terça-feira, agosto 25, 2009

Os homens do Presidente e os homens do primeiro-ministro

"Nem Agosto baixa o elevadíssimo nível em que a política caseira se habituou a pairar. O mais recente tema de campanha é estritamente filosófico e opõe o Governo, ou o PS, à presidência da República e ao PSD. Resumindo muito, de modo a evitar a densidade erudita da matéria, o caso é o seguinte: uma notícia do Semanário, que garantia a participação de membros da Casa Civil de Cavaco Silva na redacção do programa do PSD, levou o PS a acusar o Presidente de parcialidade; de imediato, "fonte" de Belém acusou o Governo de espionagem.

O fascínio do debate adensa-se quando nos ocorre que, por um lado, metade do discurso eleitoral do PS consiste em acusar o PSD de não ter programa, além de que os conselheiros do PR são livres de redigir o que quiserem, incluindo episódios do Noddy, listas de supermercado e promessas partidárias. Por outro lado, nota-se com agrado a sintonia entre o PSD, que nega a colaboração com assessores presidenciais, e pelo menos um assessor presidencial, que atribuiu a "escutas" a divulgação pública dessa colaboração. Perante tal cenário, tudo é possível: ou os porta-vozes do PSD e do PR não sabem o que dizem ou os alegados espiões do PS não ouvem coisa com coisa.

Acima deste Watergate rústico, o eng. Sócrates e o prof. Cavaco levitam. A fim de se irritarem mutuamente, o primeiro não fala de "disparates de Verão"; o segundo não fala, ponto. Curiosamente, nenhum estende o princípio às respectivas tropas, que não têm calado as queixinhas, as quais, diga-se de passagem, fundam-se no prazer da pura dialéctica e não pretendem esclarecer nada.

Em países pouco dados à fruição de discussões teóricas, insinuações assim provocariam a queda de instituições ou, no mínimo, um enorme sarilho. Aqui, as insinuações esgotam-se em si mesmas. Se, o que até às eleições ainda é plausível, emanações do Governo/PS e da presidência/PSD se acusarem de canibalismo ou sacrifício de virgens, a polémica ficará num instante centrada na quantidade de sal utilizada pelo antropófago ou na eficácia dos métodos que verificaram a virgindade.

Talvez, repito, isto seja um sinal de sofisticação argumentativa. É, de certeza, um sinal de depressão governativa, visto que, sob o olhar demasiado interessado de Cavaco, os dois entusiasmantes partidos em questão disputam em Setembro e em exclusivo a oportunidade de mandar em nós. Trágica e tipicamente, as alternativas são um dueto de agremiações comunistas que competem para transformar o País na Roménia de 1980 ou na Albânia de 1975. E há, já me esquecia, o CDS, reduzido a um senhor que percorre feiras e diz mal dos estrangeiros. Faz bem: se a classe política é realmente representativa dos que a elegem, os portugueses não devem dar confiança a quem calha
."

Alberto Gonçalves

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