“Era uma vez na América”
"A questão do Iraque é uma espessa película de sangue que perturba a velha relação entre o Ocidente e o Oriente.
Para grande desilusão da Europa, as primárias na América não são dominadas pela sombra do Iraque. Discute-se Hillary Clinton e as questões do género, debate-se a esperança de Barack Obama e as urgências da raça, fala-se da idade e da longa carreira de John MacCain. As primárias na América não revelam a imagem de um Império acossado nas fronteiras.
Existe uma explicação próxima para esta aparente leveza de espírito. A mudança da doutrina militar americana no Iraque, seja pelo aumento do contingente de forças, seja pelo desenvolvimento de um dispositivo de contra-insurreição, foi capaz de reduzir os níveis de violência observados. Sublinhe-se que não existe uma solução exclusivamente militar para o conflito no antigo país de Saddam. De algum modo, a nova doutrina de intervenção tornou os custos políticos da guerra suportáveis no imediato curto prazo. Na questão do Iraque, a América vive a ilusão de um crédito de alto risco, espécie de “subprime” político que enquanto dura parece perfeito, mas quando se afunda é o prelúdio de um enorme desastre.
Enquanto os candidatos prometem retirar o contingente militar estacionado no Iraque em três meses, seis meses ou permanecer por cem anos, a América vive sem uma política externa viável ou consistente. Quanto aos ‘think-tanks’, o debate continua numa saudável confusão intelectual – primeiro, são os “idealistas internacionalistas” e os “realistas conservadores”; depois, são as doutrinas do “realismo liberal”, “realismo progressivo” e “realismo ético”; finalmente, é o ensaio de um “novo internacionalismo realista”. Mas se em política as palavras contam, talvez fosse interessante uma análise da expressão “guerra contra o terrorismo”. Segundo Michael Burleigh, o “terrorismo” não é uma entidade, mas sim uma estratégia, e não será possível organizar uma guerra contra uma estratégia. Talvez deste modo se explique a informação criativa que levou ao equívoco do Iraque.
A Europa aguarda a liderança da América. E a questão do Iraque é uma espessa película de sangue que perturba a velha relação entre o Ocidente e o Oriente. A Ocidente, a Europa representa a imobilidade pacífica que tem origem no medo. Perante a “islamização do espaço público europeu”, face à tensão crescente nas “sociedades multiculturais avançadas”, a Europa nega a realidade e adia a decisão. Na afirmação de uma peculiar identidade europeia, Portugal exclui-se deste debate e vive na margem das grandes questões do nosso tempo."
Carlos Marques de Almeida
Para grande desilusão da Europa, as primárias na América não são dominadas pela sombra do Iraque. Discute-se Hillary Clinton e as questões do género, debate-se a esperança de Barack Obama e as urgências da raça, fala-se da idade e da longa carreira de John MacCain. As primárias na América não revelam a imagem de um Império acossado nas fronteiras.
Existe uma explicação próxima para esta aparente leveza de espírito. A mudança da doutrina militar americana no Iraque, seja pelo aumento do contingente de forças, seja pelo desenvolvimento de um dispositivo de contra-insurreição, foi capaz de reduzir os níveis de violência observados. Sublinhe-se que não existe uma solução exclusivamente militar para o conflito no antigo país de Saddam. De algum modo, a nova doutrina de intervenção tornou os custos políticos da guerra suportáveis no imediato curto prazo. Na questão do Iraque, a América vive a ilusão de um crédito de alto risco, espécie de “subprime” político que enquanto dura parece perfeito, mas quando se afunda é o prelúdio de um enorme desastre.
Enquanto os candidatos prometem retirar o contingente militar estacionado no Iraque em três meses, seis meses ou permanecer por cem anos, a América vive sem uma política externa viável ou consistente. Quanto aos ‘think-tanks’, o debate continua numa saudável confusão intelectual – primeiro, são os “idealistas internacionalistas” e os “realistas conservadores”; depois, são as doutrinas do “realismo liberal”, “realismo progressivo” e “realismo ético”; finalmente, é o ensaio de um “novo internacionalismo realista”. Mas se em política as palavras contam, talvez fosse interessante uma análise da expressão “guerra contra o terrorismo”. Segundo Michael Burleigh, o “terrorismo” não é uma entidade, mas sim uma estratégia, e não será possível organizar uma guerra contra uma estratégia. Talvez deste modo se explique a informação criativa que levou ao equívoco do Iraque.
A Europa aguarda a liderança da América. E a questão do Iraque é uma espessa película de sangue que perturba a velha relação entre o Ocidente e o Oriente. A Ocidente, a Europa representa a imobilidade pacífica que tem origem no medo. Perante a “islamização do espaço público europeu”, face à tensão crescente nas “sociedades multiculturais avançadas”, a Europa nega a realidade e adia a decisão. Na afirmação de uma peculiar identidade europeia, Portugal exclui-se deste debate e vive na margem das grandes questões do nosso tempo."
Carlos Marques de Almeida
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