sábado, dezembro 20, 2008

As brumas da Esquerda

"A Esquerda ficou parada à porta das fábricas vazias enquanto a produção se deslocava livremente no mundo globalizado.

O futuro ainda pertence ao socialismo. A frase transporta reflexos de tempos passados, mas continua a inspirar um vasto sector da Esquerda em Portugal. No ar sente-se a agitação de todo o movimento que anima a esquerda da esquerda. Percebe-se que Sócrates é a cápsula que a nova esquerda moral pretende rejeitar. Fala-se de um novo partido, de uma nova ofensiva, de um novo recomeço. Fala-se da esperança e sempre na esperança. Fala-se, simplesmente.

Mas será necessário um novo partido à Esquerda? Talvez seja um partido para distribuir a riqueza que o país não produz. Talvez um partido progressista com o objectivo de construir a igualdade com base no empobrecimento geral. Quem sabe um movimento animado pela regulação das relações de trabalho no vasto reino dos desempregados. A convergência das esquerdas é o nevoeiro vermelho em que circulam grandes desilusões e muitas ambições. Manuel Alegre confere elevação moral ao empreendimento. Francisco Louçã preenche a imagem de um pequeno Robespierre que consome tudo à sua volta até se consumir no delírio do seu próprio radicalismo.

Perante as dificuldades, próprias ou dos adversários, a Esquerda reage pelo reflexo mecânico de fugir ainda mais para a Esquerda. Face à crise do liberalismo a pureza da Esquerda surge como um ‘fetiche’. A convergência das esquerdas é uma fractura no interior de uma divergência, uma questão paroquial entre famílias e que nada acrescenta ao país. Pelo contrário, pela pulverização artificial promove o sectarismo e a fracção. O PS de Sócrates irá sofrer todas as consequências.

A Esquerda não sabe como reagir ao mundo. Identifica responsáveis e inimigos, mas já não detém o velho monopólio da ideologia que tudo resolve. E sem uma perspectiva ideológica, a Esquerda vagueia com projectos que não representam respostas. O drama da Esquerda está no facto de ter parado no diagnóstico do tempo. O que anima a convergência das esquerdas é ainda a eterna ideia da luta de classes em direcção à igualdade e justiça social. O que faz girar o mundo é a poderosa competição entre países no sentido da afirmação global. A Esquerda ficou parada à porta das fábricas vazias enquanto a produção se deslocava livremente no mundo globalizado. Insinua-se o espectro da explosão social, mas como vai a Esquerda defender o modelo social Europeu face à expansão económica da China? Os partidos podem ser muitos, só as soluções são espécie rara.
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Carlos Marques de Almeida

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