segunda-feira, janeiro 05, 2009

MAL DE SAÚDE

"Em plena ressaca natalícia, uns súbitos caroços no pescoço e a hipocondria levaram-me às urgências de um hospital privado. A menina do balcão abriu-me uma "ficha". Uma segunda menina pediu-me para aguardar. Uma terceira menina chamou-me à consulta. Em dez minutos, portanto, estava à frente de um médico. No fim, paguei 70 euros e regressei a casa aliviado, na carteira e no espírito. Foi caro?

Comparados com os 900 euros que, em média, cada cidadão paga anualmente pelo Serviço Nacional de Saúde, 70 euros parecem-me uma ninharia. Dada a quantidade de cidadãos que não pagam impostos, até suponho que o meu contributo ronde os 2 ou 3 mil euros por ano. Não importa: a verdade é que o SNS custa uma fortuna e funciona da maneira que se vê, se não conseguirmos evitar vê-lo.

As principais notícias destes dias resumiram-se à descrição dos tempos de espera das urgências públicas, entupidas pela afluência de "utentes". Quatro horas. Dez horas. Doze horas. As salas de espera só não ficaram repletas de cadáveres porque, felizmente, a maioria dos "utentes" em causa padeceria de mariquices idênticas à minha. Porém, ao contrário do que pretende o Governo e como escreveu João Miranda (no blogue Blasfémias), o "utente" tem o direito de recusar avaliar a gravidade do seu estado e o SNS tem o dever de o atender sem desumanas demoras.

O problema é que, apesar do elevado rácio de médicos/habitantes, não atende. O SNS gratuito e universal que temos não é gratuito e, a julgar pelas "cunhas" que regulamentam a rapidez no atendimento, está longe de ser universal. Se considerarmos os resultados obtidos, talvez nem garanta grande saúde. Num mundo perfeito, haveria de se discutir a reforma de tamanha monstruosidade em prol de uma alternativa que servisse de facto os pobres e respeitasse de facto a vontade dos restantes. Em Portugal, salvo Correia de Campos, varrido num ápice, o SNS não se discute: a Constituição ainda sonha com o socialismo, os partidos de poder não arriscam a indignação popular, os profissionais do ramo não admitem afrontas e, de qualquer modo, as fraudes disseminadas tornaram o conceito de pobreza um tanto vago.

Uma solução para o futuro? Não há solução, há, enquanto não declarar falência, um futuro igualzinho ao presente, em que quem pode recorre a serviços decentes e quem não pode é plantado durante horas num armazém abafado. No tortuoso mundo do SNS não é forçosa a coincidência entre os que o pagam, os que o sofrem e os que, com as melhores ou as piores das intenções, o defendem
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Alberto Gonçalves

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