Tem dias
"Os portugueses, não contentes com uma única ”felicidade”, ainda têm o hábito de desejar ”felicidades”, como se tentar alcançar uma única felicidade não fosse já suficientemente difícil.
Quando se aproxima o fim do ano, a efeméride costuma puxar a esse sentimento de lugar comum que se traduz por “boas intenções” para viver melhor os doze meses seguintes. Abrem-se as agendas virtuais no primeiro dia do ano e apontam-se – na cabeça, pelo menos – grandes e pequenos objectivos. Na imprensa, pelo contrário, o tema que reina nesta época é o de balanço, ou melhor, o de passar em revista as personalidades e os acontecimentos que marcaram o ano anterior. Está tudo inventado e são poucas, muito poucas, as publicações capazes de surpreender. Mas acontece, como é o caso, este ano, do número duplo de Natal e fim de ano da revista “Economist” que fala de “felicidade” e de “como medi-la”.
Ou talvez não, que é o que se pode concluir desse “balanço” da “Economist”, que explica logo em subtítulo: “O capitalismo pode tornar uma sociedade rica e mantê-la livre. Mas não lhe peçam para vos fazer felizes também.” Que a felicidade não abunda parece óbvio, mesmo neste ciclo de “bem-estar” para muitos em que a economia mundial tem crescido 3,2% ‘per capita’ nos últimos seis anos e em que parece estar prestes a bater as taxas de crescimento registadas nas décadas de 1950 e 1960, como se pode ler no mesmo artigo. Apesar das múltiplas guerras, das populações desalojadas, dos desastres naturais, das catástrofes anunciadas em consequência dos efeitos do aquecimento global, por agora, cada vez mais pessoas têm mais dinheiro para gastar – da China a Portugal, onde segundo notícia do “Diário de Notícias” de ontem, parece que os autóctones conseguiram gastar quase mil euros por segundo nos primeiros 25 dias deste Dezembro.
O capitalismo pode até ser meio caminho andado, mas parece que isso já não chega, ou não chega para o mundo desenvolvido, vulgo “ocidental” , em particular para a “Europa Continental”, segundo o editorialista da “Economist”, onde líderes políticos como o conservador britânico David Cameron preferem agora falar do “bem-estar geral” em vez do PIB. Discussões de países ricos, dirão alguns. Talvez seja verdade. E lá diz o velho ditado que “dinheiro não traz felicidade”.
O Dicionário Ilustrado da Língua Portuguesa diz que a felicidade é o “estado de quem é feliz”, o que não ajuda muito, acrescentando umas achegas como “contentamento” e “bem-estar”; ser “feliz” é aquele “que goza de felicidade” o que nos deixa na mesma; e nem o “felizardo” nos leva longe, porque não passa de uma versão coloquial de “feliz”. Os portugueses, ainda por cima, não contentes com uma única “felicidade” têm o hábito de desejar “felicidades”, como se tentar alcançar uma única felicidade não fosse já suficientemente difícil.
E, mesmo essa, tem dias. O que já não é mau."
Mónica Bello
Quando se aproxima o fim do ano, a efeméride costuma puxar a esse sentimento de lugar comum que se traduz por “boas intenções” para viver melhor os doze meses seguintes. Abrem-se as agendas virtuais no primeiro dia do ano e apontam-se – na cabeça, pelo menos – grandes e pequenos objectivos. Na imprensa, pelo contrário, o tema que reina nesta época é o de balanço, ou melhor, o de passar em revista as personalidades e os acontecimentos que marcaram o ano anterior. Está tudo inventado e são poucas, muito poucas, as publicações capazes de surpreender. Mas acontece, como é o caso, este ano, do número duplo de Natal e fim de ano da revista “Economist” que fala de “felicidade” e de “como medi-la”.
