domingo, outubro 29, 2006

Aborto.

"O PS equaciona a resolução democrática do aborto no Parlamento. [...] Antes de ouvir os portugueses, o PS já sabe a opinião dos portugueses. É o regresso do filho pródigo. Passados oito anos de incúria, esquecimento ou puro desleixo, eis que o aborto invade a agenda política com o argumento clássico da “necessidade urgente”. Durante oito anos não se avançou como uma política, uma iniciativa ou um pequeno gesto que fosse. Um observador cínico diria que se fez um compasso de espera para criar espaço e oportunidade para um novo referendo. A democracia tem este encanto muito especial – podemos votar sempre, e sempre, e mais uma vez, até que o resultado esteja de acordo com as “legítimas” expectativas.

Em Portugal, a discussão sobre o aborto é uma encenação política. Ninguém estará preocupado com o “destino da mulher”, com o “futuro do feto” ou com a “justiça de uma causa”. Tudo se resume à oportunidade, à urgência e ao cálculo político.

Nesta interessante conjuntura, vejamos a urgência. De acordo com uma sondagem recente, 43% dos portugueses não revela a mais ínfima intenção de participar no referendo. E 21% ainda hesita, não no sentido do voto, mas na importância da participação. Na perspectiva de algumas interpretações, estes dados apenas demonstram a “irrelevância da instituição do referendo”. Nenhuma conclusão deverá ser retirada a propósito da “matéria referendada”. Vejamos o cálculo político. O PS prefere a convocação do referendo para Janeiro. Deste modo se evitará a tendência de “crescimento” do voto “negativo”. Com a vitória em Janeiro, o primeiro-ministro receberia o tão desejado e necessário “certificado de esquerda”. Já o CDS/PP prefere o referendo na Primavera. Neste espaço de tempo será possível organizar e mobilizar os “movimentos pró-vida”. Mas com a ausência anunciada do PSD, o presidente do CDS/PP vê no referendo a oportunidade para reforçar a sua imagem como defensor do “não” e líder da Direita. A vitória do “não” seria o “suplemento de alma” de um líder acossado, reforçando a sua “legitimidade” no confronto com os adversários internos. Ainda a propósito do cálculo político. O PS equaciona a democrática possibilidade de “resolver a questão do aborto no Parlamento”, isto se o resultado do referendo for não vinculativo. Ou seja, antes de ouvir a opinião dos portugueses, o PS já sabe a opinião dos portugueses.

Mas a questão do aborto não se resume ao predomínio de uma ética individual. Nem ao domínio de uma moral religiosa. Nem à afirmação de um preconceito progressista. A questão do aborto remete-nos para uma dimensão política por excelência – numa sociedade civilizada, em que os extremos devem ser evitados, não deverá o Estado proteger toda e qualquer promessa de vida? Este será um debate interessante. Mas não será o debate que temos. Em Portugal, a agressividade, o autoritarismo, o populismo e a intolerância dominam o debate sobre o aborto. Quem discorda da solução “progressista”, só poderá ser um “fundamentalista”. E um hipócrita que deve ser objecto de todas as denúncias e de todas as pressões. O “novo fascismo” não deixa de nos surpreender.
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Carlos Marques de Almeida

12 Comments:

Anonymous Anónimo said...

Será que o articulista tem interesses ecoomicos nas clinicas epanholas ou inglesas onde parte da molheres com poder de compra fazem abortos? Não sei se tem interesses economicos mas o artigo que escreve manifesta ignorancia da problemática dolorosa das mulheres que engravidam e se confrontam com o dilema de abortar ou não e com a dor pós aborto ou com as dificuldades com que se defrontam para proporcionarem o minimos de condições aos filhos. Ninguem aborta de animo leve. Muita gente faltou o referendo e faltará novamente porque a decisão de abortar é muito dificil de tomar e em muitos casos o não abortar é decidir eguir um caminho com enormes dificuldades futuras. Se a decisão é dificil perante um caso concreto ainda mais dificil é tomar uma decisão em abstracto. Por ultimo não posso deixar de referir que lamento que sobre este tema se fale quase sempre na mulher quando o aborto tem implicito direitos e deveres não só da mulher mas também do homem que contribuiu para que surgisse a situação em causa.

domingo, outubro 29, 2006  
Anonymous Anónimo said...

