Os endividados
"Não se pode criar um ‘subsídio’ para ajudar quem contraiu empréstimos. É infantilizar os cidadãos.
Em finais de Agosto o presidente dos Estados Unidos apresentou um conjunto de medidas para ajudar as famílias abaladas pela subida das taxas de juro a manterem as casas que compraram. Dias mais tarde, em Portugal, o líder do PP Paulo Portas desafiou o Governo a tomar iniciativas para ajudar os portugueses endividados. E há dois dias foi a vez de Francisco Louçã, do Bloco de Esquerda, avançar com o mesmo tipo de proposta para os desempregados.
Devem os governos apoiar as famílias com dificuldades em pagar os créditos à habitação? Sei que é de uma frieza que se aproxima da desumanidade mas a resposta é não. Incentiva a irresponsabilidade, infantiliza os cidadãos. A mensagem subjacente é que podem fazer todas as asneiras que depois lá está o “paizinho” Estado para resolver.
É muito diferente do estado social, em que se apoia os cidadãos na velhice, na doença e no desemprego, numa espécie de seguro social. Então significa que é o modelo de Francisco Louça que está correcto? Não de todo. Já existe o subsídio de desemprego para apoiar quem está desempregado. Não se pode criar um “subsídio” para ajudar quem contraiu empréstimos. É abrir uma Caixa de Pandora.
A explicação que encontro para a iniciativa da administração Bush, surpreendente dado o seu perfil liberal, é um pouco, digamos, cínica. Ou, de forma mais intelectual, as famílias em dificuldades, por serem muitas, geraram uma externalidade negativa, sendo os ganhos globais de as ajudar – evitar uma crise financeira e económica – superior às perdas.
Apesar de George W. Bush ter garantido que não vai salvar os especuladores imobiliários, estes, tal como os bancos apanhados pela crise da ‘sub-prime’, vão ganhar com este apoio às famílias. Duvido que uma iniciativa destas fosse tomada se o problema estivesse mais limitado.
A abordagem do presidente da Reserva Federal Bem Bernanke, ainda que peque por tardia, é a mais racional. Bernanke afirmou que a Fed vai regular as práticas predatórias no mercado do crédito hipotecário. Esta é, de forma limitada, a perspectiva que o governador do Banco de Portugal está a seguir e pode reforçar com as novas competências na supervisão comportamental.
Há um erro que todas as autoridades e governos cometeram. Nos bons tempos deixaram a banca ir longe de mais. “Dar o peixe” infantiliza os cidadãos. Dar canas de pesca defeituosas que apanham peixes que nos envenenam mais cedo ou mais tarde é um crime do Estado. O excesso de liberdade é selvajaria. E foi isso que se foi permitindo. O que assumiu proporções mais graves num país como Portugal, onde a iliteracia financeira é elevada. Mas nesses tempos não ouvimos nenhum partido político fazer alertas."
Helena Garrido
Em finais de Agosto o presidente dos Estados Unidos apresentou um conjunto de medidas para ajudar as famílias abaladas pela subida das taxas de juro a manterem as casas que compraram. Dias mais tarde, em Portugal, o líder do PP Paulo Portas desafiou o Governo a tomar iniciativas para ajudar os portugueses endividados. E há dois dias foi a vez de Francisco Louçã, do Bloco de Esquerda, avançar com o mesmo tipo de proposta para os desempregados.
Devem os governos apoiar as famílias com dificuldades em pagar os créditos à habitação? Sei que é de uma frieza que se aproxima da desumanidade mas a resposta é não. Incentiva a irresponsabilidade, infantiliza os cidadãos. A mensagem subjacente é que podem fazer todas as asneiras que depois lá está o “paizinho” Estado para resolver.
É muito diferente do estado social, em que se apoia os cidadãos na velhice, na doença e no desemprego, numa espécie de seguro social. Então significa que é o modelo de Francisco Louça que está correcto? Não de todo. Já existe o subsídio de desemprego para apoiar quem está desempregado. Não se pode criar um “subsídio” para ajudar quem contraiu empréstimos. É abrir uma Caixa de Pandora.
