MALAS AVIADAS
"Eu aceito que um objectivo de qualquer greve consista em provocar danos nos processos correntes de trabalho, e em divulgar os danos com o máximo ênfase. Mesmo assim, faz-me sempre relativa impressão a alegria com que os sindicatos afirmam os inconvenientes causados ao público. Durante a paragem dos funcionários de "handling" (bela palavra) dos aeroportos, os seus representantes surgiam a cada dez minutos nas televisões para jurar que são capazes de incomodar brutalmente os passageiros. Há uma certa graça em ver alguém anunciar atrasos, extravios, consumições e caos com ar de orgulho. A certa altura, cheguei a esperar por um sindicalista que abrisse espumante celebrativo, enquanto revelava a primeira vítima de enfarte, por exemplo de um emigrante impedido de regressar a tempo ao emprego no Luxemburgo. Não faltou muito.
Reconheço que, em teoria, os grevistas correm riscos. É preciso coragem para se congratularem com o pandemónio que suscitam nas proximidades de quem sofre o pandemónio. No "telejornal", um grevista com penteado em forma de pudim descrevia encantado a demora na entrega das malas. Atrás dele, a escassos metros, uma fila de infelizes aguardava as malas que não vinham. Espantosamente, não se estabeleceu o nexo entre o encanto do primeiro e a infelicidade dos segundos, ou o grevista com cabelo de pudim teria terminado a entrevista no centro de saúde. A "luta", que os sindicatos tanto invocam, nunca é literal.
Talvez o povo seja realmente sereno. Ou talvez o povo esteja habituado à bagunça. Algumas das pessoas inquiridas pelos jornalistas mostravam-se satisfeitas face às esperas, e algumas afirmaram nem ter notado os efeitos da greve. Provavelmente porque nos dias sem greve também se perdem bagagens e tempo escusado nos aeroportos. Provavelmente porque os vinte ou trinta por cento da rapaziada do "handling" que compareceram ao serviço são suficientes para dar conta do recado, ainda que do sofrível modo que se sabe. Provavelmente porque a existência nos quadros da Groundforce dos setenta ou oitenta por cento de funcionários "paralisados" apenas se reflecte no orçamento da empresa e não nos resultados.
A confirmação da respectiva redundância é outro risco a que os grevistas se expõem, embora o carácter fraternal das leis laborais o tornem compensador de ser corrido."
Alberto Gonçalves
Reconheço que, em teoria, os grevistas correm riscos. É preciso coragem para se congratularem com o pandemónio que suscitam nas proximidades de quem sofre o pandemónio. No "telejornal", um grevista com penteado em forma de pudim descrevia encantado a demora na entrega das malas. Atrás dele, a escassos metros, uma fila de infelizes aguardava as malas que não vinham. Espantosamente, não se estabeleceu o nexo entre o encanto do primeiro e a infelicidade dos segundos, ou o grevista com cabelo de pudim teria terminado a entrevista no centro de saúde. A "luta", que os sindicatos tanto invocam, nunca é literal.
Talvez o povo seja realmente sereno. Ou talvez o povo esteja habituado à bagunça. Algumas das pessoas inquiridas pelos jornalistas mostravam-se satisfeitas face às esperas, e algumas afirmaram nem ter notado os efeitos da greve. Provavelmente porque nos dias sem greve também se perdem bagagens e tempo escusado nos aeroportos. Provavelmente porque os vinte ou trinta por cento da rapaziada do "handling" que compareceram ao serviço são suficientes para dar conta do recado, ainda que do sofrível modo que se sabe. Provavelmente porque a existência nos quadros da Groundforce dos setenta ou oitenta por cento de funcionários "paralisados" apenas se reflecte no orçamento da empresa e não nos resultados.
A confirmação da respectiva redundância é outro risco a que os grevistas se expõem, embora o carácter fraternal das leis laborais o tornem compensador de ser corrido."
Alberto Gonçalves
1 Comments:
Pois, bem fala este.
Hoje a empresa que trata das bagagens dos senhores passageiros, funcionam com contratados de empresas de outsourcing.
Como o país está em outsourcing a segurança em nome do lucro dos espertos que são donos das ditas, normalmenmte amigos e ligados a partidos e muitos deles exsindicalistas ficam muito escandalizados com estas greves.
Toda a gente quer pagar viagens a meio tostão, só pensa na segurança, que começa no handling, quando se borram todos com um desvio ou ameaça de bomba.
Corre a história que havia funcionários de empresas prestadoras de serviços de handling, procurados pela interpol.
O agiotismo serve para que os agiotas viajem nos jets de poucos lugares com tudo VIP desde o handling.
É a globalização e o freemarket e os empresários tipo Somague, como as martas e outras coisas que por aí andam nem somham. Também não lhes acho graça, porque são ou burrinhas ou louras ou gay com pau.
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