terça-feira, novembro 18, 2008

PROTEGER O FUMO DAS CRIANÇAS

"Não sei se Obama terá a ver com isto, mas o ar do tempo já reflecte uma mudança qualquer. Por um lado, foi a Comissão Europeia que, numa decisão histórica, voltou a permitir a venda de alcachofras, espargos, beringelas, abacates, feijões, cenouras, cerejas, pepinos, alhos, melões, cebolas, ervilhas, ameixas, nozes e espinafres deformados e/ou simplesmente feios. Por outro lado, foi um município satélite de Londres que proibiu os fumadores de adoptarem crianças. Sei que, à primeira vista, a última notícia parece alinhar com a usual histeria higienista. À segunda vista, porém, é capaz de ser o oposto: se calhar, não se trata de afirmar que os fumadores não são capazes de ser pais, mas de sugerir que os pais não são capazes de ser fumadores.

Por uma inédita vez, é possível que a lei esteja connosco, e digo "connosco" porque não tenho descendência, consumo maço e meio diário de Davidoff (lights) e acho altamente descabido que os fumadores adoptem crianças, não por preocupação com estas mas por respeito para com aqueles. Fumar pressupõe serenidade, reflexão e uma visão contemplativa do mundo. As crianças pressupõem o exacto oposto. À semelhança do jogo, do sexo, da leitura e dos restantes vícios insidiosos adquiridos com a idade, o tabaco integra um universo adulto, que a infância não só não compreende como perturba gravemente. Não é à toa que a maioria dos sujeitos que fumam abandona o hábito após a paternidade. Nem à toa que um número significativo abandona quase todos os demais hábitos. Uma existência agradavelmente degenerada e o convívio com seres dependentes são realidades difíceis de compatibilizar.

Com base nessa evidência, não duvido que, um luminoso dia, o Estado proíba o nascimento aos filhos naturais de fumadores. Para já, Londres deu um importante passo ao refrear os ímpetos dos meninos adoptáveis. Estranhamente, no que talvez constitua outra consequência da mudança de que se fala, Portugal não precisou de aguardar pelo aval estrangeiro. Neste particular, estamos na vanguarda: aqui, pelo sim pelo não, praticamente ninguém consegue adoptar ninguém, e ainda esta semana a Conferência Episcopal pediu mais obstáculos. Um casal meu conhecido anda há anos nesse fado inglório e, dado que são ambos dados à saúde, nem sequer lhes posso dizer para terem calma, fumarem um cigarro e não pensarem mais no assunto
."

Alberto Gonçalves

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