Ou talvez não, que é o que se pode concluir desse “balanço” da “Economist”, que explica logo em subtítulo: “O capitalismo pode tornar uma sociedade rica e mantê-la livre. Mas não lhe peçam para vos fazer felizes também.” Que a felicidade não abunda parece óbvio, mesmo neste ciclo de “bem-estar” para muitos em que a economia mundial tem crescido 3,2% ‘per capita’ nos últimos seis anos e em que parece estar prestes a bater as taxas de crescimento registadas nas décadas de 1950 e 1960, como se pode ler no mesmo artigo. Apesar das múltiplas guerras, das populações desalojadas, dos desastres naturais, das catástrofes anunciadas em consequência dos efeitos do aquecimento global, por agora, cada vez mais pessoas têm mais dinheiro para gastar – da China a Portugal, onde segundo notícia do “Diário de Notícias” de ontem, parece que os autóctones conseguiram gastar quase mil euros por segundo nos primeiros 25 dias deste Dezembro.
O capitalismo pode até ser meio caminho andado, mas parece que isso já não chega, ou não chega para o mundo desenvolvido, vulgo “ocidental” , em particular para a “Europa Continental”, segundo o editorialista da “Economist”, onde líderes políticos como o conservador britânico David Cameron preferem agora falar do “bem-estar geral” em vez do PIB. Discussões de países ricos, dirão alguns. Talvez seja verdade. E lá diz o velho ditado que “dinheiro não traz felicidade”.
O Dicionário Ilustrado da Língua Portuguesa diz que a felicidade é o “estado de quem é feliz”, o que não ajuda muito, acrescentando umas achegas como “contentamento” e “bem-estar”; ser “feliz” é aquele “que goza de felicidade” o que nos deixa na mesma; e nem o “felizardo” nos leva longe, porque não passa de uma versão coloquial de “feliz”. Os portugueses, ainda por cima, não contentes com uma única “felicidade” têm o hábito de desejar “felicidades”, como se tentar alcançar uma única felicidade não fosse já suficientemente difícil.
E, mesmo essa, tem dias. O que já não é mau."
Mónica Bello
3 Comments:
O capitalismo não mantém uma sociedade rica e livre a não ser para uma minoria de privilegiados! Existem milhões de pobres nas sociedades ricas e milhões de pessoas que sobrevivem com o vencimento mínimo enquanto apenas uma pequena minoria é privilegiada (concerteza que não são os funcionários públicos!). Por outro lado nas sociedades capitalistas a informação é manipulada e pertence aos grandes grupos económicos! A publicidade e o marketing manipulam a vontade e o desejo e criam mistificações e ilusões na população com o objectivo do lucro conseguido à base da sugestão e da aviltação da população! O PIB não é significado de felicidade! Porque o PIB não inclui nem o verde da terra nem o azul dos mares e dos céus, e é apenas na fecundidade destes dois elementos que emerge a natural e intensa felicidade! Luís
Um tema interessante. Mas a autora compara riqueza e felicidade a nível individual. E aqui o ter dinheiro, ter riqueza, pode ajudar a ser feliz. Viva o capitalismo! Mas se em vez de vermos o problema ao nivel individual o virmos em termos mais gerais, ao nivel de uma sociedade ou mesmo do planeta, a resposta já é mais difícil. O que será melhor: ter uma sociedade rica mas com grandes desigualdades sociais ou ter uma sociedade mais pobre mas mais igual, mais harmoniosa? Aqui o capitalismo já não é tanto de louvar. Que o digam Africa, América central, etc
O PIB não pode ser a medida absoluta do bem estar de uma sociedade, há muitos outros elementos, mas aqui Portugal também está mal.O País litoral é um exemplo do que não pode ser feito em termos ambientais e as duas cidades principais estão sujeitas ao mais despodurado abandono em termos de conservação e cuidado geral. O que agrava as coisas, ou seja, ao baixo PIB per capita juntam-se negativamente os efeitos dos erros ambientais. O capitalismo não é panaceia para todos os males, só para alguns como a criação de riqueza, o problema é a distribuição, mas, com o socialismo real falido, morto e enterrado" resta acreditar que, embora muito lentamente,seja possível eliminar a vergonha de se ter 20% da população fora dos consumos essenciais e sem um mínimo de dignidade de vida. É que sem isto, falar-se de felicidade(o que quer que isso seja)não vale sequer a pena.
Enviar um comentário
<< Home