Submeter a despenalização do aborto a referendo é um aborto da democracia. O referendo deve ser restringido a decisões que impliquem a soberania do país, e não questões de meter ou não alguém na cadeia porque não quer que o seu filho venha a ser mais um esfomeado a apanhar lixo ou um renegado pelos progenitores. Se, como defendem alguns, o aborto é um problema de consciência pessoal, porquê querer penalizar quem em consciência decide abortar? Se é uma questão pessoal, porque querem os fariseus impor a sua vontade aos outros? Se o PS está no Governo e defende a despenalização do aborto, porquê não legisla nesse sentido? Chega de hipócritas baratos...

domingo, outubro 29, 2006  
Anonymous Anónimo said...

Quando falta a menstrução e se testa a sua falta, com resultado positivo, ecoa dentro da mulher "concebi" "estou grávida" "trago (tenho) vida". Começa um percurso de felicidade ou constrangimento... que nenhum prazo,ciência ou genética jamais apaga... As politicas natalistas são dispendiosas!Fazer da criança um valor e um modo de afirmação sócio cultural faz rir um BMW ou uma semana nas Caraíbas... a imigração é mais barata? Espero que neste tema encham, tambem, a boca com a Irlanda e a Finlândia. Já temos lei sobre o assunto...se as leis fizessem a REALIDADE este país não era surrealista... Mais uma...

domingo, outubro 29, 2006  
Anonymous Anónimo said...

O Poder Legislativo do PS, parece espreitar quando a opinião pública se descuida ou se cansa, para à sua revelia, estabelecer a legalidade de fundamentos e interesses partidários, que uma sociedade evoluída por princípios, tem o dever de rejeitar. E procede com desprezo pelos dispositivos democráticos, anulando valores para os outros, que vem a requerer para si, exactamente iguais e pelas mesmas causas. Trata-se de mais um exemplo de apoucar a Instituição, a Civilização e a Democracia. Enfim um Povo, esforçado e infeliz, que cada vez mais se tenta confundir e desnortear. Para obviar, espero que se decrete já, sobre o aborto, um referendo de oito em oito anos. Que corja!

domingo, outubro 29, 2006  
Anonymous Anónimo said...

Sobre a questão da prática do aborto a que muitos "pensadores" chamam eufemisticamente IVG,é pena que haja cada vez mais gente a pensar que o feto é uma doença (prioritária), que nem sequer é um ser humano e por aì fora! Para cúmulo da desgraça, há quem diga que um feto humano é parecido com um feto de rato, esquecendo-se que há gente crescida que parecem autênticos orangotangos e nem nos passa pela cabeça de serem o resultado de um acidente entre um ser humano e um símio! Para acabar com disparates (este inclusivé)porque é que não vão ver fotografias dos resultados do aborto? Têm estômago para isso, ou a "sensibilidade" não permite confrontar-se com essa violência desumana?

domingo, outubro 29, 2006  
Anonymous Anónimo said...

Será que o nascituro até às 10 semanas não é já uma pessoa, ou andamos a brincar aos prazos! Esclareçam os ignorantes, bem como as pessoas de boa fé que devem ser informadas com verdade

domingo, outubro 29, 2006  
Anonymous Anónimo said...

Isto não passa de uma manobra de diversão para distrair a atenção do pessoal dos verdadeiros problemas do pais.

domingo, outubro 29, 2006  
Anonymous Anónimo said...

