Não é só ligar à ficha

"O Governo de José Sócrates tem uma furiosa fixação nas novas tecnologias, o que não tem de ser motivo de censura, até porque quem o elegeu sabia que uma das promessas era o famigerado "choque tecnológico". Mas se em remotos locais de África um telefone por satélite ou um computador ligado à Internet podem significar uma pequena revolução comunicacional, no mundo ocidental, porque o patamar é substancialmente mais elevado, entregar computadores às crianças, permitir aos pais lidar com o Estado através de computador ou dar telemóveis aos avós, não é por si só um pulo de gigante.

Porque apesar dos computadores, as crianças continuam obrigadas a carregar quilos de livros e a enfrentar escolas com horários absurdos; os pais lidam por computador com um Estado que tarda em livrar-se das suas teias burocráticas e da sua eterna desconfiança para com o cidadão; e os avós dificilmente conseguirão remediar os problemas de um interior abandonado com uma chamada de longa distância.

Mas são, apesar de tudo, medidas positivas, que significam progressos, nem que seja só a curto prazo, só que ao colocar o acento tónico nelas, dificilmente o Governo se pode livrar da desconfiança de que tudo não passa de propaganda e que tardam sinais de as mudanças que importam não estão a acontecer. Porque por muito "hardware" e muito "software" que o Governo nos dê, a batalha essencial vai continuar a travar-se no investimento que é feito nas pessoas. Sem professores mais empenhados, sem funcionários mais bem preparados, sem uma rede assistencial mais presente, não há electrónica que nos valha. Para nos lembrar disso aí está o relatório da OCDE, divulgado esta semana, que mostra que em larga medida continuamos a ser herdeiros do analfabetismo a que nos votou o Estado Novo. "

David Pontes