Nós e os outros
"Sempre que o Presidente da República ou o primeiro-ministro vão ao estrangeiro, em visitas a países não democráticos, muitos comentadores – de esquerda ou de direita, e às vezes de ambos os lados – indignam-se.
Acham que, não fazendo qualquer referência ao desrespeito pelos direitos humanos nos países que visitam, os nossos governantes se menorizam.
Na visita de Sócrates à Venezuela, ouviram-se mais uma vez essas vozes: o chefe do Governo deveria ter feito um reparo a Hugo Chávez e ao regime que incarna.
Não o fazendo, agachou-se perante um ditador.
O problema não é de hoje.
Durão Barroso, quando era ministro dos Negócios Estrangeiros, foi criticado pelas relações estreitas que mantinha com Luanda (ignorando a Unita).
Cavaco, quando era primeiro-ministro, idem.
Soares foi posto em causa por ir à China e não falar na pena de morte.
Guterres e Gama não escaparam ao mesmo tipo de acusações.
Afinal, quem terá razão: os comentadores ou os governantes?
É preciso ver que uns e outros estão em situação diferente.
As críticas dos comentadores têm que ver com a ideologia ou com a moral.
Ora os governantes movem-se no plano dos interesses: as relações entre os países são relações de interesse.
Está mal? Está bem?
Não se trata de estar bem ou mal – trata-se de ‘ser assim’.
O mundo funciona assim.
Além disso, as relações entre juízes devem fazer-se Estado a Estado, Governo a Governo.
Salvo em períodos de excepção ou em casos extremos, as relações internacionais não podem passar por cima dos respectivos Governos, por muito pouco democráticos que sejam.
Um Governo não pode estar a negociar com outro e simultaneamente criticá-lo em público.
Um governante não pode cumprimentar outro com a mão direita e agredi-lo com a esquerda.
Não pode negociar com ele pela frente e piscar o olho aos seus opositores por trás.
Cavaco ou Sócrates não podem querer negociar com a Líbia, com a Venezuela ou com Angola e, ao memo tempo, criticarem Kadhafi, Chávez ou Eduardo dos Santos.
E, mesmo que o fizessem, isso não teria qualquer eficácia.
Que interessaria ao mundo a posição de um governante português relativamente a países onde se jogam poderosos interesses?
Mas então as ditaduras, os regimes autoritários e autocráticos, não podem ser denunciados e condenados?
Podem e devem.
Só que esse papel não compete individualmente aos países ou aos líderes nacionais – mas às organizações internacionais.
Aliás, é essa a crítica que se faz recorrentemente aos EUA: julgarem unilateralmente os regimes e definirem quem são ‘os bons’ e ‘os maus’.
Nas relações entre países, o Presidente da República e o Governo têm pois de se orientar essencialmente pela defesa dos interesses portugueses e dos interesses dos emigrantes.
Cabe às organizações internacionais – a ONU, a Amnistia Internacional, a Cruz Vermelha – e aos tribunais internacionais julgarem o comportamento interno e externo das nações e respectivos governos, e aplicarem sanções.
Pretender que os nossos governantes o façam é uma irrazoabilidade.
Um quixotismo.
Estragaria os negócios e não serviria de nada.
P.S. – Se as relações internacionais de Portugal tivessem de pautar-se por razões ideológicas, as complicações seriam imensas.
O mundo árabe, como se sabe, é um problema.
Na África negra, a corrupção é generalizada, a instabilidade é enorme e os governos democráticos uma raridade.
No Oriente, do Afeganistão à China, do Paquistão à Coreia do Norte, do Vietname a Singapura, venha o diabo e escolha.
Na América Latina a situação já foi pior mas continua a ter muitos espinhos: Cuba, a Venezuela, a Colômbia.
Não resta, portanto, muito.
Até porque a Rússia já cabe com dificuldade entre as democracias ‘respeitáveis’."
JAS
Acham que, não fazendo qualquer referência ao desrespeito pelos direitos humanos nos países que visitam, os nossos governantes se menorizam.
Na visita de Sócrates à Venezuela, ouviram-se mais uma vez essas vozes: o chefe do Governo deveria ter feito um reparo a Hugo Chávez e ao regime que incarna.
Não o fazendo, agachou-se perante um ditador.
O problema não é de hoje.
Durão Barroso, quando era ministro dos Negócios Estrangeiros, foi criticado pelas relações estreitas que mantinha com Luanda (ignorando a Unita).
Cavaco, quando era primeiro-ministro, idem.
Soares foi posto em causa por ir à China e não falar na pena de morte.
Guterres e Gama não escaparam ao mesmo tipo de acusações.
Afinal, quem terá razão: os comentadores ou os governantes?
É preciso ver que uns e outros estão em situação diferente.
As críticas dos comentadores têm que ver com a ideologia ou com a moral.
Ora os governantes movem-se no plano dos interesses: as relações entre os países são relações de interesse.
Está mal? Está bem?
Não se trata de estar bem ou mal – trata-se de ‘ser assim’.
O mundo funciona assim.
Além disso, as relações entre juízes devem fazer-se Estado a Estado, Governo a Governo.
Salvo em períodos de excepção ou em casos extremos, as relações internacionais não podem passar por cima dos respectivos Governos, por muito pouco democráticos que sejam.
Um Governo não pode estar a negociar com outro e simultaneamente criticá-lo em público.
Um governante não pode cumprimentar outro com a mão direita e agredi-lo com a esquerda.
Não pode negociar com ele pela frente e piscar o olho aos seus opositores por trás.
Cavaco ou Sócrates não podem querer negociar com a Líbia, com a Venezuela ou com Angola e, ao memo tempo, criticarem Kadhafi, Chávez ou Eduardo dos Santos.
E, mesmo que o fizessem, isso não teria qualquer eficácia.
Que interessaria ao mundo a posição de um governante português relativamente a países onde se jogam poderosos interesses?
Mas então as ditaduras, os regimes autoritários e autocráticos, não podem ser denunciados e condenados?
Podem e devem.
Só que esse papel não compete individualmente aos países ou aos líderes nacionais – mas às organizações internacionais.
Aliás, é essa a crítica que se faz recorrentemente aos EUA: julgarem unilateralmente os regimes e definirem quem são ‘os bons’ e ‘os maus’.
Nas relações entre países, o Presidente da República e o Governo têm pois de se orientar essencialmente pela defesa dos interesses portugueses e dos interesses dos emigrantes.
Cabe às organizações internacionais – a ONU, a Amnistia Internacional, a Cruz Vermelha – e aos tribunais internacionais julgarem o comportamento interno e externo das nações e respectivos governos, e aplicarem sanções.
Pretender que os nossos governantes o façam é uma irrazoabilidade.
Um quixotismo.
Estragaria os negócios e não serviria de nada.
P.S. – Se as relações internacionais de Portugal tivessem de pautar-se por razões ideológicas, as complicações seriam imensas.
O mundo árabe, como se sabe, é um problema.
Na África negra, a corrupção é generalizada, a instabilidade é enorme e os governos democráticos uma raridade.
No Oriente, do Afeganistão à China, do Paquistão à Coreia do Norte, do Vietname a Singapura, venha o diabo e escolha.
Na América Latina a situação já foi pior mas continua a ter muitos espinhos: Cuba, a Venezuela, a Colômbia.
Não resta, portanto, muito.
Até porque a Rússia já cabe com dificuldade entre as democracias ‘respeitáveis’."
JAS
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