quinta-feira, março 05, 2009

Espinhoso

"Sintomático. Depois dos vetos, de alguns discursos mais assertivos em momentos simbólicos, das intervenções aqui e ali pontuadas por frases directas ou indirectas a áreas de governação a necessitarem de ser corrigidas, Cavaco Silva voltou a não cooperar estrategicamente com o Governo e atirou com um balde de gelo para cima das pretensões dos que ainda congeminavam o melhor pretexto para provocar a antecipação de calendários e fazer coincidir eleições legislativas e europeias.

Ao referir que só em Junho procederá à marcação das legislativas, Cavaco está a dizer que o Executivo terá que aguentar com os espinhos da crise e o desgaste de outras matérias até, pelo menos, Outubro. E o que é tanto mais significativo é que Cavaco, ao arrepio do que lhe é costume e do seu apurado sentido institucional, fez estas declarações na Alemanha no âmbito de uma visita de Estado. Que grandes razões se terão conjugado para produzir no Presidente da República a vontade e a necessidade de fazer tal afirmação?

Recandidatura. Falou-se de decência democrática, este fim-de-semana, no Congresso do PS. E argumentou-se com a defesa dela como razão para justificar a recandidatura de Sócrates a novo mandato. Mas não se conjugou a retórica com a prática. Porque decência democrática não se conjuga com a afirmação da vitimização por via de insinuações à volta de supostos inimigos ocultos a montarem campanhas negras, seja lá num jornal, numa qualquer televisão ou nos partidos da oposição.

Julgamentos. Mas a decência democrática também não se conjuga com as confusões que se pretendem fazer entre termos e conceitos como seja o julgamento eleitoral e judicial, nem tão pouco com a elevação do primeiro à condição de suprema sentença. O povo, ao votar, "julga" projectos e actuações políticas. É bem verdade. Mas, com isso, não inocenta nem culpa pessoas. Os julgamentos populares são sempre inaceitáveis, seja na afirmação de culpa, seja na afirmação de inocência. Não há decência democrática que os aguente nem Estado de direito que os permita.

Coerência. O Congresso revelou uma produção cheia de brilho e vazia de conteúdo. Sobrepôs o marketing às ideias e a coreografia ao debate. De resto, bem em linha com o que tem sido a actuação do Governo, sempre muito mais atento à pintura externa do que à real substância das coisas. O secretário-geral do PS, no discurso de encerramento, não hesitou, e bem, em pedir contenção nas remunerações e nos prémios de gestores. Pois que por uma questão de primeiro exemplo, do mesmo modo se deverá exigir ao PS e ao Governo idêntica contenção nos gastos supérfluos, desde logo aqueles que se prendem com floreados absolutamente desnecessários. Trata-se de uma questão de decência!
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Rita Marques Guedes

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