Esta discussão só se põe porque dois "santeiros" chamados Guterres e Marcelo se entenderam para fazer um referendo ao que não é referendável. O Parlamento como todos os Parlamento europeus,creio eu, já aprovou a lei que existe - onde é permitido abortar por violação e aí já não há vida? O Parlamento é que tem obrigação de voltar a legislar se assim o entender. Claro que agora que já houve o primeiro referendo terá de haver outro dirão alguns, então vamos a isso e quero declarar desde já que da primeira vez não votei mas agora vou votar "sim" porque legalizar o aborto não incita nem obriga ninguém a abortar. Irá abortar quem quiser mas noutras condições acessíveis a todas as condições económicas e não como agora que no ano passado só a Badajoz foram 4000 mulheres portugueses fora as que foram a Mérida, Madrid e Londres. Acabem com discussões bizantinas que não levam a nada e as prejudicadas são sempre as mesmas ou seja as mulheres menos instruídas e sem recursos.

domingo, outubro 29, 2006  
Anonymous Anónimo said...

Se o PS já sabe qualo resultado, para quê um referendo? É para justificar o injustificado, há uma sondagem que dá 66% ao Sim. O PS, é o campeão da poupança,e por isso vai gastar uns milhões de euros para este fédiver.

domingo, outubro 29, 2006  
Anonymous Anónimo said...

1.O Direito à Vida é o Direito Primeiro,é Sagrado,Natural,não é dado pelos Homens. Sem ele quebrem as Tábuas da Lei,esqueçam os Direitos do Homem. 2.Mas, tenho a convicção que a esmagadora maioria das Mulheres que abortam o fazem com grande sofrimento, que nunca as abandonará.Juntar ao sofrimento às Mulheres Pobres e menos informadas que abortam o "ferrete" dum julgamento público parece-me desumano. 3.A maior parte dos Homens e dos Políticos está-se nas tintas para a condição da Mulher e da Mãe.A questão do aborto é usada apenas como "arma de arremesso" político. Se não fosse assim,não haveria problemas com Creches,Jardins de Infância,Apoio efectivo às Meninas Mães,Apio às Famílias Numerosas,etc.Apenas o Sr.T. Blair se preocupou com a criação de condições dignas para as adolescentes-mães solteiras,geralmente abandonadas por aqueles que as engravidaram. 4.E que dizer daquelas Mulheres que não podem ser Mães e que tanto tanto desejariam dar Amor e Carinho a uma Criança,que a Mãe biológica não pudesse guardar e acompanhar.E,assim,a Comunidade aumentaria. Era uma maneira simples de salvar uma Vida e de enriquecer uma Família.Viva a Vida ! 5.Confesso que não gosto de escrever sobre o terrível e complexo tema do aborto.Mas tinha de o fazer.

domingo, outubro 29, 2006  
Anonymous Anónimo said...

Óptimo artigo. Antecipação, excelente colocação do problema. Desmonta as estratégias argumentativas/discursivas que aí se aproximam, dizendo: “ a questão do aborto não se resume…… progressista”. Vivemos numa sociedade Individualista, do primado do Eu (Narcisista e Hedonista) sobre o Outro, onde os interesses são sinónimo de valores e onde é difícil, pelo relativismo e niilismo cultural, enunciar um valor de consenso Absoluto, (Democracia? Liberdade?...) O único valor absoluto que reconheço é o da VIDA. Por isso sou contra o aborto. Sou contra o aborto por razões Demográficas. Portugal e a Europa são economicamente ricos e demograficamente indigentes…0.9 filhos por casal, pirâmide demográfica invertida, excesso de inactivos, défice de jovens, incapacidade de renovar as gerações. Quando me dizem que eu tenho de trabalhar até aos 65 e +, com menos reforma, como posso aceitar que o Estado use os meus impostos para sustentar politicas demográficas antinatalistas? Sou contra o aborto, pelo valor absoluto da VIDA. E porque as políticas maltusianas, no contexto de Portugal, são contra natura. Economicamente CONSERVADORAS e Politicamente REACIONÁRIAS.Economicamente conservadoras, porque se justificam com a pobreza (falta de recursos, condições de vida…), quando a causa não é a Falta mas sim a DISTRIBUIÇÃO da riqueza. Os antinatalistas, optam por intervir na natalidade abdicando de socialmente afrontar a distribuição da riqueza. Neste caso, politicas de fomento da natalidade. Diz bem “ …Oito anos de incúria…” O Maltusianismo/liberalismo. Menos Estado (fecho de maternidades casa bem com aborto) melhor Estado, clínicas privadas para o aborto. Tem lógica…Sou a favor da natalidade e da vida.

