segunda-feira, março 18, 2013

Carrega BCP!

"Quando o presidente do Benfica diz que um perdão da banca ao Sporting é inaceitável, está a discutir mais do que futebol. Está a condensar a história financeira dos nossos tempos. Tempos em que gerir mal compensa. Desta vez, o futebol não é uma metáfora, é economia mesmo.

Os clubes de futebol são um misterioso negócio em que muitos clubes falidos pagam fabulosos salários, comissões e contratos - e até juros. O Sporting é, dos grandes, o caso mais grave. Está arruinado, perde dinheiro todos os dias, tem o futuro hipotecado. Se fosse uma empresa já teria fechado as portas. Sendo um grande clube, foi traçando cheques até não poder mais. O clube está em eleições, pelo que a asfixia financeira merece respostas de quem faz propostas. Mas não é mais possível galopar esta dívida, pelo que é preciso "reestruturar", que é sempre uma forma mais ou menos intensiva de perdoar. Faz sentido?

Nos últimos meses, o Negócios tem publicado dezenas de casos semelhantes, em que uma dívida demasiado grande se torna um problema sobretudo do banco. O caso mais gritante foi o dos Hotéis Carlos Saraiva, mas muitos outros houve e haverá. O problema não é só o risco moral do perdão e da impunidade. É a concorrência ser morta em cada salvação. Ao lado de quem falhou estiveram empresas que prosperaram apenas pelo seu mérito e cumpriram o que havia a cumprir.

Esqueça o benfiquismo ou o sportinguismo e leia: "Para haver perdão tem de haver consequências. (...) Penalizar quem geriu bem é que não pode acontecer. Se houver perdão [para o Sporting], tem de haver perdão para o Benfica". A revolta de Luís Filipe Vieira é justificada e extensível a todos os concorrente de cada falido perdoado. A impunidade é um incentivo à má gestão. E uma punição da boa.

O problema, dir-se-ia, é do banco. Mas não é só do banco. Primeiro, é preciso perguntar quem andou a dar créditos, e porquê, a entidades falidas e que não apresentaram colaterais. Depois, é preciso compreender quem vai pagar essa perda. Uma perda nunca desaparece, alguém a paga.

Voltemos ao caso do Sporting, que tem como maiores credores o BCP e o BES. Os dois bancos têm tido atitudes diferentes, tendo o BCP fechado a torneira há mais tempo e o BES suprido as necessidades de tesouraria mês após mês. Grande parte destes créditos já foram provisionados pelos bancos, o que significa que já assumiram a perda que um perdão implicará. Dir-se-ia então que a perda transita do Sporting para os accionistas do BCP, certo? Nem por isso. É que os bancos têm tantos problemas destes que têm de aumentar os juros aos empréstimos às empresas, o que "colectiza" perdas como a do Sporting por empresas que precisariam de crédito mais barato. Por outro lado, estes perdões só podem ser concedidos porque há capital no BCP que foi emprestado pelo Estado. Se o banco pagar esse empréstimo, as contas ficam saldadas. Se não pagar, o prejuízo do Sporting socializa-se. "É difícil entender que bancos intervencionados, que são intervencionados com os nossos impostos, possam utilizar o dinheiro dos contribuintes para facilitar perdões de dívida, seja a quem for", afirmou Domingos Soares de Oliveira, administrador da Benfica SAD. E afirmou bem. Mas debalde. Porque assim está a acontecer em toda a economia.

O caso do Sporting serve aqui também para debater o risco moral que atravessa a economia. Vieira, aliás, sabe o que isso é, pois tem actividade empresarial no imobiliário que tem necessitado de grandes reestruturações de dívida. Aliás: todos os portugueses percebem esta história. Afinal, quando pede mais tempo e menos juros da dívida porque a Grécia e a Irlanda assim tiveram, Portugal está a pedir o mesmo. E antes reclamássemos como o Benfica que necessitássemos como o Sporting."

Pedro Santos Guerreiro

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