O Orçamento que não queremos querer
"Não é bem um Conselho de Ministros, é uma sala de tortura. Lá se reúnem os eleitos em maratona, desde ontem, preparando o Orçamento do Estado para 2013. Não é por falta de alternativas que os ministros temem. É precisamente por tê-las. Saberemos todos o que pedimos, quando pedimos que cortem a despesa?
O pedido é justo. Um matemático diria mesmo que é necessário. A troika diz que é obrigatório. E nós acrescentamos que o Governo falhou nisso. Quando acordou do sonho das gorduras, encontrou músculos e ossos. Quais deles vai rasgar e amputar agora?
Os impostos estão a matar a economia. Nem é necessário explicar porquê. Basta ver que um terço da austeridade prevista para o próximo ano decorre da recessão que a própria austeridade provoca ou agrava. E isto é admitindo que o PIB só cai 1% em 2013, o que já parece optimista. Não é preciso esperar por relatório nenhum para adivinhar que a actividade económica travou em Setembro, imediatamente após o anúncio de novas medidas de austeridade.
A redução do défice prevista para os próximos dois anos é tão dramática que exige cortes como nunca se fez. Cortes que se somarão à redução de pensões e de salários da função pública. Como vai o Governo cortar quatro mil milhões de euros nos próximos dois anos? Como vai o Governo fazer o que não fez, baixar de modo permanente o custo do Estado? Só assim será possível baixar impostos. E sem baixar impostos a economia não cresce, consome-se - some-se.
Baixar a despesa do Estado tem de ser mais do que cortar salários à Função Pública e pensões. Se a troika nos baixasse os juros, como aqui se tem defendido, seria mais fácil. Mas mesmo assim, é preciso reduzir a despesa primária. Por muito moralizador e importante que seja eliminar meia dúzia de fundações do Estado, isso pesa pouco na conta final.
"Cortar despesa" é desmamar muitas clientelas políticas. Reformar a administração local a sério é muito mais do que fundir freguesias, é desempregar muitos políticos. Baixar os custos do Estado é fechar institutos que não servem para nada senão para pagar os salários de quem lá anda.
Reestruturar empresas públicas a sério é muito mais que antecipar as reformas a duas mil pessoas e aumentar brutalmente as tarifas. Mesmo assim, esta é a parte fácil de exigir.
A parte difícil é outra. É perceber que "cortar despesa" além das reduções temporárias de salários significa fazer reduções brutais como provavelmente só o Ministério da Saúde fez este ano. E com esse custo social. Nem despedir todos os políticos parasitas bastaria. "Cortar despesa" é reduzir serviços nos hospitais, nas escolas, nos tribunais, sítios onde já há falta de meios. "Cortar despesa" é tirar dinheiro a muita gente, médicos, professores, militares ou polícias. "Cortar despesa" é fechar partes de empresas públicas e organismos do Estado. "Cortar despesa" é abrir um programa de rescisões entre os funcionários públicos, o que nunca foi feito - e que numa economia em recessão é dramático.
É isso que o próximo Orçamento do Estado vai trazer. Mais impostos. Cortes na despesa. E isso é, em qualquer caso, fazer das tripas de outros o coração da reestruturação do Estado. É obrigatório mudar a equação do Estado, tornando-o suportável e deixando os agentes económicos respirar dos impostos que agora os asfixiam. O que poucos assumem é o odioso do que quer dizer "cortar despesa". É amputar corpos. É isso que andamos a querer. É nisso que não queremos crer. "
Pedro Santos Guerreiro
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