domingo, outubro 29, 2006  
Anonymous Anónimo said...

Aborto e Sócrates

Há dias, ligando o televisor, dei de caras com o Snr. Engenheiro Sócrates no momento em que, arengando perante não sei que assembleia e apelando ao ?Sim? no próximo referendo, disparava qualquer coisa como isto, em tom que dispensaria altifalante:

- Vamos acabar com essa chaga do aborto clandestino !

Este constante recurso à clandestinidade dos abortamentos como razão para os legalizar ( !! ), insinuando subrepticiamente a imagem da pobresinha que num vão de escada se sujeita a tratos de polé e ainda por cima é depois ?perseguida? e ?humilhada?, causa-me frenicoques. E lamentei não estar entre os assistentes para lhe retorquir:

- O Snr Engº Sócrates tem obrigação de saber que o aborto não é uma ?chaga? por ser clandestino. É uma chaga por ser aborto !

- O Snr Engº devia saber que o fundamental não é reduzir as chagas clandestinas. É reduzir as chagas tout court, clandestinas ou não !

- O Snr Engº devia saber que muitas das chagas clandestinas são praticadas nas precisas condições ou nas mesmas clínicas que virão a ser usadas se a prática for legalizada !

- O Snr Engº deveria saber que, se o objectivo fosse acabar com a clandestinidade das chagas, justificar-se-ia a liberalização do abortamento até à data do nascimento; e até a legalização dos vulgares casos de lançamento do filho ao caixote do lixo !
- O Snr Engº deveria compreender que as chagas não deixam de ser chagas quando, em vez de clandestinas, passam a ser produzidas em estabelecimentos do Estado !
- O Snr Engº deveria calcular que quem deseja esconder a sua chaga não apreciará muito alterar a conduta expondo-a à devassa hospitalar pública...

- O Snr. Engº deveria ter a noção primária de que quanto mais um acto anti-social é permitido mais evidentemente prolifera; e que é essa a única razão da existência de um Código Penal !

E, se o Snr Engº não descortina outro modo de desencorajar os abortamentos clandestinos e os outros, eu indico-lhe um dos processos que conheci de perto e que, duma cajadada, serve esse objectivo e o do aumento da natalidade, de que Portugal é carente:
A Junta Distrital do Porto teve em funcionamento um estabelecimento modelar que acolhia grávidas em dificuldades económicas ou outras, com a reserva desejada, proporcionando-lhes depois, se necessário, a guarda e educação das crianças em outros estabelecimentos ou em famílias escolhidas, sob o controle de técnicas de serviço social. O sistema estava em plena via de modernização quando a obra foi destroçada pelo PREC ou suas sequelas. Em 1973, 32 mães e 133 infantes permaneciam no estabelecimento em causa e 399 crianças em colocação familiar. No total, o número de crianças crianças assistidas era de 1077.

Crie ou apoie o Governo obras deste tipo ou equivalente e ponha lá os médicos que destinaria à faca e alguidar, obstando assim, simultaneamente, a que sejam coagidos a violar o juramento de Hipócrates.

E durma depois de consciência tranquila, Senhor Engenheiro.

domingo, outubro 29, 2006  

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