A Guerra da Sucata

"A distracção faz parte do ADN português. O desleixo também. A conjugação das duas coisas cria a sopa dos ricos a que vulgarmente se dá o nome de corrupção. Não surpreende por isso que em Portugal tenha sido rodado o êxito "A Guerra da Sucata", versão portuguesa das aventuras dos Darth Vader que sobem a pulso na vida. O desleixo começa por algo simples: a forma como a elite dirigente portuguesa gere o património do Estado levaria Freud a deitar-se no divã.

Há dois dias, um edifício da Refer, junto ao Museu do Azulejo, ardeu parcialmente. Não há drama: estava devoluto há seis ou sete anos. Será que a Refer ainda sabia que o tinha a seu cargo? Se percorrermos a pé a cidade de Lisboa, encontraremos dezenas ou centenas de edifícios que são património do Estado e que estão vazios, à espera do dilúvio universal.

Ciclicamente, os Governos e as Câmaras falam de gestão empresarial, mas essa, claramente, não se aplica ao Estado. O Estado português é o pior proprietário que existe: prefere deixar cair uma casa construída com o dinheiro dos contribuintes a ocupá-la com qualquer coisa que seja útil para a sociedade. É este desleixo, distracção e incompetência que levou a que a esfera pública portuguesa seja uma "slot-machine" onde alguns descobrem o "jackpot". O Estado português não guarda a sua riqueza debaixo do colchão: oferece-a aos espertos que cirandam à sua volta. É arrepiante o desleixo do Estado com a gestão dos bens que pertencem aos cidadãos. É assim que os sucateiros prosperam."

Fernando Sobral