DESGOSTOS NÃO SE DISCUTEM
"A UE está sempre ao lado do povo do Zimbabué", disse Angela Merkel na Cimeira UE/África. Nikolai Sarkozy apelou à unanimidade sobre os massacres no Darfur. E José Sócrates deixou uma "mensagem de urgência" ao presidente do Sudão, lembrou que "não se resigna" e decretou a importância de "preservar e defender" os direitos humanos.
Estes ligeiríssimos arremedos de frontalidade chegaram para que os "média" proclamassem a Cimeira um sucesso e para que o funcionário da RTP Esteves Martins entrasse em delíquio. Aparentemente, estavam todos à espera que a União se declarasse contra o povo do Zimbabué, que a malignidade das chacinas no Darfur fosse considerada relativa e que o eng. Sócrates quisesse destruir e atacar os direitos humanos. No mínimo, esperavam que ninguém tocasse em assuntos desagradáveis. De facto, as expectativas face aos préstimos da Cimeira eram tão baixas que um espirro passaria por um grito indignado.
Falta apurar a eficácia dos espirros. À primeira vista, conseguiram amuar Mugabe e levá-lo a atrasar-se para um banquete oficial. Mas daqui à libertação dos milhões de desgraçados que, no Zimbabué e nas outras cinquenta barbáries do continente, sofrem às mãos que a Europa apertou vai certa distância. Mastigar lugares-comuns ou, na radiante terminologia do eng. Sócrates, "colocar os direitos humanos no centro da estratégia conjunta", não serve de consolo a quem, longe da subserviente pompa lisboeta, morre de fome ou de bala.
Em boa parte, os resultados da Cimeira avaliam-se pela satisfação final da União Africana, pela consagração de Kadhafi como ícone pop, pelo triunfal regresso de Mugabe a Harare e pela discrição impune com que os demais ditadores voltaram aos seus postos. É provável que nenhum encontro do género pudesse alterar nada de relevante, o que condiciona eventuais críticas. É garantido que este particular encontro nada alterou, o que desaconselharia festejos. O excesso destes tornou a Cimeira bastante hipócrita e, na medida em que legitimou a perpetuação da miséria africana, um bocadinho sinistra."
Alberto Gonçalves
Estes ligeiríssimos arremedos de frontalidade chegaram para que os "média" proclamassem a Cimeira um sucesso e para que o funcionário da RTP Esteves Martins entrasse em delíquio. Aparentemente, estavam todos à espera que a União se declarasse contra o povo do Zimbabué, que a malignidade das chacinas no Darfur fosse considerada relativa e que o eng. Sócrates quisesse destruir e atacar os direitos humanos. No mínimo, esperavam que ninguém tocasse em assuntos desagradáveis. De facto, as expectativas face aos préstimos da Cimeira eram tão baixas que um espirro passaria por um grito indignado.
Falta apurar a eficácia dos espirros. À primeira vista, conseguiram amuar Mugabe e levá-lo a atrasar-se para um banquete oficial. Mas daqui à libertação dos milhões de desgraçados que, no Zimbabué e nas outras cinquenta barbáries do continente, sofrem às mãos que a Europa apertou vai certa distância. Mastigar lugares-comuns ou, na radiante terminologia do eng. Sócrates, "colocar os direitos humanos no centro da estratégia conjunta", não serve de consolo a quem, longe da subserviente pompa lisboeta, morre de fome ou de bala.
Em boa parte, os resultados da Cimeira avaliam-se pela satisfação final da União Africana, pela consagração de Kadhafi como ícone pop, pelo triunfal regresso de Mugabe a Harare e pela discrição impune com que os demais ditadores voltaram aos seus postos. É provável que nenhum encontro do género pudesse alterar nada de relevante, o que condiciona eventuais críticas. É garantido que este particular encontro nada alterou, o que desaconselharia festejos. O excesso destes tornou a Cimeira bastante hipócrita e, na medida em que legitimou a perpetuação da miséria africana, um bocadinho sinistra."
Alberto Gonçalves
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