Gori
"Gori é também a cidade onde passa a única rota de energia para a Europa que não é controlada pela Rússia.
Gori é uma cidade da Geórgia que, desde sábado, está a ser bombardeada pelos aviões russos. Se olharmos para um mapa da Geórgia, vimos que Gori está no sul do país, bem longe da Ossétia do Sul. Mas Gori é também a cidade onde passa a única rota de energia para a Europa que não é controlada pela Rússia. Ou seja, Gori é o símbolo da resistência a um monopólio absoluto russo na energia que vem da Ásia Central. Além disso, e voltando ao mapa, a solução do conflito na Ossétia não exige ataques a Gori. Daí, o simbolismo político dos ataques a Gori. Se num primeiro plano estamos perante um conflito entre a Rússia e a Geórgia, a um nível mais profundo estamos a assistir a uma etapa importante no confronto entre a Rússia e o Ocidente no caminho de regresso daquela para o topo da hierarquia do poder mundial.
Com o ataque às forças separatistas da Ossétia, parece claro que o governo da Geórgia caiu na armadilha dos russos, que só esperavam um pretexto para usar a força militar. O sinal é claro para todos. O “estrangeiro próximo” é a esfera de influência da Rússia, onde esta resolve os conflitos unilateralmente e, se necessário, recorrendo à força. Moscovo está a mostrar que o curso da história entre o colapso da União Soviética, em 1991, e as chamadas Revoluções das cores na Geórgia (a “Revolução Rosa”) e na Ucrânia (a “Revolução Laranja”), em 2005, acabou. No “estrangeiro mais próximo” (os países da antiga União Soviética), o objectivo é acabar com a influência ocidental e transformar esses países em Estados subordinados à Rússia, onde a soberania estará claramente limitada. É por isso que o conflito de argumentos é fundamental. Quando muitos afirmam que a pretensão da Geórgia de aderir à NATO ajuda a “compreender” o comportamento da Rússia estão a aceitar a legitimidade da estratégia da esfera de influência. A Geórgia tem a sua soberania limitada e um dos limites é definir a sua política de segurança de acordo com os interesses russos, incluindo a rota de energia que passa por Gori.
Na competição estratégica sobre as fronteiras das esferas de influência, a Geórgia nem sequer é a questão central. O caso mais complicado é a Ucrânia. Irá a Ucrânia ficar na esfera de influência russa? Ficará integrada nas instituições ocidentais? Ou será dividida? A curto prazo, o futuro da Ucrânia será um dos problemas mais complicados da política europeia. É a nova fronteira da competição política, económica e estratégica entre a Rússia e o Ocidente. Neste sentido, nos próximos dias será decisivo observar não só a actuação do governo ucraniano, como o comportamento da Rússia em relação ao seu principal vizinho.
Se Moscovo tiver sucesso em travar o curso da história das últimas duas décadas no “estrangeiro mais próximo”, irá depois concentrar-se no “estrangeiro próximo mais distante”, os antigos satélites soviéticos da velha “Europa de Leste”. E aqui as coisas são muito mais difíceis porque estes países estão todos na União Europeia e na Aliança Atlântica. A unidade necessária para uma integração europeia eficaz e forte não é compatível com a inclusão de alguns desses países na esfera de influência russa. As elites políticas e estratégicas russas comparam a humilhação que a Rússia sofreu com os últimos alargamentos da União Europeia e da NATO à humilhação da Paz de Versailhes de 1919 para a Alemanha. O seu objectivo será reverter essa humilhação história.
O conflito na Geórgia e o comportamento da Rússia em geral revelam ainda um desafio muito complicado para os países ocidentais. Nota-se a existência de uma distância cada vez maior entre o discurso da legitimidade e os comportamentos políticos.
Gori é uma cidade da Geórgia que, desde sábado, está a ser bombardeada pelos aviões russos. Se olharmos para um mapa da Geórgia, vimos que Gori está no sul do país, bem longe da Ossétia do Sul. Mas Gori é também a cidade onde passa a única rota de energia para a Europa que não é controlada pela Rússia. Ou seja, Gori é o símbolo da resistência a um monopólio absoluto russo na energia que vem da Ásia Central. Além disso, e voltando ao mapa, a solução do conflito na Ossétia não exige ataques a Gori. Daí, o simbolismo político dos ataques a Gori. Se num primeiro plano estamos perante um conflito entre a Rússia e a Geórgia, a um nível mais profundo estamos a assistir a uma etapa importante no confronto entre a Rússia e o Ocidente no caminho de regresso daquela para o topo da hierarquia do poder mundial.
