A MULHER QUE DAVA A CARA
"A foto explica tudo, mas vou contá-la. À direita, um livro de capa espelhada, que ela ergue para se olhar. Ao centro, a mão direita dela e, entre o indicador e o polegar, um batom vermelho. Pouco antes passara-o nos lábios e, com o dedo médio, ela espalha a cor, como as mulheres que gostam de ser belas. À esquerda da foto, ela. Olhos negros, nariz forte e aqueles lábios, polpudos e carmesim. Acabou a foto. Pôs o batom, olhou-se e entrou para o comício. Ao sair deste, ela levou um tiro que lhe procurava a cara, para castigar, e o homem que atirou fez explodir- -se e tudo à volta. Assim morreu Benazir Bhutto. Morreu por causa do que disse. O que disse no comício? Não, quem é que falou do comício? O que ela disse na foto: uma mulher mostra a cara, mostra que é bela, mostra que gosta de ser bela. Uma provocação tremenda para os que devem ser definidos assim: eles. Eles, o inimigo. Uma feia e verdadeira palavra: inimigo. Quando vamos entender que existe?"
Ferreira Fernandes
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