Para memória futura.
Por ANA SÁ LOPES
Sábado, 27 de Novembro de 2004
No dia 10, o Supremo Tribunal de Justiça diminuiu uma pena de um homem que tinha estrangulado a mulher. A primeira instância ditara 14 anos de prisão, mas os sereníssimos do Supremo, consideradas algumas atenuantes, reduziram-na para 11 anos. A quem tenha escapado a notícia de Maria Fernanda, estrangulada pelo marido a 28 de Maio de 2002, que saiu no PÚBLICO da última quarta-feira, passo a informar: o acórdão refere que "não terão sido alheias" ao crime "as condutas anteriores da vítima, designadamente os levantamentos bancários deixando as contas do casal a zero, a ponto de o arguido ficar sem dinheiro para pagar o almoço", o que pode, segundo os cavalheiros do Supremo, "detonador da raiva que conduziu ao homicídio".
Mas os alucinados juízes do Supremo convocam outras (más) condutas da vítima para justificar que se atenue a pena pelo estrangulamento. Fica a saber-se que em Portugal 2004, é atenuante do crime de homicídio o facto de uma vítima ter "deixado algumas vezes esturricar a comida que confeccionava". Para além dos desastres na cozinha, a estrangulada "chegou a sair e a chegar a casa de noite; ia tomar café a um estabelecimento de cafetaria e não deu conhecimento ao arguido de uma deslocação". No Estado Novo, as mulheres precisavam de consentimento dos maridos para sairem para fora do país; para os juízes do Supremo na democracia de 2004, é atenuante do crime de homicídio ir ao café ou não avisar o marido de uma saída. Ah, a vítima também "chegou a mostrar a barriga quando se encontrava junto de pessoas amigas e se falava da condição física de cada uma delas", conduta repreensível. E, no entanto, os juizes admitem que os "comportamentos resultantes dos problemas psíquicos da vítima, decorrentes da morte de uma filha do casal".
Foram dados como provados agressões do arguido à vítima - "insultos, murros, estalos e pontapés" - que a suprema judicatura considera irrevelantes para o assunto, reduzindo-as à simplória categoria de "desavenças conjugais" e enuncia que também a vítima, nesta matéria, seria culpada. "Àparte as desavenças conjugais (onde, por regra, não existe apenas um culpado) que conduziram à criminalidade em apreço, o arguido mostra-se socialmente inserido", afirma o acórdão. O PÚBLICO teve acesso ao acórdão do Supremo Tribunal de Justiça na semana em que se comemorou o dia contra a violência doméstica. Os números alarmantes tornam-se então "socialmente inseridos", para usar a linguagem do Supremo, quando o próprio Supremo Tribunal desvaloriza "desavenças conjugais" e considera conduta atenuante de um homicídio o deixar esturricar a comida. O Supremo é o retrato do país medieval, mas já não retrata o país jurídico: em Portugal, a violência doméstica é um crime público e o acórdão do Supremo viola, evidentemente, o espírito da lei.
Não se pode exterminá-los mas, ao menos, não se pode processá-los?
Santana Lopes lá fez a sua remodelação para esconder o amigo Rui Gomes da Silva. Era inevitável, mais cedo ou mais tarde mas, aparentemente, Lopes percebeu muito tarde. A linda metáfora são os pobres secretários de Estado que, avisados à última hora, não conseguiram descolar do Porto e não chegaram a tempo à tomada de posse. "
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