quinta-feira, maio 31, 2007

INTELECTUAIS POVO E PODER

"A fragmentação ideológica demonstrada nas eleições para a Câmara de Lisboa reproduz as dispersões dos partidos e fornece-nos preocupante imagem da sociedade portuguesa. Embora se nos queira persuadir de que este ou aquele candidato são o melhor que há, a verdade é omitida pelo ruído feito em volta deles. Em consciência, nenhum deles agrada totalmente. Quando António Costa, em patética apoquentação, ataca "os jogos partidários" a fim de suplicar "maioria absoluta para a corrente que [ele] representa", o assunto pertence aos domínios do hilariante. Costa é loquaz, mas só convence os que se abandonam a qualquer convencimento.

Uma brava lista de "intelectuais de esquerda", pelos vistos com fraca memória ou evanescências de espírito, apoia o candidato do PS, como se Costa e o seu partido nada tivessem a ver com o descalabro geral do País e não houvessem sido coniventes com o escândalo que atingiu Lisboa. A decadência intelectual, moral, cívica, cultural desta burguesia cabisbaixa transformou a política num objecto de consumo indispensável à sua manutenção no poder. E os "intelectuais de esquerda", há anos em sono letárgico, despertaram, agora, sobressaltados, incomodam-se um pouco com ter de assinar o manifesto de caução, e apaziguam a alma rezando nesta missa só aparentemente laica.

No caso vertente, escolher quem?, qual deles melhor serve a cidade? O PCP não se coliga com o PS porque, diz, o PS foi cúmplice do PSD. O que o PCP devia ter feito, então, seria entrar em colisão com os "interesses instalados", sair estrondosamente da câmara e esclarecer-nos da pouca-vergonha. Esperemos que não celebre conúbios pós-eleitorais. O PSD descarta-se de Carmona e projecta o pobre Negrão para a fogueira. Carmona atira a todos e a mais alguns e não acerta em nenhum alvo. É um homem apossado de pequenas angústias quotidianas. Costa tenta dissuadir Roseta, Roseta não é mulher para se deixar dissuadir. Sá Fernandes, nada desiludido com as sondagens, vai à Feira do Livro pedir autógrafos e recebe "palavras lisonjeiras", segundo a enternecedora expressão da Imprensa.

Toda esta gente está morta para o respeito público. Mentiram-nos, trataram-nos como matóides, intrigam na comunidade do mesmo partido, traíram os nobres testamentos das gerações anteriores e as esperanças da sua própria geração. A fragmentação ideológica em Lisboa não significa pujança na diversidade nem especificidades de carácter individual - é o retrato moral de um país dirigido por quem perdeu o instinto da própria dignidade.

Votar para quê?, e em quem? A imagem no espelho reflecte os mesmos rostos.
"

Baptista-Bastos

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