O senhor dos Passos
"Há uma certa estratégia leninista no programa de acção do novo PSD. Quando todos esperavam o arranque de uma ofensiva política contra o Governo, o partido dá um passo atrás e introduz no discurso político o tema da revisão constitucional.
A questão parece descabida e caída do céu à falta de um pacote político alternativo, só que a nova querela sobre a Constituição serve para separar o imediatismo do PS de uma visão de longo prazo que o PSD pretende adoptar. Ou seja, em vez de falar da crise, da dívida, do desemprego e da falta de competitividade, o PSD sublinha que só com a mudança do paradigma constitucional é possível reformar o país e desenvolver Portugal. Numa antecipação maximalista, Passos Coelho não pretende colorir os sintomas da crise mas ambiciona atacar as causas políticas da crise. O calculismo do líder do PSD tem como objectivo marcar e definir uma outra agenda política, diferente do elenco socialista, de modo a deslocar o centro do debate político do PS para o PSD. Reza a regra que quem domina a agenda política acaba por ganhar a guerra eleitoral. Assim, em vez do ataque frontal, Passos Coelho opta pelo desgaste dos flancos, que é um modo de transformar a fraqueza em força política. A bandeira da Constituição serve pois para manter a pressão sobre o PS sem no entanto empurrar Sócrates para a porta da demissão.
Ideologicamente, o novo PSD é um imenso corpo social-democrata com uma pequena cabeça liberal. Que não haja ilusões, não se muda um partido com um discurso. Passos Coelho deseja a quadratura do círculo, pretende olhar para a Esquerda ao mesmo tempo que se fixa de amores pela Direita. Ser liberal e social é o perfil incerto do PSD a construir, faltando para tal definir a fronteira entre o Grande Governo e a Grande Sociedade. A reformulação ideológica do PSD obrigará a uma recomposição do espectro político nacional, quer à Esquerda no PS, quer à Direita no CDS. E eis um novo tema a borbulhar na espuma da agenda política. Por estranho que pareça, Passos Coelho promete manter e mudar, promete continuidade e mudança, promete o liberalismo e o socialismo em formato unidose.
Neste ponto surge um interessante paralelismo com o prefácio do Presidente da República ao volume que reúne os seus mais recentes discursos. Cavaco Silva evoca a força tranquila como garantia para a ruptura tranquila de que Portugal precisa. Mitterrand e Sarkozy encontram-se num apelo cruzado à Esquerda e à Direita. Em política, as coincidências nunca desiludem.
Uma nota final sobre a "Alice no País das Maravilhas". Como escrevia G.K. Chesterton, os contos infantis são mais do que verdade, não porque afirmam que os dragões existem, mas porque garantem que os dragões também podem ser derrotados. Que cada um tire a moral que entender."
Carlos Marques de Almeida
A questão parece descabida e caída do céu à falta de um pacote político alternativo, só que a nova querela sobre a Constituição serve para separar o imediatismo do PS de uma visão de longo prazo que o PSD pretende adoptar. Ou seja, em vez de falar da crise, da dívida, do desemprego e da falta de competitividade, o PSD sublinha que só com a mudança do paradigma constitucional é possível reformar o país e desenvolver Portugal. Numa antecipação maximalista, Passos Coelho não pretende colorir os sintomas da crise mas ambiciona atacar as causas políticas da crise. O calculismo do líder do PSD tem como objectivo marcar e definir uma outra agenda política, diferente do elenco socialista, de modo a deslocar o centro do debate político do PS para o PSD. Reza a regra que quem domina a agenda política acaba por ganhar a guerra eleitoral. Assim, em vez do ataque frontal, Passos Coelho opta pelo desgaste dos flancos, que é um modo de transformar a fraqueza em força política. A bandeira da Constituição serve pois para manter a pressão sobre o PS sem no entanto empurrar Sócrates para a porta da demissão.
Ideologicamente, o novo PSD é um imenso corpo social-democrata com uma pequena cabeça liberal. Que não haja ilusões, não se muda um partido com um discurso. Passos Coelho deseja a quadratura do círculo, pretende olhar para a Esquerda ao mesmo tempo que se fixa de amores pela Direita. Ser liberal e social é o perfil incerto do PSD a construir, faltando para tal definir a fronteira entre o Grande Governo e a Grande Sociedade. A reformulação ideológica do PSD obrigará a uma recomposição do espectro político nacional, quer à Esquerda no PS, quer à Direita no CDS. E eis um novo tema a borbulhar na espuma da agenda política. Por estranho que pareça, Passos Coelho promete manter e mudar, promete continuidade e mudança, promete o liberalismo e o socialismo em formato unidose.
Neste ponto surge um interessante paralelismo com o prefácio do Presidente da República ao volume que reúne os seus mais recentes discursos. Cavaco Silva evoca a força tranquila como garantia para a ruptura tranquila de que Portugal precisa. Mitterrand e Sarkozy encontram-se num apelo cruzado à Esquerda e à Direita. Em política, as coincidências nunca desiludem.
Uma nota final sobre a "Alice no País das Maravilhas". Como escrevia G.K. Chesterton, os contos infantis são mais do que verdade, não porque afirmam que os dragões existem, mas porque garantem que os dragões também podem ser derrotados. Que cada um tire a moral que entender."
Carlos Marques de Almeida
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