A cobardia das nações
"Sobre a riqueza delas escreveu o escocês Adam Smith. Nações que ainda hoje são ricas; a seguir a 1945 foram proibidas de se guerrear e inventaram a União Europeia para ficarem mais ricas ainda e em paz para sempre. Ambição bonita mas, com a preocupação de não se aleijarem uns aos outros, os europeus foram perdendo a capacidade salutar de meterem medo a terceiros.
Vivem numa cobardia tranquila que se encontra por toda a parte. Nos soldados holandeses ao serviço da ONU, protectores da cidade bósnia de Srebrenica que, sem um tiro nem um empurrão para a defenderem, deixaram o exército sérvio do general Mladic ocupá-la em 1995, arrebanhar a população civil, separar os homens e os rapazes e fuzilá-los a todos (uns oito mil). Nos políticos, burocratas e académicos que do Norte ao Sul do continente acham que os Estados Unidos têm uma obsessão indevida com o Irão porque Teerão tem todo o direito de enriquecer urânio (o que é verdade, segundo o direito internacional) e não há razão para supor que o queira usar para fins militares (o que é mentira, sabendo-se o que se sabe dos anos de dissimulação e má fé iranianas perante a Agência Internacional de Energia Atómica).
Ainda esta semana, depois da passagem de Bush pela Europa e da ida a Teerão de Solana com novas propostas, um porta-voz iraniano fez ameaças veladas à União Europeia se esta aplicasse mais sanções. Conciliatório, Solana esclareceu que não seriam para já e talvez nem viessem a ser precisas. Sondagens de opinião em vários países europeus mostram que em geral os povos afinam pelas élites e colocam o perigo principal para a paz do mundo não no Irão mas sim nos Estados Unidos. Fazem-no não por quererem a paz mas por quererem que os deixem em paz e, a curto prazo, talvez seja mais fácil assim. Os orçamentos nacionais de defesa reflectem essa visão de avestruz da segurança. "Per capita", todos muitíssimo abaixo do dos Estados Unidos, só com os ingleses a serem capazes de dar conta do recado e com os franceses a fazerem um esforço financeiro, técnico e político notável para procurarem acompanhá-los. (Numa altura em que está na moda dizer mal do homem, é preciso saudar Sarkozy que sabe de onde vêm as ameaças e a contrapêlo da maioria dos seus compatriotas acabou com 40 anos de birra francesa contra a NATO).
Na solicitude com que estadistas franceses, italianos e, sobretudo, alemães, em vez de, com o resto da União, traçarem uma linha para lá da qual abusos internos e internacionais da Rússia deixariam de ser permitidos e juntos lhes comprariam gás e petróleo em muito melhores condições, se acomodam separados à pressão do Kremlin, recuando para depois recuarem melhor. (Angela Merkel vem do que era o Leste, sabe do que a casa moscovita gasta e bateria o pé a Putin, mas governa em coligação com os herdeiros de Schroeder, hoje presidente da companhia de um gasoduto russo-alemão).
É um quadro triste para os europeus e, qualquer dia, estala-lhes a castanha na boca."
José Cutileiro
Vivem numa cobardia tranquila que se encontra por toda a parte. Nos soldados holandeses ao serviço da ONU, protectores da cidade bósnia de Srebrenica que, sem um tiro nem um empurrão para a defenderem, deixaram o exército sérvio do general Mladic ocupá-la em 1995, arrebanhar a população civil, separar os homens e os rapazes e fuzilá-los a todos (uns oito mil). Nos políticos, burocratas e académicos que do Norte ao Sul do continente acham que os Estados Unidos têm uma obsessão indevida com o Irão porque Teerão tem todo o direito de enriquecer urânio (o que é verdade, segundo o direito internacional) e não há razão para supor que o queira usar para fins militares (o que é mentira, sabendo-se o que se sabe dos anos de dissimulação e má fé iranianas perante a Agência Internacional de Energia Atómica).
Ainda esta semana, depois da passagem de Bush pela Europa e da ida a Teerão de Solana com novas propostas, um porta-voz iraniano fez ameaças veladas à União Europeia se esta aplicasse mais sanções. Conciliatório, Solana esclareceu que não seriam para já e talvez nem viessem a ser precisas. Sondagens de opinião em vários países europeus mostram que em geral os povos afinam pelas élites e colocam o perigo principal para a paz do mundo não no Irão mas sim nos Estados Unidos. Fazem-no não por quererem a paz mas por quererem que os deixem em paz e, a curto prazo, talvez seja mais fácil assim. Os orçamentos nacionais de defesa reflectem essa visão de avestruz da segurança. "Per capita", todos muitíssimo abaixo do dos Estados Unidos, só com os ingleses a serem capazes de dar conta do recado e com os franceses a fazerem um esforço financeiro, técnico e político notável para procurarem acompanhá-los. (Numa altura em que está na moda dizer mal do homem, é preciso saudar Sarkozy que sabe de onde vêm as ameaças e a contrapêlo da maioria dos seus compatriotas acabou com 40 anos de birra francesa contra a NATO).
Na solicitude com que estadistas franceses, italianos e, sobretudo, alemães, em vez de, com o resto da União, traçarem uma linha para lá da qual abusos internos e internacionais da Rússia deixariam de ser permitidos e juntos lhes comprariam gás e petróleo em muito melhores condições, se acomodam separados à pressão do Kremlin, recuando para depois recuarem melhor. (Angela Merkel vem do que era o Leste, sabe do que a casa moscovita gasta e bateria o pé a Putin, mas governa em coligação com os herdeiros de Schroeder, hoje presidente da companhia de um gasoduto russo-alemão).
É um quadro triste para os europeus e, qualquer dia, estala-lhes a castanha na boca."
José Cutileiro
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