Com o ataque às forças separatistas da Ossétia, parece claro que o governo da Geórgia caiu na armadilha dos russos, que só esperavam um pretexto para usar a força militar. O sinal é claro para todos. O “estrangeiro próximo” é a esfera de influência da Rússia, onde esta resolve os conflitos unilateralmente e, se necessário, recorrendo à força. Moscovo está a mostrar que o curso da história entre o colapso da União Soviética, em 1991, e as chamadas Revoluções das cores na Geórgia (a “Revolução Rosa”) e na Ucrânia (a “Revolução Laranja”), em 2005, acabou. No “estrangeiro mais próximo” (os países da antiga União Soviética), o objectivo é acabar com a influência ocidental e transformar esses países em Estados subordinados à Rússia, onde a soberania estará claramente limitada. É por isso que o conflito de argumentos é fundamental. Quando muitos afirmam que a pretensão da Geórgia de aderir à NATO ajuda a “compreender” o comportamento da Rússia estão a aceitar a legitimidade da estratégia da esfera de influência. A Geórgia tem a sua soberania limitada e um dos limites é definir a sua política de segurança de acordo com os interesses russos, incluindo a rota de energia que passa por Gori.
Na competição estratégica sobre as fronteiras das esferas de influência, a Geórgia nem sequer é a questão central. O caso mais complicado é a Ucrânia. Irá a Ucrânia ficar na esfera de influência russa? Ficará integrada nas instituições ocidentais? Ou será dividida? A curto prazo, o futuro da Ucrânia será um dos problemas mais complicados da política europeia. É a nova fronteira da competição política, económica e estratégica entre a Rússia e o Ocidente. Neste sentido, nos próximos dias será decisivo observar não só a actuação do governo ucraniano, como o comportamento da Rússia em relação ao seu principal vizinho.
Se Moscovo tiver sucesso em travar o curso da história das últimas duas décadas no “estrangeiro mais próximo”, irá depois concentrar-se no “estrangeiro próximo mais distante”, os antigos satélites soviéticos da velha “Europa de Leste”. E aqui as coisas são muito mais difíceis porque estes países estão todos na União Europeia e na Aliança Atlântica. A unidade necessária para uma integração europeia eficaz e forte não é compatível com a inclusão de alguns desses países na esfera de influência russa. As elites políticas e estratégicas russas comparam a humilhação que a Rússia sofreu com os últimos alargamentos da União Europeia e da NATO à humilhação da Paz de Versailhes de 1919 para a Alemanha. O seu objectivo será reverter essa humilhação história.
O conflito na Geórgia e o comportamento da Rússia em geral revelam ainda um desafio muito complicado para os países ocidentais. Nota-se a existência de uma distância cada vez maior entre o discurso da legitimidade e os comportamentos políticos.
A linguagem política e estratégica “pós-moderna” europeia não reconhece legitimidade a conceitos dos séculos XIX e XX como esferas de influência, estratégias de expansão militar e comportamentos diplomáticos assentes numa “realpolitik” pura. No entanto, é isso que se assiste cada vez mais na Europa e na política externa russa. O que está em causa nas relações com a Rússia é a capacidade da Europa de se manter fiel a uma “ética política” que está na génese da integração europeia. Para isso acontecer será essencial a força que só a unidade europeia traz. Ao contrário do que têm dito muitos analistas, a força é a condição para uma politica ética e a fraqueza o caminho mais rápido para uma “realpolitik amoral”. No fim desse caminho, ninguém tenha dúvidas, estará a fragmentação europeia e a dependência em relação à Rússia. Daí, os ataques a Gori: a única rota de energia fora do controlo russo."
João Marques de Almeida
1 Comments:
Petição para pôr fim ao conflito na Georgia no Ideiasfixas2.
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