Plano Paulson do irrealismo ao surrealismo
Os legisladores americanos produziram uma versão corrigida do Plano Paulson.
A lei tem todos os ingredientes para falhar nos objectivos, enganar eleitores e contribuintes e enriquecer agentes financeiros.
Parte destes, pertenceu ao núcleo duro dos causadores da maior crise financeira depois da Grande Depressão.
Para tentar evitar uma recessão, em casa e no resto do mundo, os congressistas deram a Henry Paulson o secretário das Finanças, amplos poderes para criar o maior fundo soberano do planeta - USD 700 mil milhões/bilhões (mm/bi).
Nada acontecerá de substancial até daqui a seis semanas.
Depois de 4 de Novembro, dia da eleição do substituto do presidente Bush, os futuros gestores de activos do novo fundo deverão começar a sua missão - comprar o crédito mal parado, e toda a sorte de incobráveis, que afecta os balanços das instituições financeiras para ressuscitar mercados em coma ou anémicos.
Uma análise rápida permite detectar várias contradições e iniquidades.
A ficção financeira supera largamente a realidade político-económica.
Vejamos porquê.
A Lei - O texto legislativo pretende que os novos Midas façam aquilo que o mercado se recusou a fazer - dar um valor concreto aos títulos de dívida que entopem os balanços dos bancos, mas que ninguém quer comprar. O legislador estipula que o governo deve criar “mecanismos adequados” que evitem “conflitos de interesses” nas decisões sobre os activos a comprar e respectivas transacções.
O Congresso deu ao secretário Paulson o poder para seleccionar os gestores e as empresas (privadas) a quem será outorgada a tarefa de criar este mercado artificial.
A idéia assenta na criação de um aterro sanitário para lixo tóxico a partir do qual, “logo que a estabilidade regresse aos mercados”, poderão voltar a ser comercializados “pelo seu justo valor” os “activos stressados”.
O texto elenca um vasto conjunto de intenções: “proteger os interesses dos contribuintes”, “ajudar as famílias a evitar acções de despejo”, impedir o “colapso dos mercados” e reactivar “mercados paralisados”.
As regras do jogo serão ditadas pelo Sr. Paulson e respectivos lugares-tenentes.
O Modelo de Gestão - Embora ainda não seja conhecido, as várias fontes da imprensa norte-americana que consultámos indicam que o escopo central do conceito assentará no princípio do “outsourcing”.
O governo escolherá, em condições e regimes a definir, uma dúzia de empresas privadas especializadas na gestão de activos. A elas caberá a tarefa de gerir as várias tranches do fundos. A primeira fase do programa envolve USD 250 mm/bi.
As empresas seleccionadas receberão comissões de 1% sobre os activos transsaccionados.
Os volumes serão apreciáveis e poderão variar segundo as leis do mercado.
As empresas BlackRock, PIMCO, Legg Mason e MKP Capital Management, são “fortes candidatos“, segundo o Washington Post.
O Modelo de Negócio - Os leilões deverão ser a plataforma escolhida.
Em função dos produtos envolvidos serão feitas as adaptações para operacionalizar os negócios. O preço final é determinado em função da procura.
Teoricamente, quanto maior o número de instituições potencialmente compradoras, mais alto será o valor final dos activos à venda.
As dinâmicas serão perversas e contraditórias.
A compra a preços baixos será interpretada como protecção dos interesses dos contribuintes; Esta estratégia obrigará os bancos à contabilização de prejuízos substanciais contariando um dos objectivos do programa - criar os mecanismos para que a banca se capitalize; Se, pelo contrário, o preço a pagar pelo “lixo tóxico” for próximo do fair value - valor justo - estimado pelos contabilistas da banca, os recursos públicos a desembolsar pelo Estado - dinheiro dos contribuintes - servirão para premiar a especulação e a incompetência dos banqueiros na gestão do risco.
A fixação do preço será o indicador chave para determinar quem o comprador (Estado) vai beneficiar: os vendedores (bancos, fundos, etc.) ou os pagantes finais (contribuintes).
Nesta dinâmica será interessante analisar a intervenção dos hedge funds cuja postura especulativa tenderá a contrariar os interesses dos bancos, forçando a baixa dos preços de compra para ganhar na margem de venda dos “activos tóxicos”.
Os Conflitos de Interesses - Os gestores escolhidos pelo Sr. Paulson ditarão quem vai ganhar ou perder neste processo de reavaliação dos activos.
As pressões dos diversos interesses em presença serão gigantescas.
Entre as muitas dúvidas e interrogações é obrigatório referir uma: como é possível conciliar interesses públicos com interesses privados?
Um gestor privado de activos - cuja obrigação é a de maximizar os proveitos para os seus clientes - será o melhor agente para operacionalizar a venda activos contaminados ao Estado para, posteriormente, este os revender com lucro, não se sabe quando, nem a quem?
A idéia é peregrina. “Comprar gato por lebre, para revender faisão? Cadê o gato?” - pergunta o carioca…
A margem para manipulação dos preços é enorme. O poder de decisão estará nas mãos dos operadores privados.
Começam a sentir-se reacções dos investidores interessados nos leilões. Segundo eles, as empresas de gestão de activos têm a faca e o quijo na mão para favorecer os interesses dos seus accionistas e clientes.
Neste quadro, referem as ligações da Pimco à seguradora alemã Allianz e da BlackRock ao Merrill Lynch.
O mercado aguarda com expectativa a publicação pelo Tesouro estadunidense do código de conduta, da política de gestão dos conflitos de interesses e do plano de remunerações.
A Equipa - Henry Paulson escolheu um conjunto de antigos quadros da Goldman Sachs, o ex-banco de investimento a que presidiu antes de assumir o actual cargo: Edward Forst, gestor de topo da Goldman e vice-presidente da Universidade de Harvard, Kendrick R. Wilson III, antigo presidente das instituições financeiras controladas pelo Goldman bem como o ex-director financeiro adjunto, Dan Jester.
A equipa inclui também meia dúzia de altos quadros do Departamento do Tesouro - Kevin Fromer, Kenneth Carfine, Peter McCarthy, Phillip Swagel, Neel Kashkari e David Nason.
Conhecidas as boas ligações do Sr. Paulson à classe dirigente de Pequim, a China, através do seu bilionário fundo soberano China Investment Corporation (CIC), poderá ser um dos investidores privilegiados.
"Lei irrealista, missão impossível"
MRA Dep. Data Mining
Pedro Varanda de Castro, Consultor
MRA Dep. Data Mining
Pedro Varanda de Castro, Consultor
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