sexta-feira, dezembro 28, 2007

“Música no coração”

"O primeiro-ministro não conversa com o país, não comunica com os portugueses, limita-se a governar e a apresentar “resultados”.

Em mensagem festiva, o primeiro-ministro falou à Nação. O relatório de actividades e contas foi lido em estilo solto e eficiente. O reflexo metálico na voz invoca a frieza de uma máquina. Sócrates fez a apologia de Sócrates e informou os portugueses que o Governo é o melhor Governo, que o primeiro-ministro é o melhor primeiro-ministro e que a crise financeira chegou ao fim. No discurso de Sócrates, Portugal é uma colecção de estatísticas que o Governo transforma com zelo burocrático. A julgar pela mensagem, em Portugal não existem portugueses, nem défice de confiança, nem apreensão em relação ao futuro. Através de uma singular inversão, Sócrates parece pensar que Portugal é o pretexto para que Sócrates possa ser primeiro-ministro. Não existe pois qualquer proximidade com a Nação, nem compreensão pelas dificuldades, nem a mínima empatia que empreste a Sócrates uma personalidade para além da política. O primeiro-ministro não conversa com o país, não comunica com os portugueses, limita-se a governar e a apresentar “resultados”. E foi com sinos no coração que os portugueses ignoraram os “resultados” do primeiro-ministro.

A frieza de uma máquina também se revela na conveniência de um silêncio. No momento em que o Governo prepara a nacionalização da gestão do BCP, o silêncio do primeiro-ministro só será surpreendente quando comparado com o silêncio dos profetas da iniciativa privada e da economia de mercado. Não é sintoma de um país normal que o principal banco privado passe a ser dirigido por “gestores públicos”. Não é sintoma de um país normal que a “capitulação” dos accionistas privados seja um exercício de prudência em função dos riscos do mercado. Politicamente, a lição do BCP projecta uma luz meridiana – em Portugal não existem empresários com verdadeira vocação liberal.

No entanto, e em entrevista política, Luís Filipe Menezes revelou a sua profunda vocação liberal. Menezes promete uma “fórmula radical” que passa por “desmantelar”, no prazo de seis meses, o “peso do Estado”. Poderá parecer mesquinho sublinhar o facto de, em dois meses, Luís Filipe Menezes não ter sido capaz de revolucionar o PSD. Será que Menezes acredita que é possível, em Portugal, uma revolução liberal? Talvez o líder do PSD esteja a pensar na maioria silenciosa de empresários e investidores que se abstiveram na mais recente aventura do BCP. Mas a abstenção das maiorias é muitas vezes a prova de que não existem
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Carlos Marques de Almeida

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