A inteligência entre aspas
"Na quinta-feira, a capa do Público trazia uma manchete e uma fotografia. A manchete, em tom ligeiramente alarmado, versava o uso de uma pistola eléctrica num presidiário de Paços de Ferreira. A fotografia mostrava um polícia em chamas numa rua de Atenas, e a legenda recusava excitações: "Atingida por um cocktail molotov, a roupa de um polícia incendiou-se e o guarda teve de receber tratamento." Os molotov são armas estranhas, que caem do céu e apenas atentam contra o vestuário. Provavelmente, o referido "tratamento" foi prestado por uma costureira.
Pormenores técnicos à parte, a moral implícita na capa do Público é simples, quase infantil. Quando desordeiros agridem a autoridade, o acontecimento é fortuito, despiciendo ou até louvável. Quando a autoridade agride desordeiros, ai Jesus que o Estado de direito vem abaixo.
Claro que o Público limita-se a reproduzir uma opinião partilhada pela "inteligência" caseira, a qual, após o episódio de Paços de Ferreira, logo reivindicou cabeças de directores, ministros e quem calhasse. A "inteligência" aflige-se imenso com os excessos praticados pela polícia e é altamente complacente face aos excessos praticados contra a polícia e, o que é curioso, contra cidadãos comuns. Os primeiros são culpa das forças da lei e pedem castigos implacáveis e imediatos. Os segundos são culpa da sociedade em geral e, em vez de punições, pedem análise e erradicação das respectivas causas.
De acordo com esta peculiar escola de pensamento, a agressão a um detido, mesmo um detido que enfeita a cela com fezes e coloca uma ala inteira do presídio em greve de fome, dispensa averiguações e é obviamente intolerável. Já os dez golpes de navalha que um assaltante desferiu numa senhora que consultava o "multibanco" (sucedeu há dias no Porto) toleram-se perfeitamente e, no máximo, remetem para as injustiças que empurraram o agressor rumo ao desespero.
Existe alguma racionalidade em tudo isto? Por incrível que pareça, sim: consiste em analisar cada situação de conflito social, de grande ou minúscula dimensão, e escolher o lado que representa maior ameaça ao "sistema" com que a "inteligência", definitivamente, não consegue conviver. Entre o polícia e o criminoso, prefere-se o criminoso. Entre o assaltante e a vítima, prefere-se o assaltante. Entre o "burguês" e o marginal, prefere-se o marginal. Etc. É o tipo de perspectiva que, para recorrer a um exemplo actual, leva a "inteligência" a simpatizar com um fundamentalista islâmico e a achar um membro do Tea Party americano um transtornado religioso. A ideia explícita é tomar o partido dos "oprimidos". A ideia implícita é exercitar uma "subversão" própria de adolescentes em 1968.
Pormenores técnicos à parte, a moral implícita na capa do Público é simples, quase infantil. Quando desordeiros agridem a autoridade, o acontecimento é fortuito, despiciendo ou até louvável. Quando a autoridade agride desordeiros, ai Jesus que o Estado de direito vem abaixo.
Claro que o Público limita-se a reproduzir uma opinião partilhada pela "inteligência" caseira, a qual, após o episódio de Paços de Ferreira, logo reivindicou cabeças de directores, ministros e quem calhasse. A "inteligência" aflige-se imenso com os excessos praticados pela polícia e é altamente complacente face aos excessos praticados contra a polícia e, o que é curioso, contra cidadãos comuns. Os primeiros são culpa das forças da lei e pedem castigos implacáveis e imediatos. Os segundos são culpa da sociedade em geral e, em vez de punições, pedem análise e erradicação das respectivas causas.
De acordo com esta peculiar escola de pensamento, a agressão a um detido, mesmo um detido que enfeita a cela com fezes e coloca uma ala inteira do presídio em greve de fome, dispensa averiguações e é obviamente intolerável. Já os dez golpes de navalha que um assaltante desferiu numa senhora que consultava o "multibanco" (sucedeu há dias no Porto) toleram-se perfeitamente e, no máximo, remetem para as injustiças que empurraram o agressor rumo ao desespero.
Existe alguma racionalidade em tudo isto? Por incrível que pareça, sim: consiste em analisar cada situação de conflito social, de grande ou minúscula dimensão, e escolher o lado que representa maior ameaça ao "sistema" com que a "inteligência", definitivamente, não consegue conviver. Entre o polícia e o criminoso, prefere-se o criminoso. Entre o assaltante e a vítima, prefere-se o assaltante. Entre o "burguês" e o marginal, prefere-se o marginal. Etc. É o tipo de perspectiva que, para recorrer a um exemplo actual, leva a "inteligência" a simpatizar com um fundamentalista islâmico e a achar um membro do Tea Party americano um transtornado religioso. A ideia explícita é tomar o partido dos "oprimidos". A ideia implícita é exercitar uma "subversão" própria de adolescentes em 1968.
Não digo que os guardas de Paços de Ferreira não tenham abusado do poder que têm. Mas pior é abusar da inteligência que, excepto no meio de aspas, não se tem. "
Alberto Gonçalves
Alberto Gonçalves
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