terça-feira, fevereiro 26, 2013

Uma cena falhada

Uma cena falhada


Se os partidos querem candidatar os seus dinossauros autárquicos a um quarto mandato vão ter de o assumir
A descoberta de uma gralha na lei de limitação de mandatos autárquicos constitui uma cena burlesca. Ao fim de oito anos, a Presidência da República detectou a troca de um "da" por um "de", na transposição da Lei para o Diário da República. Anedótico. É grave.
Os portugueses ficam assim informados que, doravante, jamais poderão confiar na legislação publicada no Diário da República. Pode enfermar de gralhas, erros ou omissões cuja correção aparecerá apenas anos mais tarde, quando der jeito a alguém.
Está provado que ninguém lê, corrige os diplomas ou sequer confronta a legislação aprovada com a que é efetivamente publicada. Já se sabia que o sistema tinha capacidade de interpretar as leis em função da sua conveniência; o que não se imaginaria é que ainda se entretivesse a falsificá-las. Caberá agora a Cavaco Silva esclarecer se o Diário da República é para levar a sério e informar-nos se que o que lá se lê é legislação ou distorção.
Quanto à limitação de mandatos autárquicos propriamente dita, a confusão não poderia ser maior. Foram, nas últimas semanas, emitidas inúmeras opiniões de juristas, pareceres afinal alicerçados numa Lei que estaria inquinada por um pecado original de redação. Pecadilho que não terá preocupado os legisladores aquando da discussão da Lei e erro que afinal ninguém detetou. E que ainda por cima nem sequer pode ser corrigido.
Já não há agora saída airosa possível. A estratégia de redução de danos para os políticos terá de passar, inevitavelmente, por uma nova discussão da legislação no Parlamento. Os partidos com representação na Assembleia da República vão ter de se assumir.
E bom será que nem venham tentar novas interpretações. Os parlamentares não têm legitimidade para interpretar leis, pois, tendo funções legislativas, não podem imiscuir-se em funções do poder judicial; estariam dessa forma a violar o princípio da separação de poderes.
Chegou a hora da verdade para os partidos. Se querem candidatar os seus dinossauros autárquicos a um quarto mandato consecutivo vão ter de o assumir. A estratégia de querer eternizar o poder, fingindo que o querem renovar, falhou.
Paulo Morais, in CM

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