A explicação que encontro para a iniciativa da administração Bush, surpreendente dado o seu perfil liberal, é um pouco, digamos, cínica. Ou, de forma mais intelectual, as famílias em dificuldades, por serem muitas, geraram uma externalidade negativa, sendo os ganhos globais de as ajudar – evitar uma crise financeira e económica – superior às perdas.
Apesar de George W. Bush ter garantido que não vai salvar os especuladores imobiliários, estes, tal como os bancos apanhados pela crise da ‘sub-prime’, vão ganhar com este apoio às famílias. Duvido que uma iniciativa destas fosse tomada se o problema estivesse mais limitado.
A abordagem do presidente da Reserva Federal Bem Bernanke, ainda que peque por tardia, é a mais racional. Bernanke afirmou que a Fed vai regular as práticas predatórias no mercado do crédito hipotecário. Esta é, de forma limitada, a perspectiva que o governador do Banco de Portugal está a seguir e pode reforçar com as novas competências na supervisão comportamental.
Há um erro que todas as autoridades e governos cometeram. Nos bons tempos deixaram a banca ir longe de mais. “Dar o peixe” infantiliza os cidadãos. Dar canas de pesca defeituosas que apanham peixes que nos envenenam mais cedo ou mais tarde é um crime do Estado. O excesso de liberdade é selvajaria. E foi isso que se foi permitindo. O que assumiu proporções mais graves num país como Portugal, onde a iliteracia financeira é elevada. Mas nesses tempos não ouvimos nenhum partido político fazer alertas."
Helena Garrido
3 Comments:
A Espanha acaba de rejeitar ,pela maioria socialista,uma proposta do PP para congelar acções contra desempregados(eles são muito bonzinhos,quando na oposição..).Só me surpreende que termine o artigo sem uma referencia ao Banco de Portugal.Eu sei que é gente atarefada,mas não lhes competia supervisionar o modo como o crédito é atribuido.Queremos um mercado mais do tipo CGD ou, das credíticias "online" para decisão na hora?..
Só que, se esquece ou não quer recordar, por exemplo que os funcionários públicos que tinham um contrato com o seu patrão (O Estado, pessoa de bem...)quando organizaram a sua vida e pediam emprestimos para compra de habitação desconheciam que o Estado (pessoa de bem para quem trabalham) lhes iria cortar o que com eles contratualizou... Será que isso aconteceu também com os bancários que têm relações priviligiadas com a banca em termos de empréstimos que lhe permite juros inferiores aos praticados no mercado? Não me parece, tanto quanto sei! Pergunto-lhe: Como se pode organizar a "vida" quando se mudam as regras do jogo a meio do campeonato? Sugiro que investigue melhor e que associe a sua frieza a cada caso! Concordo consigo nos casos de dívidas imponderadas. Uma coisa é alguém endividar-se sem ter a possibilidade de o fazer, outra é alguém ficar desprovido BRUSCAMENTE, de uma progressão na carreira que lhe permitia planear as dívidas contraídas! Espero que não esteja na lista dos "prejudicados". A inveja é coisa que desprezo!...
De facto adquirir uma habitação é um acto infantil, essa senhora Helena deve viver debaixo da ponte, ou numa tenda para dizer essas barbaridades. Geralmente só quem tem o rabinho bem assente é que se dá ao luxo de dizer asneiras deste tipo. Depois da destruição do mercado de arrendamento, a alternativa foi a aquisição, e como todos os cidadãos tem direito a ter uma vida digna, debaixo de um tecto, adquiriram o que podiam na altura em que precisavam, ou era necessário um curso para adquirir uma habitação? Essa senhora com esse discurso neo-liberal esquece-se de que está a falar de seres humanos e o que nos diferencia dos animais é essa capacidade de vivência em sociedade em ajuda mútua, pelo menos era assim. Esta nova geração de selvagens neo-liberais defende a sobrevivência do mais forte mas esquece-se que mesmo esse princípio tem regras e que o que defendem é a anarquia total.
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