Falta de educação política
"A querela com Cavaco Silva por causa do Estatuto dos Açores não é uma mera discordância sobre o que é ou não constitucional.
O ano de 2008 acaba com um conflito entre o PS e o Presidente da República. Ontem, numa dura mensagem pública, Cavaco Silva criticou a intransigência da Assembleia em reconfirmar o Estatuto dos Açores. Como já tinha feito no Verão e até o censuraram por tocar no tema, Cavaco acusou o Parlamento de atacar os poderes presidenciais, em particular o poder de dissolução da assembleia regional, na medida em que o novo Estatuto obriga o Presidente a ouvir, além dos órgãos que a Constituição determina, os presidentes do governo regional e da assembleia regional. Qualquer pessoa de senso vê a diferença: quanto mais audições um poder for obrigado a fazer, mais limitada fica a sua competência, maiores são os “custos” duma decisão que devia ser teoricamente livre. Qualquer pessoa de senso se interroga sobre a estranha ideia que é ter de ouvir o chefe de governo duma região autónoma antes de dissolver o órgão do qual aquele mesmo governo depende.
Certamente que o PS não ignora nenhum desses aspectos. Só que a querela com Cavaco Silva por causa do Estatuto dos Açores não é uma mera discordância sobre o que é ou não constitucional. Nem se explica pelo facto de o PS continuar amarrado à oferta eleitoralista que Sócrates decidiu conceder a Carlos César antes das eleições regionais. A querela com o Presidente é na realidade uma querela sobre o poder. É uma querela sobre o lugar do poder e sobre os limites desse poder no sistema político. A maioria do PS, entronizada na autoridade incontestável de José Sócrates, decidiu pura e simplesmente que não podem existir limites e controlos à sua vontade. Em nenhuma circunstância de polémica ou dissídio, esta maioria socialista admite a hipótese de recuar. Recuar numa altura em que o Governo se prepara para ir a votos e todas as aparências contam? Nada disso. O PS considera o seu poder tão ilimitado que rejeita qualquer deferência institucional perante quem for, nem que estejamos a falar da mais alta figura do Estado e de um conjunto de reservas constitucionais perfeitamente admissíveis sobre, note-se bem, o estatuto do próprio Presidente.
A falta de educação política e institucional da maioria socialista e de todos aqueles que votaram ao lado dela o Estatuto dos Açores, é de tal modo chocante que não se percebe a passividade com que este assunto tem sido recebido pela opinião pública. Que o PSD aqui se tenha abstido, é uma mancha na História do partido. Esta é a mesma maioria de um Governo que enviou uma vez uma carta ao Tribunal Constitucional para pressionar os juízes num processo que interessava ao Governo. Esta é a mesma maioria que não hesitou agora em atacar um Presidente que jurou defender a Constituição. Esta é a mesma maioria que não merece continuar absoluta."
Pedro Lomba
O ano de 2008 acaba com um conflito entre o PS e o Presidente da República. Ontem, numa dura mensagem pública, Cavaco Silva criticou a intransigência da Assembleia em reconfirmar o Estatuto dos Açores. Como já tinha feito no Verão e até o censuraram por tocar no tema, Cavaco acusou o Parlamento de atacar os poderes presidenciais, em particular o poder de dissolução da assembleia regional, na medida em que o novo Estatuto obriga o Presidente a ouvir, além dos órgãos que a Constituição determina, os presidentes do governo regional e da assembleia regional. Qualquer pessoa de senso vê a diferença: quanto mais audições um poder for obrigado a fazer, mais limitada fica a sua competência, maiores são os “custos” duma decisão que devia ser teoricamente livre. Qualquer pessoa de senso se interroga sobre a estranha ideia que é ter de ouvir o chefe de governo duma região autónoma antes de dissolver o órgão do qual aquele mesmo governo depende.
Certamente que o PS não ignora nenhum desses aspectos. Só que a querela com Cavaco Silva por causa do Estatuto dos Açores não é uma mera discordância sobre o que é ou não constitucional. Nem se explica pelo facto de o PS continuar amarrado à oferta eleitoralista que Sócrates decidiu conceder a Carlos César antes das eleições regionais. A querela com o Presidente é na realidade uma querela sobre o poder. É uma querela sobre o lugar do poder e sobre os limites desse poder no sistema político. A maioria do PS, entronizada na autoridade incontestável de José Sócrates, decidiu pura e simplesmente que não podem existir limites e controlos à sua vontade. Em nenhuma circunstância de polémica ou dissídio, esta maioria socialista admite a hipótese de recuar. Recuar numa altura em que o Governo se prepara para ir a votos e todas as aparências contam? Nada disso. O PS considera o seu poder tão ilimitado que rejeita qualquer deferência institucional perante quem for, nem que estejamos a falar da mais alta figura do Estado e de um conjunto de reservas constitucionais perfeitamente admissíveis sobre, note-se bem, o estatuto do próprio Presidente.
A falta de educação política e institucional da maioria socialista e de todos aqueles que votaram ao lado dela o Estatuto dos Açores, é de tal modo chocante que não se percebe a passividade com que este assunto tem sido recebido pela opinião pública. Que o PSD aqui se tenha abstido, é uma mancha na História do partido. Esta é a mesma maioria de um Governo que enviou uma vez uma carta ao Tribunal Constitucional para pressionar os juízes num processo que interessava ao Governo. Esta é a mesma maioria que não hesitou agora em atacar um Presidente que jurou defender a Constituição. Esta é a mesma maioria que não merece continuar absoluta."
Pedro Lomba
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