Dificuldades na obtenção de prova
"A nossa lei processual penal, quanto à matéria de produção de prova em julgamento, estacionou na idade da pedra. É bom que se saiba que esta lei não confia no juiz e dificulta a apreciação e a valoração da prova, pactuando com os truques e artimanhas do arguido. O exercício e a ginástica que se tem de fazer para produzir prova e condenar é, em certos casos, de enlouquecer qualquer mortal. Um jogo do gato e do rato. A mentalidade do nosso legislador em democracia, pouco difere do legislador do Estado Novo: ambos estão presos a uma concepção de juiz-polícia, que era, ao mesmo tempo, juiz de investigação, de instrução, de acusação e de julgamento.
Esse tempo já passou. O figurino de juiz que temos é outro. O juiz já não investiga, já não acusa e o juiz de instrução nunca é o de julgamento. Por isso não há razões para não confiar no juiz. Cabe na cabeça de alguém que o depoimento do arguido prestado no inquérito, perante o juiz e na presença do seu defensor, onde confessa a prática do crime com todos os detalhes, não tenha valor probatório para formar a convicção de culpa, para efeitos de condenação, caso se recuse, em julgamento, a prestar declarações? Cabe na cabeça de gente responsável que, nesta situação, o juiz fique impedido de confrontar o arguido com as declarações que prestou no inquérito, porque agora, obedecendo a uma nova estratégia de defesa, sofre de amnésia e resolveu ficar calado? É um direito seu remeter-se ao silêncio, que ninguém deve contestar, mas deveria ser, também, um direito do Estado e dos Tribunais confrontá-lo com o seu depoimento em julgamento.
Cerca de 50% do trabalho de investigação vai para o caixote do lixo, porque de nada vale em julgamento. É dinheiro, tempo e esforço humano desperdiçados. Os direitos fundamentais não podem ser entendidos em sentido absoluto. Urge definir parâmetros sólidos de flexibilização das garantias individuais e conciliar com outros valores dentro do ordenamento jurídico. Confiar mais na valoração ética do juiz, para indagar da validade ou não de determinado meio de prova.
A defesa dos valores constitucionais tem de ‘casar’ melhor com a necessidade de perseguir o criminoso e de se fazer justiça, até por razões que se prendem com uma Europa a uma única voz, mesmo nos objectivos da realização da justiça. Se assim fosse talvez o DVD do caso Freeport, com imagens e som relacionados com a investigação, pudesse ser validado e valorado para efeitos de interrogatório dos visados.
O ‘toque dos dedos’ de Miguel Ângelo, na Capela Sistina, que serve de ponte entre o criador e a criatura, entre a justiça e a sociedade, faria, assim, mais sentido."
Rui Rangel
Esse tempo já passou. O figurino de juiz que temos é outro. O juiz já não investiga, já não acusa e o juiz de instrução nunca é o de julgamento. Por isso não há razões para não confiar no juiz. Cabe na cabeça de alguém que o depoimento do arguido prestado no inquérito, perante o juiz e na presença do seu defensor, onde confessa a prática do crime com todos os detalhes, não tenha valor probatório para formar a convicção de culpa, para efeitos de condenação, caso se recuse, em julgamento, a prestar declarações? Cabe na cabeça de gente responsável que, nesta situação, o juiz fique impedido de confrontar o arguido com as declarações que prestou no inquérito, porque agora, obedecendo a uma nova estratégia de defesa, sofre de amnésia e resolveu ficar calado? É um direito seu remeter-se ao silêncio, que ninguém deve contestar, mas deveria ser, também, um direito do Estado e dos Tribunais confrontá-lo com o seu depoimento em julgamento.
Cerca de 50% do trabalho de investigação vai para o caixote do lixo, porque de nada vale em julgamento. É dinheiro, tempo e esforço humano desperdiçados. Os direitos fundamentais não podem ser entendidos em sentido absoluto. Urge definir parâmetros sólidos de flexibilização das garantias individuais e conciliar com outros valores dentro do ordenamento jurídico. Confiar mais na valoração ética do juiz, para indagar da validade ou não de determinado meio de prova.
A defesa dos valores constitucionais tem de ‘casar’ melhor com a necessidade de perseguir o criminoso e de se fazer justiça, até por razões que se prendem com uma Europa a uma única voz, mesmo nos objectivos da realização da justiça. Se assim fosse talvez o DVD do caso Freeport, com imagens e som relacionados com a investigação, pudesse ser validado e valorado para efeitos de interrogatório dos visados.
O ‘toque dos dedos’ de Miguel Ângelo, na Capela Sistina, que serve de ponte entre o criador e a criatura, entre a justiça e a sociedade, faria, assim, mais sentido."
Rui Rangel
0 Comments:
Enviar um comentário
<< Home