segunda-feira, janeiro 21, 2008

Os moralistas

"Ferreira do Amaral tem ouvido de tudo por ser presidente do conselho de administração da Lusoponte e de hoje estar a renegociar com o Governo um contrato – o da ponte Vasco da Gama – que assinou nos seus tempos de ministro das Obras Públicas.

Convenhamos: não é saudável esta via rápida entre os antigos governantes e as empresas. Levanta demasiadas suspeitas. Mas atenção: não se trata de fazer um julgamento moral. O problema é de outra natureza: em defesa do interesse público – e para reduzir os conflitos de interesse – deveriam existir regras claras que separassem as águas entre os dois mundos, o das empresas e o da política. A redução temporária da liberdade de escolha dos ex-políticos seria o preço equilibrado a pagar para conseguirmos uma democracia mais limpa, transparente e eficaz.

Na verdade, não seria difícil atingir este objectivo. Bastaria criar um regime de incompatibilidades mais duro que definisse um período de nojo mais alargado capaz de travar a vontade das empresas em contratar os ex-governantes que mexeram nos seus negócios. Não se trata de criar uma proibição eterna e injusta. Seria suficiente uma lei que impedisse, por exemplo, que um ministro passasse, sem uma pausa higiénica alargada – uma legislatura – para uma empresa com a qual se relacionou. Esta pausa seria o suficiente para limpar as águas e deter os personagens menos escrupulosos.

Voltamos, então, ao início: Ferreira do Amaral deveria ter sido impedido de trabalhar na Lusoponte? A resposta é simples: 12 anos após ter saído do Governo de Cavaco Silva, o antigo ministro das Obras Públicas deve ser livre de trabalhar para qualquer empresa em qualquer sector de actividade. Ferreira do Amaral só entrou na Lusoponte há um ano, não cometeu qualquer ilegalidade no relacionamento com esta empresa – que entretanto até já tem outro accionista de referência – lançou um concurso público internacional que ela ganhou e, além disso, já cumpriu um período de afastamento mais do que suficiente. Ter sido governante não pode transformar-se numa espécie de cruz a carregar a vida inteira. Embora o julgamento moral seja um desporto que o país cultiva – em especial quando incide sobre a classe política –, neste caso a condenação é injusta.

Ferreira do Amaral paga este preço porque as regras são pouco exigentes (bastam 3 anos de interregno). Paga-o porque o colocam no mesmo saco de tantos outros que saltaram do público para o privado com um fim-de-semana pelo meio. Paga o preço porque o país nutre repulsa pelos políticos. Os demagogos gostam de explorar esta fragilidade. Para eles, ser ministro é ter cadastro.
"

André Macedo

1 Comments:

Anonymous Anónimo said...

Ferreira do Anmaral paga?
Não o país ou o sítio é que pagam. Demagogia é o abuso de democracia e se isto é uma democracia o abuso de uma coisa destas será o quê?
Quantos Ferreiras od Amaral existem?
E os contratos leoninos em que o estado fica sempre a perder.
O problema é que são todos casos de polícia.
Como a polícia foge como o diabo da cruz e os advogados do estado estão lá apenas para não se chatear, enquanto houver dinheiro vai tudo bem.
Pois há o que têm cadastro e os que o não têm, porque se a justiça cobrasse o que deve decerto haveria por aí muitos com condastro depois de cumprir prisão efectiva.
Daí o articulista dever mudar de profissão e passar a lamber outro tipo de partes.

segunda-feira, janeiro 21, 2008  

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