London Blast
Todos sabíamos que, um dia, isto ia acontecer. Era só uma questão de dias, meses, anos. O tempo todo que falta para faltar tempo de novo. O tempo todo nosso que eles precisam para haver tempo para eles. Quando aqueles aviões derrubaram aquelas torres, quando aquele comboio rápido mostrou as entranhas derretidas pelo fogo, somei números e subtrai-me confortavelmente. Ao velho lugar-comum que estas coisas só se sentem quando nos acontecem a nos acrescentava que os cinco sentidos são o ultimo bastião contra o relativismo. Não e possível ver praças e ruas e autocarros que usávamos todos os dias destruídos, e por forca de um instinto de sossego abruptamente retirar-nos da imagem.
Vivo a um minuto a pé de King's Cross. Costumo estudar na British Library, mesmo ao lado da estação. Todos os dias entro em King's Cross e dirijo-me ao WHSmith para ler os jornais do dia. Dali partem comboio para Cambridge, essencialmente, e junta-se um amontoado de gente com malinhas caras e mochilas de estudante olhando o enorme placard com os horários. Quando um dia soou o alarme, há um ou dois meses, reparei que o silencio britânico e a prova de fogo. Mesmo que falso. Esta e, parece-me, a única cidade a prova de terrorismo.
Hoje acordei um pouco mais tarde, e por isso não cumpri a rotina. Presumo que tenha sido apenas por isso – por uma tão portuguesa preguiça – que escrevo.
Tavistock Square e uma praça que durante meses a fio percorri diariamente, para chegar a Russel Square, logo a seguir. E onde fica a minha faculdade. De vez em quando, muito raramente, quando estava cansado apanhava o autocarro.
Aldgate foi onde morei há um ano e pouco. O Royal Hospital foi onde me fizeram esperar uma hora para um medico de clínica geral, indiano, me fazer testes que nunca me tinham sido feitos por especialistas de asma em Portugal – eu tinha apenas uma gripe mais forte que o costume. Tem setas amarelas no chão para indicar o caminho, o que, na inexistência de Dorathys, se explica pelo facto da maioria da população do East End não falar inglês. Há mulheres de burka completa na rua e as mercearias vendem carne halal, música popular do bangladesh, sandalias e álcool. Muito álcool, porque na maioria dos restaurantes da zona não e permitido compra-lo, embora se pode trazê-lo de fora. Então, porque? Porque atacar esta zona?
Quer-me parecer que vocês se meteram com a cidade errada.
We shall never surrender.
1 Comments:
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