses efeitos, a mudança estrutural da maior economia da zona euro, a Alemanha, concluído o processo de ajustamento pós-reunificação.

É sabido que o processo de reformas económicas se encontra parado, no entanto é possível que encontre exemplos igualmente convincentes que apontem para o cenário inverso. Mas atenção, não estou aqui a vaticinar um aumento significativo da inflação global – apenas alerto para o facto de as pressões inflacionistas poderem ser superiores às previsões que nos dizem que nada vai mudar. O problema é que mesmo uma ligeira subida da inflação pode ser nefasta para a economia mundial quando esta ainda se encontra a braços com a “bolha” do crédito.

A Reserva Federal norte-americana reagiu à crise no mercado de crédito reduzindo as taxas de juro, e tudo indica que haverá novas descidas num futuro próximo. Porém, se os bancos centrais adoptarem esta estratégia de uma forma abrupta poderão, mais tarde, ter de corrigir a situação elevando as taxas de juro nominais. Resta saber como irão reagir os sectores privados dos EUA e Reino Unido, que se encontram altamente endividados, a taxas nominais na ordem dos 7% ou 8%. Ou mesmo Espanha, cujo mercado imobiliário se encontra extremamente exposto.

Um banqueiro central consciencioso vai certamente optar pela prudência num cenário como este, evitando novas descidas nas taxas de juro. A alternativa passa por aumentá-las já, e moderadamente, mas só se a inflação o justificar
."

Wolfgang Munchau

2 Comments:

Anonymous Anónimo said...

Como sempre de interesse superior estas reflexões de Munchau.Creio que um dos problemas é a enorme pressão que politicos demagogos e ignorantes e "opinion-makers" exercem sobre o publico e no fim sobre os bancos centrais .As politicas monetárias forçadas seguem o principio da "mola" .Se se comprimem em excesso ,saltam descontroladas, quando acaba o efeito

quinta-feira, novembro 01, 2007  
Anonymous Anónimo said...

O 31 desta questão é que o BCE só estava preocupado com a inflacção. Quanto ao resto...tem razão !

quinta-feira, novembro 01, 2007  

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