O COVEIRO ESPANHOL
"Manter a popularidade na ausência de conteúdo exige um espalhafato crescente, como é do conhecimento de qualquer vedeta pop ou participante de reality show. Ou de Baltazar Gárzon. O sr. Gárzon é aquele juiz espanhol que ganhou fama a abrir processos criminais aos pérfidos deste mundo, dubiamente seleccionados. Na maioria das vezes, os processos não foram longe. A fama do sr. Gárzon, sim. Tão longe que, à semelhança do concorrente do Big Brother que em desespero pegou em dois gatos e correu nu pela ponte 25 de Abril, não lhe restam grandes opções futuras.
Resta-lhe, por exemplo, aproveitar a lei da "memória histórica", uma das medidas que o governo Zapatero decretou a fim de disfarçar certa inabilidade para dirigir o país nas áreas que contam. Se a economia se esfrangalha, nada melhor que incitar o povo a esfrangalhar-se primeiro, seja a propósito da homossexualidade, da religião ou, no caso muito mais decisivo, da guerra civil e da ditadura.
Ao remexer no passado, a lei da "memória histórica" pressupõe o despertar de fantasmas que, de um delicado modo, a transição democrática espanhola soubera manter adormecidos em nome da coesão nacional. Para azar da Espanha, os homens que arquitectaram a transição e a amnistia foram entretanto substituídos por produtos típicos dos nossos dias, e o pequeno milagre da coesão vê-se hoje em risco graças à leviandade do sr. Zapatero e aos apetites publicitários do sr. Gárzon, que agora decidiu desenterrar literalmente os mortos da guerra e do franquismo e, simbolicamente, as trágicas lembranças agarradas aos cadáveres.
Não vale a pena discutir as preferências do sr. Gárzon pelos cadáveres republicanos. Nem sequer questionar a batalha da criatura pelo direito à celebridade. Em última instância, até aceito que exumar as vítimas do lado nacionalista conceda escasso estatuto e que o mundo perderia em desconhecer o singular carácter do sr. Gárzon. Infelizmente, conhecê-lo a cavar valas comuns também tem consequências, e um juiz menos expansivo proibiu-lhe, para já, a macabra brincadeira. Mas não parece que o sr. Gárzon seja homem de pousar a pá e renunciar às manchetes por receio de desunir um país, embora um passeio em pelota pela Plaza Mayor tivesse o mesmo efeito mediático e efeitos sociais inversos. "
Alberto Gonçalves
Resta-lhe, por exemplo, aproveitar a lei da "memória histórica", uma das medidas que o governo Zapatero decretou a fim de disfarçar certa inabilidade para dirigir o país nas áreas que contam. Se a economia se esfrangalha, nada melhor que incitar o povo a esfrangalhar-se primeiro, seja a propósito da homossexualidade, da religião ou, no caso muito mais decisivo, da guerra civil e da ditadura.
Ao remexer no passado, a lei da "memória histórica" pressupõe o despertar de fantasmas que, de um delicado modo, a transição democrática espanhola soubera manter adormecidos em nome da coesão nacional. Para azar da Espanha, os homens que arquitectaram a transição e a amnistia foram entretanto substituídos por produtos típicos dos nossos dias, e o pequeno milagre da coesão vê-se hoje em risco graças à leviandade do sr. Zapatero e aos apetites publicitários do sr. Gárzon, que agora decidiu desenterrar literalmente os mortos da guerra e do franquismo e, simbolicamente, as trágicas lembranças agarradas aos cadáveres.
Não vale a pena discutir as preferências do sr. Gárzon pelos cadáveres republicanos. Nem sequer questionar a batalha da criatura pelo direito à celebridade. Em última instância, até aceito que exumar as vítimas do lado nacionalista conceda escasso estatuto e que o mundo perderia em desconhecer o singular carácter do sr. Gárzon. Infelizmente, conhecê-lo a cavar valas comuns também tem consequências, e um juiz menos expansivo proibiu-lhe, para já, a macabra brincadeira. Mas não parece que o sr. Gárzon seja homem de pousar a pá e renunciar às manchetes por receio de desunir um país, embora um passeio em pelota pela Plaza Mayor tivesse o mesmo efeito mediático e efeitos sociais inversos. "
Alberto Gonçalves
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